A questão social da velhice

Os últimos levantamentos demográficos demonstram um fato que exige alguma reflexão. O segmento populacional que mais cresce é o das pessoas idosas e, destas, a que mais tem aumentado é aquela constituída pelo grupo etário com mais de 80 anos de idade.

Os numerosos problemas que estão surgindo devido ao envelhecimento populacional são bastante sérios e, ironicamente, são conseqüências de grandes conquistas, principalmente no campo da medicina, nas áreas de promoção da saúde, prevenção e tratamento das doenças.

A fecundidade, a mortalidade infantil e as doenças infecciosas estão diminuindo, enquanto as enfermidades crônico-degenerativas, que são próprias do progresso, são as principais causas de incapacidade em populações nas quais a expectativa de vida vem aumentando. Como conseqüência, estamos presenciando a um fenômeno social sem precedentes, caracterizando um aumento significativo da longevidade em países em desenvolvimento, incluindo o Brasil.

Os estudos demonstraram que o aumento de pessoas idosas será bem mais significativo nos países em desenvolvimento, havendo uma previsão para o Brasil de 30 milhões de idosos no ano de 2025. Nossos sistemas sociais ainda estão estruturados para proteger as populações jovens, ativas e produtivas, rejeitando as mais velhas, devido a sua deficiência física, psicológica e social (solidão).

Nossa cultura condiciona o homem à produção e, neste aspecto, os jovens ganham todos os espaços, enquanto os idosos são vítimas de uma marginalização social. Entre os aspectos negativos da velhice podemos citar: auto-rejeição ao envelhecimento, ausência de preparo para a aposentadoria, ocupação do tempo livre feito de maneira inadequada, dificuldade de convivência entre os próprios idosos e os mais jovens.

Um mito que ainda persiste é o de que o idoso não tem condições de trabalhar, de amar e de aprender, o que não é verdade. Parece que ocorre uma falta de motivação para aprender novos papéis ou desempenhar os já existentes.

A aposentadoria, temos que reconhecer, é uma grande conquista social, porém pesquisas demonstram que a incidência de doenças e distúrbios psicológicos e sociais aumentam com ela, principalmente se a pessoa permanecer desocupada. Nos países desenvolvidos, já existe uma expectativa para modificar o início da aposentadoria para os 70 anos, conseqüência da maior longevidade da população e da melhoria da qualidade de vida.

Estudos realizados pela Organização Mundial da Saúde em países em desenvolvimento demonstram que os principais problemas com que se defrontam os idosos são: situação econômica deficiente, principalmente para a grande massa de aposentados necessitando em muito casos ajuda de outros para a sua sobrevivência e a falta de acesso aos serviços de saúde, já que não dispomos de instituições especializadas para este segmento populacional (geriatria e gerontologia).

Quanto à habitação, parece não constituir problema, já que a família tradicional e o apoio comunitário protegem os idosos, embora isto não ocorra em alguns casos. A presença de doenças crônicas, muitas vezes associadas ao alto custo dos medicamentos, constitui outro problema importante. O constante deslocamento das áreas rurais para os grandes centros parece agravar esta situação, determinando concentração de idosos em grandes cidades.

Há necessidade, portanto, de execução de programas para reduzir a carga que as populações de idade avançada representam para a economia e a sociedade, garantindo a disponibilidade de serviços de saúde, social e de lazer, a fim de garantir uma qualidade de vida digna para a população idosa.

O envelhecimento acarreta maior número de doenças crônicas, estados de invalidez e incapacidade, aumentando a necessidade de serviços médicos e sociais com programas de reabilitação estruturados para atendê-los. Além do mais, é indispensável tomarmos medidas preventivas efetivas no sentido da promoção e preservação da saúde.

Sabemos que o envelhecimento não começa abruptamente aos 60 anos, mas consiste na interação de processos médicos, sociais, ambientais e comportamentais que acometem toda a vida do ser humano. É importante que os países em desenvolvimento tomem consciência do problema e formulem programas políticos e de saúde, visando ao bem-estar da população idosa em número cada vez maior.

Luiz Bodachne

é médico geriatra do Hospital Universitário Cajuru da Pontifícia Universidade Católica do Paraná.

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