O avião pagador

Final de tarde em Almirante Tamandaré. O bimotor atravessa apressado o céu, buscando alinhamento para pouso na pista 18 do aeroporto do Bacacheri, em Curitiba. A bordo do avião pagador, quatro tripulantes e uma quantia impressionante de dinheiro.

Trem de pouso baixado e travado, a tripulação acende os faróis para pouso e coordena pelo rádio a aproximação com a torre. É quando algo de muito errado acontece. O pontinho verde correspondente à aeronave simplesmente some da tela do controlador de voo. Mais tarde o resgate encontraria o motivo. Ao que parece, os pilotos foram surpreendidos por uma tesoura de vento, o que provocou uma instabilidade suficiente para causar uma tragédia. Piloto, co-piloto e um dos seguranças tiveram morte instantânea, causada pela desaceleração e impacto brutal do avião contra o solo. O quarto tripulante, também segurança, realiza agora a maior luta de sua vida.

Trazido ‘voando’ por um dos helicópteros de resgate, seu prognóstico é ruim pelo longo tempo encarcerado nas ferragens da aeronave. Politraumatismo, pelve esmigalhada, lesão medular e uma hemorragia extensa anunciam muito trabalho para a equipe da cirurgia. Consciente, mas pálido como uma folha de papel, talvez não haja tempo sequer de infundir sangue.

No meio daquele tumulto todo, percebo um interno de medicina em pânico, em seu jaleco limpinho. Seus olhos assustados revelam que ele não tem a menor ideia de como ajudar. De repente, ele se enfia no meio de tantos profissionais e me surpreende, agarrando com força a mão gelada do paciente. Conversando baixinho, acalmando, explicando o que estava acontecendo, aquele colega ficou ao seu lado até o final de tudo, quando o maldito apito do monitor anunciou a parada do coração. Havia entre nós uma esperança e um desejo, quase infantis, de que ele sobreviveria.

Tem lições que os livros não ensinam. Hoje aprendi que, às vezes, a ajuda necessária pode estar no simples amor ao próximo.

Este texto é uma homenagem aos caras que fizeram de tudo para salvar a tripulação daquele voo. À tripulação, céu de brigadeiro. Descansem em paz.