Autor abusa de clichês para tentar prender o público à Belíssima

Algumas tramas parecem menosprezar a inteligência do público. Em Belíssima, por exemplo, algumas situações são tão manjadas que chegam a causar náuseas. Como a cruel vilania do monocórdio André, de Marcello Antony, ou a desnecessária e interminável tolice de Júlia, de Glória Pires, que ainda não percebeu o quanto está sendo enganada pelo marido. Já as mortes dos personagens Valdete, Pedro e Bia Falcão, por exemplo, de Leona Cavalli, Henri Castelli e Fernanda Montenegro, reforçam a sensação de que se assiste a uma espécie de ?Vale a Pena Ver de Novo?. Pois o mistério dos assassinatos está muito parecido com o que embasou A Próxima Vítima, outra trama de Sílvio de Abreu, exibida em 1995, com o mesmo clima de ?quem matou quem?. Isso sem falar da inexplicável exumação de um personagem que mal deveria entrar em uma trama, quanto mais em duas. Caso do cansativo Jamanta, de Cacá Carvalho, de Torre de Babel?, um dos suspeitos dos assassinatos.

Por trás das ?mortes misteriosas?, a cada dia aparecem novos suspeitos. Pelo menos um personagem a cada núcleo se mostra injustificadamente tenso quando se fala dos assassinatos, truque usado desde a década de 40 do século passado nas novelas da Rádio Nacional para abrir o leque de possíveis assassinos. Outro recurso dramatúrgico igualmente pobre, que explicita a parcimônia criativa da trama, é fazer com que personagens escutem casualmente conversas comprometedoras dos outros. Em Belíssima, esse tipo de ?acaso? já chegou a ocorrer quatro vezes no mesmo capítulo.

Dentre os personagens acometidos de estranha tensão quando são mencionados os assassinatos, o mais incomodado de todos é o sonso André, do belo Marcello Antony. Apesar dele estar visivelmente esforçado para tentar assumir o papel de vilão, não dá para entender como o autor arriscou retirar da trama uma vilã do porte da Bia Falcão de Fernanda Montenegro e transferir a responsabilidade pelas malvadezas para um ator com parcos recursos interpretativos. Caso Sílvio de Abreu tenha algum trunfo na manga para transformar qualquer outro personagem em vilão, corre o risco do público se sentir ainda mais enganado, pois desta forma ficaria muito mais banal qualquer desfecho. Se bem que, pelos finais casuísticos que deu às novelas A Próxima Vítima e Torre de Babel, esse tipo de preocupação não deve ocupar os pensamentos do autor.

Compensação

Mas, independentemente da discussão de quem vai arcar com o título de vilania-mor da trama das oito da Globo – que estreou com média de 54 pontos no ibope e share de 73%, mas tem registrado a média nada espetacular de 45 pontos no ibope, com share de 68% -, algumas atuações compensam muitas das situações estapafúrdias apresentadas pelo autor. Pedro Paulo Rangel, por exemplo, se supera a cada dia com o amável e irônico Gigi. Porém, quem tem surpreendido num crescente destaque na trama é Reynaldo Gianecchini, com o ogro mecânico Pascoal, muito bem composto pelo esforçado ator, que inseriu expressões faciais bem toscas ao romântico paulistano.

 Outro que de fato dispensa elogios é o grego Nikos, de Tony Ramos, que tem o hábito de ?engolir? seus companheiros de cena. Principalmente durante todas as vezes que o personagem tenta defender a tola Júlia, da igualmente impagável Glória Pires que, nesta novela, merecia um papel com uma personalidade menos embaçada. Quem também não está sendo tão aproveitada quanto deveria é Vera Holtz. Na pele de Ornela, a coroa tarada por menininhos, a atriz merecia mais destaque em sua história, que parece se perder com o crescente interesse do seu objeto de desejo, o Mateus, de Cauã Reymond, por Giovana, da estreante Paola Oliveira. O que se constata com essas histórias paralelas, que possuem altos e baixos, é a tradicional fórmula utilizada por grande parte dos autores: pipocar diversos assuntos em tramas diferentes para abrir o leque de possibilidades. Mas muitas vezes o tiro sai pela culatra: grandes atores são desperdiçados em papéis secundários e o público sempre fica com a sensação de que comprou gato por lebre.

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