Cartomantes e advogados

Com a crise moral e política que assombra a economia, no Brasil de hoje quem tem freguesia certa e garantida são os advogados e cartomantes. Os advogados vivem em fartura graças aos malfeitos dos eleitos, enquanto os eleitores estão convencidos de que “há mais mistérios entre o céu e a terra do que sonha a nossa vã filosofia”.

O escritor Machado de Assis, que tinha essa citação de Hamlet como uma de suas preferidas, no conto “A cartomante”, leva a insegura Ritinha a reconhecer ao amante (traduzindo Shakespeare “no vulgar”) que há “muita coisa verdadeira e misteriosa neste mundo”. A visita da infiel Ritinha à cartomante se deu numa sexta-feira de 1869, no Rio de Janeiro.
Hoje já não se fazem mais videntes como antigamente e os advogados trocaram o desquite pelo divórcio, como trocaram os batedores de carteira pelos criminosos de colarinho branco.

Em Curitiba, no que tange à leitura dos autos do futuro, tivemos dois notáveis videntes. O mago Sana-Khan foi o primeiro a ultrapassar a fronteira, quando ao examinar a mão de Getúlio Vargas, no Hotel Glória da Capital Federal, pegou na veia: “Vossa Excelência será o presidente do Brasil pela força das armas. Uma bela estrela, como esta, na região chamada de Júpiter, já é bem rara. Vossa Excelência tem quatro estrelas. Uma na mão direita e três na esquerda”.

Outro mago paranaense foi Michel Curi, cuja notoriedade foi posteriormente ofuscada pelo irmão Aníbal Curi, não por nada também considerado “bruxo” da política. Cartorário, Michel Curi era o cartomante da aristocracia paranaense. Na virada do ano, faziam fila para participar da vigília do vidente que, depois de se concentrar na penumbra, entrava em parafuso. Além de prever o futuro dos ilustres sócios do Country Clube e demais endereços do poder, Michel recebia a visita de ilustres nomes da política nacional.

Não é preciso ser advogado de corruptos e corruptores para ter a mais absoluta certeza de que há muita coisa verdadeira e misteriosa no desenrolar da Operação Lava Jato. São tantos os mistérios entre o céu e a terra que, para adivinhar o que há de ser do amanhã, só mesmo se baixarem os espíritos de Sana Khan e Michel Curi aqui na Boca Maldita.