A última do joalheiro da MPB

Rio – Não há nada igual em toda a música brasileira. Flávio Venturini é dos compositores mais tocados nas rádios jovens do país com Mais Uma Vez, sua parceria com Renato Russo. É dos compositores mais tocados nas rádios populares do país com Fênix, parceria com Jorge Vercilo. Não pára de tocar nas rádios “adulto-contemporâneas” com Noites com Sol, executada desde que foi lançada há nove anos.

Ainda consegue agradar desde os ouvintes mais exigentes, com canções sofisticadas como Nascente, aos adolescentes das rodinhas de violão que não param de tocar Linda Juventude e outros sucessos do seu antigo grupo, o 14 Bis. Do ouvinte de jazz, que curte suas intrincadas harmonias mineiras, ao roqueiro que se lembra do progressivo grupo O Terço.

“E você está esquecendo de Espanhola”, ri Venturini, lembrando seu maior sucesso, a única música que rivaliza com Andança nas noites de violão em torno da fogueira. Quase tímido, ele tenta entender como sua música muitas vezes sofisticada faz dele senão o maior, pelo menos o mais discreto dos hitmakers brasileiros.

“Acho que é o gosto pela melodia”, arrisca. “Como compositor, curto realmente mexer nas harmonias, fazer canções bem trabalhadas. Mas não sou um Guinga, com aquelas harmonias incríveis, jobinianas. Minha música tem uma simplicidade. Daí talvez algumas sejam muito populares”.

Na verdade, e Venturini sabe disso, não há explicação fora da formação de sua geração de compositores mineiros, que ouviam – e juntavam -a tradição sofisticada da MPB com a música pop dos Beatles. Até hoje, ele busca essa liga. “O que mais tenho ouvido nos últimos anos é o (guitarrista americano) Pat Metheny. Mas também adoro coisas romanticonas como a Natalie Cole”, confessa. “E música eletrônica. A melodia, a inspiração, isso não muda. O que se transforma com o tempo, e tem que ser sempre atual, é a forma com que isso é apresentado”.

Venturini lança agora Porque Não Tínhamos Bicicleta, seu primeiro disco de canções inéditas desde 1996 -após duas antologias, Trem Azul (1997), do Clube da Esquina, e Linda Juventude ao Vivo (1999), de sua carreira. É também o primeiro trabalho pelo seu próprio selo, o Trilhos.Arte. O trabalho reflete tudo o que foi descrito acima: várias canções candidatas ao sucesso, muita melodia, muita harmonia sofisticada e a mistura de influências, do barroco (Céu de Santo Amaro, letra sua sobre tema de Bach, cantada com Caetano Veloso, já que versa sobre a cidade natal do baiano) a baladas roqueiras como Máquina do Tempo, do mineiro Aggeu Marques, que em breve lança seu disco pelo selo de Venturini.

“É um disco de canções”, define o mineiro. “Fundei meu próprio selo, entre outras coisas para realizar um velho sonho, um disco instrumental, que ainda vou fazer. Mas notei que há muito tempo não fazia um disco de canções. Desta vez resolvi misturar inéditas minhas com novos autores que admiro, como o Aggeu e a Vanessa Rangel, que me mandou uma linda canção, Pra Lembrar de Nós.

Para ele, os momentos marcantes do disco são, além das tradicionais canções de amor com os parceiros Ronaldo Bastos e Murilo Antunes, sua primeira parceria com Fernando Brant (Trator) e a retomada da parceria com Milton Nascimento, a mística Música. “Quando fiz essa canção, sonhei muito com o Milton, com quem há muito tempo não compunha”, diz. “Então mandei a música para ele”.

Um sonho também deu origem ao título do disco, que não tem qualquer sentido além de ser uma frase bonita -“Porque não tínhamos bicicleta”. Dos sonhos literais aos sonhos figurados, Venturini planeja reeditar a formação clássica do grupo O Terço (com Sérgio Hinds e Sérgio Magrão), que só não aconteceu ainda pela morte repentina do baterista Luís Moreno. E vai tocar seu selo, que além de lançar seu novo disco, relança também Noites com Sol (disco de ouro há nove anos) e Beija-flor, de 1996. E, hitmaker que é, continuará correndo o Brasil cantando seus muitos sucessos, Todo Azul do Mar, Besame, Anjo Bom, Planeta Sonho… e tome sucesso.

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