Superioridade dos quenianos é alerta para os brasileiros

Dois quenianos, os autores das frases mais insólitas da semana da corrida de São Silvestre, que eles venceram na última quinta-feira.

A jovem corredora, de 21 anos, chegou em São Paulo falando grosso: “É muito fácil ganhar das brasileiras”. O agora bicampeão da principal prova do atletismo brasileiro, 26 anos, desfez das próprias chances em plena entrevista coletiva: “Eu não estou no meu melhor. Vim para curtir e passar o réveillon no Brasil”.

Pasalia e James, além de saírem do protocolo das declarações, retrataram a profunda superioridade dos atletas do Quênia nas provas realizadas no Brasil. Apenas em 2009 eles venceram 42 das 47 corridas de rua promovidas no País.

Tomaram as provas e os patrocínios – todos eles chegaram com forte apoio, inclusive das subsidiárias brasileiras das empresas de material esportivo. “É o que faz a diferença. Eles ganham, e no Brasil só patrocinam quem ganha”, reclamara Marizete Rezende na véspera da São Silvestre.

“Todo ano fica mais difícil para a gente, porque elas vêm em maior número”, ressaltou Marily dos Santos, a terceira colocada na corrida de quinta (a melhor brasileira na São Silvestre).

A corredora reclamou da atitude das estrangeiras, principalmente da vencedora Passalia. “A gente pode não ganhar, mas a gente vai atrapalhar sempre. Elas não podem chegar no Brasil e dizer que vão passar por cima”, desabafou.

A polêmica sobre o predomínio queniano passa pelo Paraná. Uma das equipes que “adota’ os quenianos está sediada em Nova Santa Bárbara, no interior do Estado, a 308 km de Curitiba.

O treinador Moacir Marconi, o “Coquinho”, que orientou Pasalia Kipkoech, recebeu inúmeras críticas durante a semana que antecedeu a São Silvestre. Ressentido, Coquinho ameaçou encerrar com a parceria com os quenianos – ele traz e treina os estrangeiros, e ganha parte da premiação das provas vencidas por eles no País.

Ao mesmo tempo, a Confederação Brasileira de Atletismo (CBAt) decidiu restringir o número de quenianos nas provas de rua – como as do Circuito Caixa – em três. Na São Silvestre, entretanto, para aumentar o nível da disputa, foram permitidas cinco inscrições por país, gerando reclamações dos brasileiros. “Eles estão muito melhores”, resumiu Clodoaldo Gomes da Silva, o melhor do País entre os homens, terminando a corrida em oitavo. Alguns especialistas não acham que a restrição da presença dos quenianos melhorará o atletismo de rua do Brasil. “Nós temos é que aprender com eles”, disse Lauter Nogueira, treinador e comentarista da TV Globo.

“Nós somos tão bons quanto os quenianos. O que nos falta é disciplina e eficiência. Eu quero enfrentar e ganhar. Quando o Carlos Lopes (português, quatro vezes campeão da prova) vinha para cá, a gente enfrentava e ganhava. Não adianta nada vencer se os melhores estão fora”, atirou o técnico Carlos Ventura, que orientou José João da Silva nos títulos de 1980 e 1985. “Eu tenho aprendido muito com as estrangeiras”, concordou Maria Zeferina Baldaia, quarta colocada na São Silvestre.

Enquanto o Brasil discute como conviver com a superioridade alheia, os quenianos comemoraram mais um réveillon de predomínio – colocando quatro atletas entre os melhores colocados no masculino e no feminino.

“Eu usei da minha tática para abrir vantagem e me poupar na subida”, ensinou Pasalia Kipkoech. “Não foi tão fácil como no ano passado, mas fui melhor que meus adversários. E peço desculpas pelo que falei antes, pareci ridículo falando que não iria ganhar”, finalizou James Kwambai.

Uma corrida paralela, pelo melhor espaço na mídia

São Paulo – A disputa polarizada entre PT e PSDB ficou novamente exposta na corrida de São Silvestre da última quinta-feira. Se não havia a presença física dos políticos que vão ser os protagonistas da eleição presidencial de 3 de outubro, havia a ostensiva presença dos apoiadores e patrocinadores, oficiais ou não, da principal prova do atletismo brasileiro. Era uma luta por espaço, que terminou, digamos assim, em um empate.

De um lado, estavam a prefeitura de São Paulo e o governo do estado de São Paulo. “Patrocinadores especiais” da São Silvestre, marcavam presença involuntariamente, mas por todos os cantos da corrida – seja pelo comboio promovido pelos policiais militares, seja pelos agentes de trânsito com seus coletes da Companhia de Engenharia de Tráfego (CET), que orientavam atletas, jornalistas e transeuntes desde o início da manhã. Para completar, prefeitura e governo se apresentaram nos banners da cerimônia de entrega dos troféus e da entrevista coletiva.

Perante esta intensa “publicidade’, as empresas estatais reagiram com estilo. Patrocinando a transmissão da TV Globo, Caixa Econômica Federal (também patrocinadora oficial do atletismo brasileiro) e Correios apareceram para toda a audiência que acompanhava a prova pela televisão – e também para quem estava na Avenida Paulista, pois havia placas de publicidade ponto da chegada dos vencedores.

Organização

Os números grandiosos da São Silvestre (mais de 20 mil participantes, 22 ambulâncias, 450 mil copos de água, por exemplo) não geraram dificuldades na organização. Não houve ocorrências mais sérias durante a disputa. (CT)