A Lei 11.767/08 e o princípio constitucional da inviolabilidade dos atos e manifestações dos advogados

“A atual inflação global revela, de um lado, a força crescente dos monopólios privados a impor preços superiores aos custos para manutenção das margens fixas de lucro. De outro, o desequilíbrio de poder entre nação e corporação transnacional, cujo resultado tende a implicar aos trabalhadores, nos momentos de inflação, o prejuízo da perda do emprego ou da queda do salário”
(Prof. Márcio Pochmann, presidente do IPEA).

A Constituição Federal de 1998 estabelece: “O advogado é indispensável à administração da justiça, sendo inviolável por seus atos e manifestações no exercício da profissão, nos limites da lei”.

A Lei n.º 8.906, de 4/7/1994, garante, entre os direitos do advogado, a inviolabilidade de seu escritório ou local de trabalho. Diante dos recentes acontecimentos ligados com ações da Polícia Federal e do Ministério Público, e decisões de diversos juízes e ministros, a sanção da Lei n.º 11.767, de 7/8/2008 (DOU 8/8/2008) ocasionou acirrados debates pela imprensa, ao ponto de muitos defenderem o veto integral ao projeto-de-lei de autoria do deputado federal Michel Temer (PMDB/SP). No final das negociações, restou sancionado pelo vice-presidente José de Alencar, no exercício da Presidência, com veto a três parágrafos.

Direitos dos advogados

O inciso II do art. 7.º sobre “os direitos dos advogados”, da Lei n.º 8.906/94, da qual fui um dos co-autores na Legislatura que a aprovou, estabelecia: “Ter respeitado, em nome da liberdade de defesa e do sigilo profissional, a inviolabilidade de seu escritório ou local de trabalho, de seus arquivos e dados, de sua correspondência e de suas comunicações, inclusive telefônicas ou afins, salvo caso de busca ou apreensão determinada por magistrado e acompanhada de representante da OAB”.

A nova redação desse inciso II, dada pela Lei n.º 11.767/08, é a seguinte: “Art. 7.º – São direitos dos advogados… II a inviolabilidade de seu escritório ou local de trabalho, bem como de seus instrumentos de trabalho, de sua correspondência escrita, eletrônica, telefônica ou telemática, desde que relativas ao exercício da advocacia”. A ressalva da busca e apreensão determinada por magistrado, foi suprimida na nova redação, mas que irá constar em um dos novos parágrafos da Lei n.º 11.767/08, em outros termos.

Cinco parágrafos

Além da alteração do inciso II da Lei n.º 8.906/08, foram acrescentados ao artigo 7.º cinco outros parágrafos, a alteração da redação do quinto, e a introdução do sexto ao nono. Houve veto à nova redação do parágrafo 5.º, e aos novos parágrafos 8.º e 9.º, restando sancionados os parágrafos sexto e sétimo, a saber:
“Parág. 6.º – Presentes indícios de autoria e materialidade da prática de crime por parte de advogado, a autoridade judiciária competente poderá decretar a quebra da inviolabilidade de que trata o inciso II do caput deste artigo, em decisão motivada, expedindo mandado de busca e apreensão, específico e pormenorizado, a ser cumprido na presença de representante da OAB, sendo, em qualquer hipótese, vedada a utilização dos documentos, das mídias e dos objetos pertencentes a clientes do advogado averiguado, bem como dos demais instrumentos de trabalho que contenham informações sobre clientes”.

Eis o parág. 7.º – “A ressalva constante do parág. 6.º deste artigo não se estende a clientes do advogado averiguado que estejam sendo formalmente investigados como seus partícipes ou co-autores pela prática do mesmo crime que deu causa à quebra da inviolabilidade”.

Mensagem do veto

Foram vetados a nova redação do parág. 5.º do art. 7.º da Lei 11.767/08, assim como os parágrafos oitavo e nono, pelas razões expressas na Mensagem n.º 594, enviada pelo Vice-Presidente José Alencar, no exercício da Presidência da República, ao Presidente do Senado Federal:

“Mensagem n.º 594, de 7 de agosto de 2008. Senhor Presidente do Senado Federal, comunico a Vossa Excelência que, nos termos do § 1.º do art. 66 da Constituição, decidi vetar parcialmente, por razões de interesse público, o Projeto de Lei n.º 36, de 2006 (n.º 5.245/05 na Câmara dos Deputados), que “Altera o art. 7.º da Lei n.º 8.906, de 4 de julho de 1994, para dispor sobre o direito à inviolabilidade do local e instrumentos de trabalho do advogado, bem como de sua correspondência”. Ouvidos, o Ministério da Justiça e a Advocacia Geral da União manifestaram-se pelo veto aos seguintes dispositivos:

§§ 5.º, 8.º e 9.º do art. 7.º da Lei n.º 8.906, de 4 de julho de 1994, alterado pelo art. 1.º do Projeto de Lei:

§ 5º

“§ 5.º São instrumentos de trabalho do advogado todo e qualquer bem móvel ou intelectual utilizado no exercício da advocacia, especialmente seus computadores, telefones, arquivos impressos ou digitais, bancos de dados, livros e anotações de qualquer espécie, bem como documentos, objetos e mídias de som ou imagem, recebidos de clientes ou de terceiros”.

