Livro passa Cuba a limpo

Uma ilha de 110.860 quilômetros quadrados a 180 km da Flórida, com 11 milhões de habitantes, que há 43 anos tem resistido a um sufocante bloqueio comercial imposto pelos EUA. E isso ostentando políticas sociais invejáveis, com acesso a saúde, educação, moradia e demais serviços públicos de altíssima qualidade. Se é assim, por que tanta gente tenta fugir da ilha de Fidel? E a “ditatura” cubana, as restrições aos direitos civis, as supostas perseguições? E a miséria, a falta de comida e de bens básicos de consumo? E a razão para a manutenção do bloqueio, passados mais de 10 anos do desmoronamento da União Soviética e do conseqüente fim da Guerra Fria? Essas e outras questões estão no livro Cuba ? 300 perguntas, 300 respostas, que o embaixador cubano no Brasil, Jorge Lezcano Pérez, lançou ontem em Curitiba.

“Buscamos informar sobre a História, características naturais, sistema político, economia, instituições, políticas sociais, relações internacionais e os desafios que enfrentamos a cada dia para garantir a nossa soberania e independência”, resume o embaixador na introdução da obra. O resultado é um livro didático, claro e objetivo, que em 128 páginas tenta esclarecer as maiores dúvidas e curiosidades sobre o país. Jorge Pérez afirma ter consultado mais de 20 fontes, além do seu próprio conhecimento e de dados oficiais do governo cubano, registrados nas Nações Unidas. “Lógico que informações mais detalhadas exigiriam uma obra editorial muito mais ampla, mas asseguro que todas essas questões fundamentais foram respondidas de forma direta, com objetividade, transparência e rigor histórico”, garante.

Quando o assunto é Cuba, uma das primeiras questões que vem à tona é por que os EUA mantêm o bloqueio comercial passados tantos anos do fim da Guerra Fria. Jorge Pérez responde: “Cuba hoje não representa a menor ameaça aos EUA, seja do ponto de vista econômico, militar ou político. O problema é que o governo americano sempre quis ser dono de Cuba. Chegou a governar o país durante quatro anos, de 1898 a 1902, quando foi instalado um governo pseudodemocrático, com uma cláusula na Constituição que dava aos americanos o direito de intervir militarmente”.

O embaixador conta que cinco capítulos do livro se dedicam ao assunto. Na penúltima resposta, ele informa que “nenhuma atividade econômica cubana saiu ilesa dos severos danos do bloqueio americano”. O prejuízo, calculado por peritos cubanos, chegaria a US$ 121 bilhões desde o início do bloqueio, em 1960. “É o equivalente a 15 vezes o nível de exportação de 1989, o mais alto da História de Cuba, o que corresponde a cercear 15 anos de desenvolvimento”, explica.

Portanto, o bloqueio seria o grande responsável pela miséria e pela dificuldade de acesso da maioria da população aos bens básicos de consumo. “Não temos linhas de crédito com os países que são parceiros comerciais dos EUA, o que nos obriga a importar de países muito mais distantes, o que encarece muito o frete e os próprios produtos”, denuncia. “Estamos a 180 km da Flórida, o maior produtor de arroz dos EUA, os produtores de lá estão loucos para exportar para nós, e somos obrigados a importar arroz do Vietnã, que custa três vezes mais.”

Jorge Pérez lembra que desde 1993 Cuba vem reiteradamente apresentando à Assembléia Geral da ONU resolução pedindo o fim do bloqueio, e que a imensa maioria dos países membros das Nações Unidas a apóiam. “Só os EUA, Israel e uma pequena ilha da América Central defendem o bloqueio”, ressalta.

Ditadura

E a “ditadura” de Fidel Castro? Segundo o embaixador, não existe ditadura em Cuba: “No meu país se cumpre rigorosamente todos os princípios democráticos presentes na Declaração Universal dos Direitos Humanos e na Conferência de Viena de 1993. Nossas eleições são periódicas, garantem o voto livre e secreto, e são aprovadas pela comunidade internacional”. O próprio Fidel Castro se submete de cinco em cinco anos a duas eleições, uma nas assembléias populares e outra na Assembléia Nacional do Poder Popular, o parlamento cubano. Se perder uma dessas eleições, o “comandante” deixa o governo.

Quanto ao êxodo dos cubanos, Jorge Pérez esclarece: “Os EUA têm uma lei migratória exclusiva para Cuba, a chamada Lei dos Pés Secos. Qualquer cidadão do mundo que seja flagrado entrando clandestinamente nos EUA é automaticamente deportado. Mas se for um cubano, ele ganha moradia, emprego e cidadania americana. Isso força a imigração pelo mar”. Como resposta, Cuba tenta conter o êxodo com rígidas leis de imigração e saída do país. “Caso contrário, eles atrairiam nossos médicos, engenheiros, cientistas e talentos de todas as áreas”, acusa. Apesar de todas dificuldades, Pérez relata que a popularidade do “comandante” se mantém intacta. “O povo o adora”, garante.

E o futuro de Cuba quando Fidel Castro deixar o governo? “A Lei define que o substituto do presidente é o primeiro vice-presidente (hoje o irmão de Fidel, Raúl Castro)”, conta. “Ele conclui o mandato, e depois precisa se submeter a nova eleição. Ao contrário do que dizem os americanos, a renovação do poder em Cuba já está em curso: nenhum dos atuais ministros de Estado estiveram com Fidel em Sierra Maestra. Todos são jovens.”

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