Guignard pintava o visível como se imerso em estado de sonho

O Brasil ?em festa?, ?em névoas?,  ?em suspensão?, idealizado e imaterial é o universo de Alberto da Veiga Guignard (1896-1962). Entre tantas outras possíveis, os motivos escolhidos pelo artista para seus contextos é a faceta que os curadores Priscila Freire e Paulo Schmidt buscaram ressaltar na seleção das 60 obras em exibição. ?Tentamos mostrar o Brasil onírico de Guignard a partir dos motivos que o atraíram, que o impulsionaram na alma, no coração, na arte e em Minas?, afirmam os curadores.

A mostra apresenta auto-retratos, retratos, desenhos, paisagens e naturezas-mortas. Segundo Priscila, que também é diretora do Museu de Arte da Pampulha (BH), Guignard pintou pelo menos 11 auto-retratos em diferentes épocas e é a primeira vez que, uma parte deles, serão apresentados em conjunto. Neles é possível observar o corte no lábio superior ?lábio-leporino?  que Guignard não se preocupou em esconder, ao contrário, transferiu para diversas obras o ?defeito? de nascimento como nas figurações de Cristo.

Autor de retratos de personagens históricos da cena pública brasileira como o paisagista Burle Max, do artista Ismael Nery e do escritor Murilo Mendes, entre outros, os retratos representam um segmento importante na mostra. ?Ele pintava os fundos das telas, que não era muito comum, e sempre acrescentava elementos que tinham relação com o personagem que estava pintando.?

Segundo a curadora, o desenho é outra técnica de grande importância na obra do artista. ?Guignard foi um grande desenhista. Os desenhos são realmente obras de excelência na produção dele.? Mas em seus personagens, paisagens e obras de temática religiosa o que mais impressiona é a forma como os expressou. ?Ele sempre pintou a alma brasileira como uma festa. No mulato dele há uma dignidade impressionante. Guignard faz uma ficção na pintura, em busca de estados ideais. Por isso, é sempre uma festa.?

As obras presentes na exposição pertencem a acervos de instituições públicas e particulares. Entre eles, há obras das coleções do Museu de Arte da Pampulha, do Museu Casa Guignard de Ouro Preto, do Museu Nacional de Belas Artes do Rio de Janeiro, da Fundação Roberto Marinho, da Coleção Gilberto Chateaubriand /Museu de Arte Moderna do Rio e do Instituto de Estudos Brasileiros da Universidade de São Paulo. Além de uma paisagem da Fundação Cultural de Curitiba.

Europa e Brasil

Guignard é considerado um dos maiores artistas plásticos brasileiros. Apesar de ter a base de sua formação na pintura alemã, ao retornar ao Brasil descobriu seu próprio caminho para retratar o País tropical que o encantou. ?Ele viveu muito tempo na Europa e, quando chegou aqui, ficou muito impressionado com as cores, com a exuberância de nossas paisagens?, explica Priscila Freire.

Nascido no Rio de Janeiro, aos 11 anos mudou-se com a família para a Europa. Antes de voltar às origens, viveu na Suíça, na França, na Alemanha e na Itália. Entre 1915 e 1923 freqüentou a Real Academia de Belas Artes de Munique, recebendo aulas de Hermann Groeber (1865-1935) e Adolf Hengeler (1863 ?1927).

Em Florença (Paris -1928), conheceu Utrillo e Henri Matisse (1869-1954), enquanto realizava curso de aperfeiçoamento. De volta ao Brasil, em 1929, fixou-se novamente no Rio de Janeiro e através de Ismael Nery  integrou-se ao cenário cultural. Durante os 15 anos que permaneceu no Rio, atuando também como professor e organizador de exposições, teve a oportunidade de se relacionar com Cândido Portinari, Di Cavalcanti e Oswaldo Goeldi.

Em 1944, a convite do então prefeito de Belo Horizonte, Juscelino Kubitschek (1902 ? 1976) criou e dirigiu o Curso Livre de Desenho e Pintura. Pela escola passaram Amilcar de Castro (1920 ? 2002), Farnese de Andrade (1926 ? 1996) e Lygia Clark (1920 ? 1988), entre outros. Guignard permaneceu à frente da escola até falecer, em 1962. Em sua homenagem, a escola passou a se chamar Escola Guignard, também conhecida como Escola do Parque. Ele morreu e foi sepultado em Ouro Preto.

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