A condenação do PT

Segundo quer o presidente do Partido dos Trabalhadores, José Genoino, a condenação moral do PT no rumoroso e ainda não resolvido caso Waldomiro é “sumária e abstrata, desvinculada de qualquer fundamento ou de qualquer fato, algo que beira as práticas totalitárias”. Nunca houve, segundo ele, massacre moral de partidos como o que está ocorrendo contra o PT.

Em artigo que costuma publicar periodicamente em jornais, Genoino reafirma todos os compromissos do partido que preside com a ética e, em veemente defesa de sua agremiação, diz que o único erro foi “não averiguar com profundidade a vida pregressa do ex-assessor”, amigo e braço-direito do ministro-chefe da Casa Civil, José Dirceu. O PT tem um patrimônio ético e zela por ele – escreveu. “Não permitirá que esse patrimônio acumulado ao longo de uma história de 24 anos seja vilipendiado pela fúria destruidora de acusações abstratas, que pretendem mergulhar a política brasileira nas trevas da indiferenciação (sic), facilitadoras da permissividade, da falta de vigilância, do enfraquecimento dos valores da transparência e das exigências de combate à corrupção.” O artigo dado à luz no último sábado é uma delícia.

Não tem razão, entretanto, Genoino. Sua observação sobre práticas totalitárias é despicativa. Nem merece comentário. Carece dizer, sim, que nada está acontecendo abstratamente, ou seja, sem nexo com a realidade sensível. Só o PT não vê ou, melhor, não quer ver isso. Também não existe condenação sumária, sabendo-se que a nação está, ainda, à cata dos culpados para, aí sim, condená-los. E, pelo visto, é exatamente isso que o PT não quer. Quanto a permitir ou não que o mais caro patrimônio do PT – seu discurso ético – vá ralo abaixo, isso independe de vontade própria. Será conseqüência da sucessão de erros que vêm sendo cometidos desde o estouro do escândalo: quem não deve, não teme. E por qual motivo o governo do PT, e o próprio PT, são contra a investigação de fatos que, a cada dia fica mais claro, não se restringem ao distante ano de 2002?

Na obediência cega à ordem de restringir tudo ao bode expiatório Waldomiro, próceres do governo e do partido que está no governo não percebem os disparates que cometem. Só para citar um deles: dia desses, o senador Aloizio Mercadante, líder do PT no Senado, disse ser contra a instalação de uma CPI para investigar o caso porque não fazia sentido “investigar o passado”. Extraordinária sua proposta de, a partir de agora, só investigar o futuro – observou o sempre circunspecto candidato derrotado pelo discurso da esperança de Lula, José Serra.

Nesse passado que se quer enterrado por medida provisória estão a ex-ministra Benedita da Silva, governadora do Rio de Janeiro à época do achaque revelado, candidatos derrotados nas últimas eleições e, provavelmente, alguns vitoriosos também, já que o homem que pedia os trocados no submundo da jogatina foi promovido a trabalhos mais nobres, sentado sempre à direita do principal homem de Lula, no coração do governo. Que projetos tinham eles? É tudo isso e muito mais (os volumosos negócios da Caixa Econômica Federal, também na área do jogo, em que Waldomiro se meteu sem ser chamado; a atuação do governo, sempre através dele, nas negociações das emendas parlamentares, e por aí afora) que está embutido nesse passado que agora incomoda e, segundo a democrática ótica petista, precisa ser sepultado.

Enquanto procuram, em vão, salvar uma imagem que é tragada pela voracidade de revelações que se sucedem (afinal, o ex-secretário nacional de Segurança Pública, Luiz Eduardo Soares, está aí para romper com a omertà petista mesmo sem CPI), os condestáveis da República do Fome Zero não percebem que não é apenas o passado que lhes incomoda. O presente está levando às ruas massas de trabalhadores desempregados pela única medida de peso – o desemprego dos trabalhadores nos negócios ligados aos proscritos jogos – adotada pelo governo neste ano da graça e do espetáculo prometido. Juntam-se aos demais, também desempregados, à espera dos dez milhões de oportunidades. Nada abstrato, senhor Genoino.

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