Razões do veto

“A definição de instrumentos de trabalho, ao compreender “documentos, objetos e mídias de som ou imagem, recebidos de clientes ou de terceiros’, pode ensejar conseqüências indesejadas: de um lado, clientes investigados poderiam, utilizando-se de artifício que extrapola os limites da relação cliente-advogado, valer-se da norma em questão para ocultar provas de práticas criminosas; de outro lado, a obtenção legítima de provas em escritórios de advocacia poderia ficar prejudicada, pois aumentaria sensivelmente a possibilidade de ataque à licitude das provas por sua potencial vinculação a ‘clientes ou terceiros’”.

§ 8º

“§ 8.º A quebra da inviolabilidade referida no § 6.º deste artigo, quando decretada contra advogado empregado ou membro de sociedade de advogados, será restrita ao local e aos instrumentos de trabalho privativos do advogado averiguado, não se estendendo aos locais e instrumentos de trabalho compartilhados com os demais advogados”.

Razões do veto

“A redação proposta para o § 8.º contém comando que pode inviabilizar a investigação criminal na hipótese de arquivos e documentos compartilhados em um escritório de advocacia. Ademais, a supressão do dispositivo em nada altera o resguardo do exercício profissional, uma vez que o acesso aos instrumentos de trabalho compartilhados em um escritório de advocacia não poderá extrapolar os limites do mandado judicial”.

§ 9º

“§ 9.º No caso de ofensa a inscrito na OAB, no exercício da profissão ou de cargo ou função de órgão dessa entidade, o conselho competente promoverá o desagravo público do ofendido, sem prejuízo da responsabilidade criminal em que incorrer o infrator”.

Razões do veto

“O veto ao § 5.º do presente projeto mantém a vigência de sua redação atual na Lei n.º 8.906, de 4 de julho de 1994, cujo conteúdo é idêntico ao § 9.º. Assim, a fim de se evitar duplicidade de dispositivo legal, faz-se necessário o veto a este último parágrafo”.

Essas, Senhor Presidente, as razões que me levaram a vetar os dispositivos acima mencionados do projeto em causa, as quais ora submeto à elevada apreciação dos Senhores Membros do Congresso Nacional”.

Pronunciamentos

Segundo nota do presidente da OAB Cezar Britto “os vetos no projeto de lei 36 efetivamente ocorreram nos parágrafos 5.º e 8.º, que não mudam a lógica defendida pela OAB, da inviolabilidade do escritório, que está centrada na redação do inciso II do artigo 7.º e parágrafos 6.º e 7.º da Lei 11.767. Com essa nova Lei, o artigo 7.º terá como texto integral até o parágrafo 7.º, sem qualquer exclusão. Os parágrafos de 1.º a 5.º do texto anterior e o 6.º e o 7.º com nova redação”.
Em entrevista ao jornal “O Estado de S.Paulo, o deputado federal Michel Temer foi questionado se era necessária a nova Lei, já que o artigo 133 da CF/88 garante o sigilo profissional dos advogados, o parlamentar esclareceu: “No Brasil, não adianta dizer que a cocada é feita de coco. É preciso dizer que é feita de coco do coqueiro da Bahia”.

João Cândido

Em vigor desde 24 de julho de 2008 a Lei n.º 11.756, de 23/7/08, que concede anistia post mortem a João Cândido Felisberto, líder da chamada Revolta da Chibata, e aos demais participantes do movimento, com objetivo de restaurar o que lhes foi assegurado pelo Decreto n.º 2.280, de 25 de novembro de 1910. Este decreto, do Presidente da República Hermes da Fonseca, concedeu “anistia ao insurretos de posse dos navios da Armada Nacional, si os mesmos, dentro do prazo que lhes for marcado pelo Governo, se submeterem às autoridades constituídas”. O parágrafo único do artigo 1.º da Lei n.º 11.756/08 foi vetado e tem a seguinte redação: “A anistia de que trata o caput produzirá todos os seus efeitos,inclusive em relação às promoções a que tinham direito os anistiados se estivessem permanecido em serviço ativo, bem como em relação ao benefício da pensão por morte”. As razões do veto referem-se aos efeitos econômico-financeiros, face a ausência de aspectos técnicos necessários à garantia da prestação pelo Poder Público, além de não observar os requisitos da Lei de Responsabilidade Fiscal.

