Gentilmente

Só sobrou o pó da gaita daquele flanelinha.

Gentilmente, ele havia pedido para cuidar de um carro que acabara de estacionar em ’sua rua’. Gentilmente, o motorista agradeceu, dizendo que não precisava. Gentilmente, o flanelinha avisou que alguns riscos poderiam surgir na lataria do veículo. Gentilmente, o dono do carro interrompeu o passo, voltou e amassou toda a lataria do corpo do flanelinha.

Não sei qual arte marcial o sujeito usou. Só sei que o ’cuidador’ de carros chegou ao pronto-socorro com os olhos arregalados. Em seu rosto, a expressão mais ampla e definitiva da palavra dor. Para você ter uma ideia, sua coluna ficou tão torta que não foi possível colocá-lo no aparelho de tomografia.

Jamais me atreveria a defender a violência como resposta à malandragem das ruas. Muito longe de mim. Mas essa história me levou a refletir sobre uma polêmica que se arrasta há décadas pela cidade, sem qualquer solução.

Alguns até dirão que existem flanelinhas honestos e trabalhadores. Mas acredite, a maioria está ali apenas pelo dinheiro fácil. Uma pesquisa realizada no Rio de Janeiro revelou que 70% desses guardadores tem alguma passagem pela polícia. Extorsão, roubo, agressão, associação com quadrilhas…

Aqui não parece ser diferente. Geralmente, são eles que ameaçam e machucam os donos de carros, principalmente os mais frágeis, como mulheres e idosos.

Um dia a gente aprende que flanelinhas são um mal desnecessário.

E, quem sabe, descobre uma maneira de se livrar deles.

Gentilmente, é claro.