Eu, Robô: dilema da relação homem x máquina

Quem leu Isaac Asimov bem se lembra de que o encanto da sua fantasia sobre robôs repousa sobre as leis lógicas que regem o comportamento das máquinas. Primeira lei da robótica: um robô não pode causar danos a um ser humano. Segunda lei: um robô deve obedecer a um ser humano, desde que isso não conflite com a primeira lei. Terceira lei: um robô deve cuidar de sua própria sobrevivência desde que isso não conflite com as leis anteriores.

Eu, Robô, levemente inspirado no livro e dirigido por Alex Proyas, conserva essa base lógica inventada por Asimov, e descarta quase todo o resto, o conteúdo da trama inventada pelo escritor russo radicado nos Estados Unidos. Asimov escreveu na década de 1950, quando os robôs da vida real eram máquinas toscas se comparadas às de hoje. Mas, mesmo agora, não se chegou a inventar algum tão inteligente quanto aqueles criados pela boa imaginação de Asimov. E, claro, muito menos parecidos aos que se vêem no filme. Mas o que interessa de fato é a base da história, de uma história na verdade antiga como a Bíblia e cheia de variantes: pode a criatura voltar-se contra o criador?

Essa dúvida é o que movimenta o universo, em princípio benigno, da tecnologia aplicada a serviço do homem. Com os robôs, em tese, os seres humanos passariam a dispor de serviçais eficientes, calados, obedientes, que não reivindicam direitos trabalhistas. Uma legião de escravos tecnológicos, enfim. O policial Spooner (Will Smith) é um desses (raros) seres humanos ingratos, que não confiam nos robôs e, na verdade, os detestam.

O menos interessante em Eu, Robô é que, planejado para ser um blockbuster, um sucesso de bilheteria (como de fato está sendo nos Estados Unidos), tem de se valer de uma série de clichês do cinema de ação. Assim, não podem faltar cenas de perseguições de automóveis (um modelo especial de Audi foi criado para o filme), pancadarias entre humanos e andróides, e cenas de lutas em lugares altos.

Mas, nenhuma imagem de grande poder, como de outros clássicos de ficção, aparece em Eu, Robô. Não se trata nem de dizer que seria um belo conteúdo em uma forma precária. Isso não existe. Há muito se sabe que, no cinema, o conteúdo se tece na forma. Faltou a quem escreveu a partir de Asimov e, depois, a quem dirigiu o roteiro, captar, de maneira visual, a profunda inquietação implícita dessa meditação sobre a relação entre homem e máquina. Faltou compreensão do original.

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