Condenação de advogado

A notícia mais acessada do site do Consultor Jurídico recentemente, foi a relativa à sentença do juiz Fábio Eduardo Bonisson Paixão, da 12.ª vara do Trabalho de Vitória, ES, que condenou o advogado Alberto José de Oliveira por litigância de má-fé, aplicando multa de 1% sobre o valor da causa, ou seja, R$ 8.300,00 já que à causa foi atribuído o valor de 830 mil reais de indenização a ser paga pela Companhia de Transportes Urbanos de Vitória por causa da greve de ônibus de três dias naquela capital. Também condenou o advogado a pagar honorários de advogado no valor de 166 mil reais, mesmo valor requerido pelo autor. A decisão tem suscitado controvérsia entre os advogados que tomaram conhecimento da decisão pelo Conjur, uma vez que o magistrado considerou a ação “aventureira”, com “pedido desarrazoado”, apontando que “estratégia do pedido foi muito arriscada”, finalizando que ao autor “melhor teria sido gastar R$ 1,50 e concorrer aos R$ 15.000.000,00 da mega sena acumulada”, embora, contraditoriamente, tenha extinguido o processo, sem resolução meritória, com base no art. 267, IV, do CPC (Processo 00545.2008.012.17.00-9).

Centrais e FAT

Finalmente, as Centrais Sindicais receberam do Ministério do Trabalho e Emprego o certificado de representatividade e receberam os 10% do valor recolhido da contribuição sindical obrigatória dos trabalhadores: CUT 35,84%, 19,8 milhões de reais; Força Sindical 12,33%, 15,1 milhões; UGT 6,29%, 8,7 milhões; Nova Central 6,27%, 6,6 milhões; CTB 5,09%, 2,8 milhões; e CGTB 5,02%, 2,3 milhões. Ao mesmo tempo, o MTE encaminhou anteprojeto de lei que institui a contribuição negocial e extingui a contribuição sindical obrigatória. Já o Fundo de Amparo ao Trabalhador (FAT) cresceu em 32%, relativo ao PIS/Pasep, em comparação ao primeiro semestre de 2007 (9,9 bilhões) face o primeiro semestre de 2008 (13,2 bilhões), com aplicações financeiras de 5,7 bilhões em 2008, crescimento de 54,6%.

Eventos

Dia 20 de agosto, às 19 horas, no auditório II da Universidade da Indústria, do Sistema Fiep, lançamento do Programa de Desenvolvimento da Liderança Sustentável, com palestra do dr. Tino Viana, psicólogo, especialista em consultoria empresarial e desenvolvimento organizacional, mestre pela Universidade Paris VIII (informações: (41) 3271-7733) *** III Encontro Quilmeño de Direito do Trabalho e I Latinoamericano, pelo Colégio de Advogados de Quilmes, na Argentina, em 26 e 27 de setembro de 2008. Na abertura do evento, a conferência será pronunciada por Luis Carlos Moro, ex-presidente da ABRAT, sob o tema “Um novo paradigma das relações de trabalho. A Carta de Cochabamba” (informações: (11) 4257-3535 / caq@caq.org.ar) *** II Congresso Regional da Advocacia Laboral da Região Sudeste, promoção da Aatsp, Amat, Acat, Afat e Aesat, com apoio da Abrat e outras entidades associativas dos advogados trabalhistas nacionais e internacionais, de 29 de novembro a 2 de dezembro, sob o tema “20 anos da Constituição e o Direito do Trabalho”. O evento será em um navio que partirá de Santos, passando por Búzios e Ilhabela.

Anote

De cada R$ 100 aplicado na poupança, os bancos podem emprestar livremente apenas R$ 5, já que R$ 65 têm de ser destinados aos financiamentos habitacionais e R$ 30 são recolhidos ao BC. No caso de um CDB de iguais R$ 100, a instituição pode emprestar R$ 70 porque só há a incidência do compulsório de R$30 *** Dia 19 de agosto, terça-feira, início do período da propaganda eleitoral gratuita no rádio e na televisão.

Prisão de Guantánamo

Condenado o motorista de Bin Laden, o iemenita Salim Hamdan, em 6/8/08, a 5 anos e 6 meses de prisão, mas será libertado em cinco meses, por já ter cumprido os cinco anos da pena. O júri militar de julgamentos de Guantánamo é “um tribunal de mentirinha feito para julgar todo o mundo de quem não gostamos”, segundo o advogado Charles Swift. 1.850 militares dos EUA trabalham na base militar/prisão, onde há 275 detentos, em seis anos foram 750 presos, com apenas 13 acusados formalmente, mas 80 devem ser julgados, 500 foram transferidos para outros países sem acusação formal e 4 são os suicídios reconhecidos pelo Pentágono. Obama e McCain, candidatos à presidência dos EUA, declaram que, se eleitos, fecharão a prisão.

Pancho Villa e a guilhotina

“O advogado Feliciano Velasco disfarça sua origem aristocrática para se aproximar do revolucionário Pancho Villa e vender-lhe uma guilhotina. Acaba cooptado como “compañero’. “Feliciano é um personagem que representa o que mais detesto politicamente…Detesto todo esse conservadorismo, mercantilização e falta de ideais. O que quero representar aqui é um pouco do que acontece agora com o México. Há classes políticas que, para conseguir se manter no poder, são capazes de fazer qualquer coisa. E isso é algo que acontece em toda a América Latina” (entrevista de Guillermo Arriaga ao jornal Folha de S.Paulo sobre seu livro “Esquadrão Guilhotina”, em 4/8/08).

Edésio Passos é advogado e ex-deputado federal (PT/PR). edesiopassos@terra.com.br