Muito fácil de matar

Carmo Dalla Vecchia está quase se convencendo de que poucos atores no Brasil fazem tão bem quanto ele uma cena de morte. Falante e bem-humorado, o ator ri de si mesmo ao constatar que é a terceira vez, em nove trabalhos na tevê, que seu personagen é impedido “pelo destino” de chegar ao final da trama. No caso de Seus Olhos, o “destino” atende pelo nome de Vítor. É graças ao vilão da história, vivido por Petrônio Gontijo, que o boa-praça Sérgio não vai passar do capítulo 30. “A função dele na trama é ser vítima deste assassinato. E, pelo jeito, este papel eu tenho cumprido muito bem”, diverte-se Carmo, que também “morreu” na novela Serras Azuis, da Band, e na minissérie A Casa das Sete Mulheres, da Globo.

Brincadeiras à parte, o ator adorou a idéia de participar apenas da primeira fase de Seus Olhos. Produtor da peça “1/4 de Amor”, na qual também atua, Carmo vai estrear o espetáculo no começo de julho no Rio de Janeiro. E teria de interromper o projeto caso Sérgio lhe exigisse mais de um mês de gravações. “Parece até que foi tudo planejado, de tão perfeito que está”, surpreende-se, animado.

Por outro lado, Carmo acredita que dar consistência a Sérgio durante poucos capítulos é uma tarefa bem menos “arriscada” que carregar o personagem durante a novela inteira.

Tudo porque o íntegro e honesto rapaz, que vai chegar à vice-presidência da Indústria Naval, é o tipo de papel que o ator morre de medo de transformar num chato. “O bonzinho sempre sofre as ações dos outros, nunca propicia a ação. Todo mundo que assiste à tevê sabe o risco que ele corre de ficar monótono”, avalia Carmo, que fala sobre o assunto com conhecimento de causa. Em seus dez anos de carreira, o papel que lhe deu mais trabalho foi o protagonista do último ano de Chiquititas, do SBT. Rian era o típico mocinho do bem: certinho, bom até a última raiz do cabelo e eterna vítima dos vilões da história. “É tudo mundo enganando o cara o tempo inteiro e você ali, fingindo que não sabe de nada. Isso é complicado na tevê, onde a gente trabalha o tempo todo com o naturalismo”, pondera.

Sem complicação

Apesar da preocupação, Carmo não teve muito trabalho para criar Sérgio. Na opinião do ator, os personagens que exigem mais empenho na construção são aqueles que dependem da composição de tipos distantes dele próprio – o que não é o caso de Sérgio. Carmo destaca tratar-se de um personagem urbano, sem grandes complicações de personalidade e com uma idade próxima à dele, 33 anos. “Ele não é distante de mim, e a tevê trabalha muito com isso”, justifica o ator.

Pela terceira vez no SBT, Carmo se orgulha de já ter passado pela Band, pela Record e pela Globo. Das emissoras que já produziram teledramaturgia no Brasil, faltou apenas a Manchete. A carreira começou em Cara e Coroa, da Globo, em 1995. Logo depois, ele interpretou o filho da personagem de Cláudia Raia na minissérie Engraçadinha, Seus Amores e Seus Pecados. De lá para cá, dividiu-se entre as outras três emissoras. “O fato de passar por várias emissoras me ajudou a amadurecer. Passei por dificuldades ao me adaptar a diferentes tipos de linguagens”, valoriza o ator.

Preocupado com a função social de sua profissão, Carmo vai na contramão dos atores que vivem reclamando da falta de mercado. Segundo ele, poucos são os colegas que se preocupam em gerar idéias que possam se transformar em novas oportunidades de trabalho. “Ninguém pensa sobre que assunto quer discutir, o que pode acrescentar. Fica todo mundo esperando ser contratado para a próxima novela das oito”, dispara Carmo, que fica extremamente irritado com as “cobranças” que o ator sofre para estar na tevê, na Globo e na novela das oito. “As pessoas pensam que só é ator quem está lá. Mas nossa função é muito maior que simplesmente ser contratado pela emissora mais poderosa do País”, conclui, incisivo.

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