Curitiba

Guerreiro, Bife Sujo já sobreviveu a um incêndio e está driblando a pandemia

Escrito por Gustavo Marques

De servente de pedreiro para o comando de um dos restaurantes mais tradicionais de Curitiba. Ponto democrático de encontro de personalidades da política, da poesia e do mundo artístico que com conversas informais regadas a cerveja gelada e copos de esprimidinha (cachaça com limão), sonhavam em mudar o rumo da sociedade. O Bife Sujo, localizado na Rua Saldanha Marinho, no Centro de Curitiba, segue firme com o mesmo propósito da fundação na década de 70, a de servir a todos sem preconceito e vencendo todos os tipos de batalhas desde incêndios a pandemias.

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Cesar Antônio Wisnievski, 53 anos, é responsável por manter a tradição e os costumes deste bar que rodou gerações sem deixar de lado a boa resenha com os clientes e a memória de ter acompanhado a trajetória de muita gente que ali passou e virou prefeito, governador e até presidente da República.

Cesar Antônio Wisnievski, 53 anos, é responsável por manter a tradição. A reportagem visitou o bar antes da pandemia, por isso a ausência de máscara.

O Bife, como era conhecido pelos frequentadores, foi aberto em 1976, pelo moçambicano Eduardo How. O nome oficial na época era Bar Elle e Ella e o dono e sua família moravam no andar de cima, na Rua Cândido Lopes, 331, bem próximo da Loja Americanas. Um dos pontos fortes no cardápio eram os petiscos gordurosos que acompanhavam na hora da cervejinha. No entanto, uma situação alterou definitivamente a história do bar. Certa vez, um cliente fez um pedido ao moçambicano de maneira irônica no grande balcão de madeira. “Quero um bife sujo nesta chapa”. O jornalista Márcio Geenen (já falecido) acompanhou o momento e aí o apelido do bar foi adotado na cidade.  “O jornalista teve uma felicidade incrível ao apelidar o sanduiche. O bife sujo tradicional contém um pão d’água, bife, queijo derretido e cheiro verde. Vendia demais e não tem como dimensionar a quantidade. Imagino que chegava a cem por dia”, relatou Cesar Wisnievski, antigo garçom e atual proprietário do restaurante.

O Bife mudou de dono e quem assumiu foi o advogado Rui Cesar da Fonseca que oficializou a alteração do nome. O bar seguiu com o mesmo modelo de atendimento e com personalidades no balcão e mesas.  Um dos expoentes foi o poeta e escritor, Paulo Leminski. O curitibano chegava e já tinha o espaço dele. Ficava em um dos cantos e nem precisava fazer o pedido. “Quem atendia ele, era o Pedro Pakuszewski. Levava na mesa o drinque Leminski que depois foi até para o cardápio. Era um copo de vodka, Martini, limão e gelo. Ele ficava ali escrevendo e dele só ficou as histórias. Não sobrou nenhum guardanapo”, comentou Wisnievski.

O Bife Sujo seguiu com o mesmo modelo de atendimento e com personalidades no balcão e mesas.

Além de Leminski, pelo Bife passaram personalidades como o ex-presidente Lula, os ex-governadores José Richa e Jaime Lerner, os cantores Martinho da Vila, Ivo Rodrigues (Blindagem), Roupa Nova, Maria Gadú e tantas outras pessoas de diferentes ramos profissionais. “Já vi muita gente que só tinha dinheiro para comer um bife sujo ou até mesmo um pneu agasalhado (sanduiche com um bolinho de carne, cheiro verde e maionese) e virou procurador da República. O Lula veio na época das Diretas Já e que lotava a Boca Maldita. O registro que temos é ele apontando para um Domecq, que era o melhor conhaque que tínhamos na prateleira. Ele chegou a voltar no Bife, mas aí eu não estava”, destacou Cesar.

Mudança de local

Já na década de 90, Rui Cesar da Fonseca, sugeriu aos três garçons mais antigos da casa que assumissem o controle do bar.  Cesar Antônio Wisnievski, Pedro Pakuszewski e Valdinei de Oliveira acabaram aceitando a proposta e reabriram o Bife Sujo na Saldanha Marinho, 479, atual endereço. Foram 48 dias de reforma no espaço e o retorno do Bife Sujo na cidade foi assunto nas rodinhas de conversa no Centro.  O trabalho foi intenso, pois os proprietários queriam deixar o bar com aquele mesmo estilo da Cândido Lopes. No dia na reinauguração, uma fila gigantesca se formou, pois, os clientes estavam ansiosos em conhecer o novo Bife.  “Levamos a fama e foi uma loucura. Quando abriu a porta, era gente desesperada entrando. Hoje em dia, até lembra aquelas promoções de Black Friday”, relembra o atual proprietário que ainda tem o auxílio do Valdinei. Já o Pedro Pakuszewski seguiu com outros projetos e trabalha com eventos.

Incêndio em 2007 e pandemia 2020

Em 2007, um incêndio durante a madrugada fez um enorme estrago no Bife Sujo. O fogo começou no escritório que ficava localizado no mezanino e causou um prejuízo estimado em R$ 100 mil reais. “Fui informado por um vizinho e quando cheguei, a rua estava isolada pela Polícia Militar. Entrei no Bife com os bombeiros e estava queimando tudo. Depois ficou comprovado que foi um arrombamento e os responsáveis deixaram uma espécie de vela no escritório. Ali foi um período muito difícil, mas ressurgimos das cinzas, como Fênix”, disse o dono.

 Depois do incêndio, foram 40 dias fechado. Uma placa foi colocada na frente do restaurante com a contagem regressiva para a reabertura. A data foi escolhida a dedo, 15 de setembro, dia do Cliente. Mais uma vez, a clientela fez fila e 300 pessoas estiveram no Bife comprovando que tradição não se brinca. Nas paredes, nem o fogo foi capaz de destruir os quadros com imagens em preto e branco, retratando as gerações de clientes em mesas fartas.

Treze anos depois do incêndio veio a pandemia do novo coronavírus que fechou todo o comércio. Foram dias de apreensão e por pouco, o Bife Sujo não teve que encerrar as atividades. “Posso dizer que foi pior que o incêndio, pois cheguei a pensar em acabar com tudo. Um período muito complicado, mas estamos confiantes que tudo vai voltar ao normal. Não precisei mandar nenhum colaborador agora e estamos atendendo conforme com toda a segurança possível. Colocamos pratos executivos até no cardápio. O Bife Sujo passou por mais esta”, orgulha-se Cesar.

Atualmente, o carro chefe do restaurante é a feijoada que é servida nas quartas-feiras e no sábado em cumbucas. Além disto, a costela assada nas sextas-feiras é atração. Nos outros dias da semana, existe o buffet como também a possibilidade de pedir o tradicional Bife Sujo, que chega à mesa como uma generosa porção de tiras de bife de ancho sobre a chapa, batata frita, arroz, feijão, farofa, maionese e tomate. (Nas quintas e sextas-feiras, o valor é de R$ 80 e serve bem para três pessoas). Já o sanduíche fica por R$ 18.

Serviço

Bife Sujo

Rua Saldanha Marinho, 479 – Centro

Horário: de segunda a sexta, das 11h às 14:30h

Sábados – 11h às 15:30h

Telefone: (41) 3224-3099

Sobre o autor

Gustavo Marques

(41) 9683-9504