São-paulinos partem pra guerra

São Paulo – A torcida Independente está indo para Buenos Aires, onde o São Paulo joga amanhã contra o River, pronta para uma guerra. Para os que partiram ontem de ônibus, o mais difícil serão as 42 horas de viagem. Todos garantem que não estão com medo – não armaram nenhum esquema de segurança com a polícia argentina e advertem: ?Vamos na paz, mas se tiver confusão nós temos uns 30 caras grandes prontos para a briga?, diz Daniel Vilar de Castro, um dos diretores da torcida.

Vários dos torcedores e diretores que estavam ontem na sede da Independente têm ?marcas de guerra?. São cicatrizes de batalhas travadas em outras brigas de torcidas. Um deles é Marcos Lopes, o Quinho, diretor da torcida, que já levou um tiro na perna. ?Vamos esperando por briga. Pelo São Paulo a gente mata e morre. E se esse é o jogo da vida do São Paulo, também é o jogo das nossas vidas.?

O dirigente, que viaja amanhã de manhã, de avião, ainda brinca: ?Quando me despedi da minha mãe já avisei que não sabia se voltaria para casa. Mas não tememos a torcida do River. Eles são mais elitizados. O povão lá é o Boca Juniors. E, além disso, não importa quantidade, e sim qualidade. Para nós, a torcida deles não é nada?.

Daniel Vilar de Castro tem uma cicatriz na testa. ?Foi uma paulada. Levei 13 pontos, mas já faz mais de dez anos. Nem lembro mais. Tenho outras cicatrizes. Mas estamos desenvolvendo um trabalho para desarmar a torcida. Já faz tempo que não me meto em brigas.?

Ele tranqüiliza: ?Esse clima, quem está criando é a imprensa. Não tem nada de guerra. Já ligaram da Argentina e mandaram e-mail para nos ameaçar, mas quem fez isso não foi o cara que veio aqui para o primeiro jogo. Assim como os que atiraram pedras no ônibus do River aqui não são os mesmos que irão para Buenos Aires. A verdade é que não tivemos nada a ver com a confusão. Foram outros torcedores e a PM que enfrentaram os argentinos, só que nós levamos a fama. Não temos o que temer?.

Há dois anos, o associado Alexandre dos Santos tomou um tiro na mão em Campinas, onde veria um jogo contra a Ponte Preta, mas não se intimidou. ?Três dias depois, com o River, pela Copa Sul-Americana, tomei um tiro na cabeça e fiquei seis meses de molho. Minha mãe chora, mas não tem jeito, sabe que sou fanático. E quando eu tiver um filho vai ser da Independente desde pequeno.?

Alexandre acredita que esta semana os ânimos estarão ainda mais acirrados. ?Vão ser três confrontos entre Brasil e Argentina: pela Sub-20, a seleção principal e São Paulo e River. Estamos preparados?, assinala o também professor de luta.

Alguns desconversam, como Ayrton da Silva. ?Para nós será apenas mais um jogo. Foi a imprensa que fez dessa partida um barril de pólvora. Estamos calmos e vamos sem medo, como sempre.?

Time preocupado com o jogo aéreo

São Paulo – O técnico Paulo Autuori dedicou grande parte do treino de ontem do São Paulo para corrigir e orientar posicionamento de seu setor defensivo, para evitar surpresas nas bolas paradas e no jogo aéreo argentino. Além dos três zagueiros Lugano, Alex e Fabão, os volantes Josué e Mineiro, o meia Danilo e o atacante Luizão terão de estar na área são-paulina em todo lance de escanteio ou falta do River Plate.

?Ele nos disse que os argentinos vão tentar, a todo momento, fazer gols em cruzamentos para a área. Principalmente nos minutos finais, se estivermos com bom resultado?, revelou o zagueiro Alex, também um estreante em jogos na Argentina. ?Foi mais por precaução, pois nosso time demonstrou grande futebol no jogo de ida, principalmente na defesa?, concluiu o atacante Amoroso.

Alex é outro jogador que engrossa o coro de não estar com medo de nada. ?Sei que dentro de campo o pau come, mas já vivi situação muito ruim aqui mesmo no Brasil?, afirmou.

Lembrava-se da fase final da Série C do Brasileiro de 2002, ainda pelo Santo André. ?Os vestiários estavam trancados, a gente se trocou no corredor, muito fedido, e encarou pedradas?, lembrou. ?Sem contar que a cada gol deles, a torcida invadia o campo.? O duelo acabou 3 a 1 para o Bragantino.

River promete dar o troco ?com nobreza?

Buenos Aires – ?Hay que meter presión?, era a frase mais ouvida entre os torcedores do River que formavam poucas filas ontem à tarde no Estádio Monumental de Nuñez em busca de ingressos para a partida de amanhã contra o São Paulo. Mas se serve de consolo, a pressão se refere apenas à partida. Pressão dentro de campo, tentando impedir a saída de bola do São Paulo. Nada mais.

A previsão é de que os 65.646 ingressos colocados à venda se esgotem. Os mais baratos já terminaram e ontem faltavam apenas nove mil a serem vendidos. O Monumental estará lotado.

O presidente José Maria Aguilar e o treinador Leonardo Astrada trataram, desde quinta-feira passada, de acalmar torcedores que estavam muito irritados com a recepção que tiveram no Brasil, com o apedrejamento dos ônibus que os levaram ao Morumbi. ?Vamos responder a tudo com muita nobreza?, disse Aguilar. ?O River vai ganhar o jogo em campo?, completou Astrada.

Com a derrota de 3 a 0, domingo, para o Rosario Central, ficou muito difícil para o River conseguir a classificação para a Libertadores de 2006. Algo que não tira o sono de Astrada. ?Vamos disputar a Libertadores de 2006 porque vamos ganhar a de 2005. Tenho certeza disso.?

Os torcedores chegam a mostrar certa irritação quando se pergunta sobre a possibilidade de pessoas ficarem em frente ao hotel do São Paulo vaiando a equipe ou fazendo ameaças. ?Isso é coisa dos ?bosteros?, não de torcedores do River?, diz Javier Mendoza, estudante de 22 anos, referindo-se aos torcedores do Boca.

A polícia não levará um dispositivo extra de policiais para a partida. Serão 700, bem menos que os 1.200 que se disponibiliza para um clássico contra o Boca, por exemplo. Parte dos torcedores entende que o que houve no Brasil foi uma briga mais com a polícia do que com os são-paulinos.

?Os torcedores do São Paulo terão toda a proteção necessária na partida. Tenho certeza de que não haverá incidentes e que a partida vai ser decidida entre os jogadores?, diz Eduardo Granuc, o responsável pelo policiamento. ?E, pelo que me contaram, o que aconteceu no Brasil é que os torcedores do River bateram na polícia e não o contrário?, diz, com um risinho irônico.

Todo o discurso e a aposta em tranqüilidade esbarram, porém, nos terríveis ?Los Diablos del Tablón?, a mais violenta torcida organizada de toda a Argentina. Havia 300 deles no Brasil, na linha de frente da briga contra a polícia. Aqui, estarão em sua totalidade, cerca de 1.500 integrantes.

Os ?borrachos? têm casos de morte nas costas, orgulham-se da violência e, em seus cantos de guerra, mostram posturas racistas.

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