Barriga de aluguel envolve questões psicológicas

Desde que foi tema de novela na televisão brasileira, no início da década de 1990, o termo “barriga de aluguel” tornou-se mais conhecido. A prática é como se chama coloquialmente o útero de substituição, também denominado gestação ou maternidade substitutiva. É a situação em que uma mulher engravida para outra, em geral para um casal, que criará a criança a partir do nascimento.

A idéia de uma mulher gestar um filho para um casal em que a mulher é impossibilitada por ser estéril é bastante antiga, sendo referida na Bíblia, no Antigo Testamento.

No livro sagrado, Abraão, então com 90 anos, instruído por Sara, sua esposa que era infértil, procura uma escrava, de nome Hagar, para ter um filho. Nasce Ismael (Gênesis 16, 1-15). Em outra passagem bíblica, Rachel também usa sua escrava para dar um filho a Jacó (Gênesis 30).

Tecnicamente útero/gestação/maternidade de substituição é a inseminação artificial ou a transferência de embriões fertilizados in vitro, para o útero de uma mulher que entregará a criança, ao nascer, ao casal que quer o filho.

Nos tempos da reprodução assistida, o primeiro nascimento por maternidade substitutiva ocorreu em 1978, fruto de inseminação artificial. O primeiro relato da mesma prática, mas por fertilização in vitro é de 1985.

Grau de parentesco

A doutora em Reprodução Humana, Mariangela Badalotti, no entanto, alerta que o assunto gera controvérsia tanto na sociedade quanto no meio médico. “Os argumentos a favor da permissão são que esse arranjo pode beneficiar as duas partes, e proibi-lo seria limitar a autonomia do casal infértil e das substitutas”, explica.

As objeções referem-se à seleção da substituta (vínculo comercial ou familiar). Isso porque a gestação substitutiva tanto pode ser um ato de generosidade e altruísmo quanto uma forma de auferir ou ter finalidade apenas lucrativa.

“Há possibilidade de exploração de mulheres economicamente necessitadas, que não avaliariam adequadamente os riscos do procedimento em função da vantagem econômica”, salienta a especialista, lembrando ainda a possibilidade de haver disputa pelo bebê ou abandono deste, quando do seu nascimento.

A maioria dos países não permite o pagamento da substituta, somente dos gastos com a gravidez, porém, alguns consideram aceitável tal remuneração. No Brasil, o Conselho Federal de Medicina (CFM) recomenda que as doadoras temporárias do útero devam pertencer à família da doadora genética, comprovando um parentesco de até segundo grau, sendo os demais casos sujeitos à autorização da entidade de classe.

Dessa forma, a utilização temporária do útero não terá caráter lucrativo ou comercial. Na mesma resolução, o CFM determina que a doação de gametas deve ser anônima, consequentemente não é permitida a utilização dos óvulos da substituta. 

De acordo com a doutora em reprodução assistida, a maternidade de substituição é eticamente aceitável se for indicada por questões médicas, se não houver pagamento à substituta além da cobertura das despesas, se a mãe substituta for protegida de forma a não ser explorada, e se o bem-estar da criança nascida e das existentes for levado em conta em todos os momentos. “Todas as partes envolvidas devem ser exaust,ivamente esclarecidas sobre possíveis riscos e consequências do procedimento”, destaca.

Envelhecimento reprodutivo

Segundo o especialista em fertilização humana Raul Nakano, a idade e a fertilidade estão inversamente relacionadas. “Por isso, o envelhecimento do sistema reprodutivo desempenha um papel-chave nos casos de infertilidade”, argumenta.

De acordo com o médico, biologicamente, o ideal é a mulher ter o primeiro filho entre os 23 e 25 anos, “quando há 20% de chance de engravidar por mês”. Com o passar dos anos essa probabilidade vai diminuindo. Aos 35 anos, por exemplo, chega a menos de 10%.

A inseminação artificial tem índice de sucesso que varia de 10% a 25% por ciclo e o método deve ser tentado por três ou quatro ciclos. Por seu lado, a fertilização in vitro é um dos métodos mais utilizados, chegando a índices de até 45% de chance de sucesso por tentativa.

“Em pacientes mais jovens, esse número pode chegar a 65%”, observa o especialista. Nessa técnica, são retirados os óvulos da mãe, que, depois de fertilizados em laboratório com o esperma do pai, são transferidos para o útero materno.

Nas pacientes mais jovens são transferidos entre dois e três embriões, nas de mais idade, até quatro embriões. Estatísticas mundiais apontam um limiar de 12 meses para definição de infertilidade conjugal.

Também apontam que, após os 35 anos de idade, mais de um terço das mulheres encontra dificuldades para a concepção dentro de um ano. Na mulher, o estoque de óvulos diminui ao longo da vida.

Desde o nascimento até a chegada da menopausa nascem cerca de 400 mil deles, entre 500 e 1.000 são descartados por mês. “Mensalmente, apenas um único óvulo amadurece e vem a ovular”, explica o especialista. Assim, a falência ovariana ocorre quando todos os óvulos se esgotam, chegando à fase da menopausa.

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