Antioxidante e combate de radicais livres

Radicais livres são definidos como espécies químicas independentes e contendo um elétron não emparelhado. Como buscam completar sua deficiência de elétron subtraindo-o de outros substratos são designados de potentes oxidantes. T. Sjodin et al. estimam que entre 2 e 5% do oxigênio absorvido em repouso e exercício seja desviado para a formação do radical superóxido.

O destino fisiológico do oxigênio é ser o aceptor final de elétrons e prótons na cadeia respiratória mitocondrial (em eucariotos) durante a geração de água e ATP (adenosinatrifosfato, ?moeda energética?). Como durante o exercício físico a captação de oxigênio aumenta entre 10 a 20 vezes ou seja para um patamar de 35-70 mL / kg corpóreo / minuto, a concentração de radical derivado do próprio oxigênio é considerável e o organismo deve então dispor de mecanismos eficientes de combate para garantir a proteção de sua estrutura macromolecular que inclui o próprio DNA, o colágeno, elastina, lipídios insaturados e outras biomoléculas da maior importância metabólica. Outras fontes primárias de radicais livres no organismo vivo são os peroxisomas (organelas celulares que degradam ácidos graxos e que geram principalmente água oxigenada), as enzimas do complexo de citocromo P450 (degradadoras de xenobióticos, moléculas estranhas ao metabolismo normal, inclusive poluentes atmosféricos e medicamentos). A quarta fonte são os fagócitos (células da série branca do sangue) cujo arsenal de radicais livres desempenha, contrariamente, um papel benéfico ao organismo pois se presta a identificar e matar germes infectantes (*).

Além do ânion superóxido (O2-.) que é formado quando o oxigênio molecular (O2) adquire um elétron adicional e deixando portanto a molécula toda com apenas um elétron não emparelhado, outras EROs – espécies reativas do oxigênio são o oxigênio singlet (1O2), o peróxido de hidrogênio ou água oxigenada (H2O2) e o radical hidroxil (OH.), este de vida mais curta mas o mais daninho da família atacando principalmente os lipídios insaturados da membrana plasmática, transferindo-lhes a qualificação de radical livre e propiciando reações em cadeia. A defesa do organismo se expressa então na forma de antioxidantes de duas distintas famílias. A lipossolúvel constituída da vitamina E (tocoferol), beta-caroteno e a Coenzima Q, todos eles solúveis nos lipídios da membrana que carecem de proteção. Os 3 podem doar elétron e reacomodar o outro próprio elétron não emparelhado anulando então o efeito, p.ex., do ânion mais nocivo hidroxil. A outra família, a hidrossolúvel, atua no interior da célula e se compõem da vitamina C (ácido ascórbico) e 3 enzimas: a superóxido dismutase que destrói o ânion superóxido, a glutation peroxidase que desdobra a água oxigenada à custa dos hidrogênios doados pelo coenzima glutation reduzido e a catalase que atua sobre o mesmo substrato (água oxigenada). O glutation é gerado no próprio corpo enquanto as vitaminas E e C advem da dieta.

A engenharia genética se encarregou de uma prova cabal do papel nocivo das EROs. A mosca-da-fruta (Drosophyla) inserida de gens-extra da superóxido dismutase e de catalase tem vida 30% mais longa do que a mosca comum. Mesmo na natureza há exemplos comparativos convincentes: ratos e pombos tem massa corporal semelhante e taxas metabólicas similares mas nos segundos as concentrações de ânion superóxido e água oxigenada são dez vezes menores, o que se correlaciona bem com o ciclo de vida dos pombos que é 8 a 10 vezes maior do que o dos ratos (Beckman, K. & Ames, B. (1998) Physiol Rev 78: 548-81).

No que tange a dieta de minerais, ferro (integrante da hemoglobina) e cobre (co-fator para enzimas importantes como a tirosinase e citocromo oxidase) são também eficientes promotores da formação do radical hidroxil graças à reação de Fenton. Isto aconselha um extremo cuidado na adoção de suplementos alimentares ou medicamentos que contenham estes minerais (e.g, caso de anemias). Para o caso de selênio, uma dieta de 100 a 200 microgramas/dia é considerada segura e eficaz como antioxidante (o Se é cofator da enzima glutation peroxidase; doses maiores podem ser tóxicas).

Interessante é a ação da carnosina (um dipeptídio de beta-alanina e histidina), um quelante de cobre encontrado nos músculos e que também pode ser absorvido a partir da dieta ou suplementos. Neste último caso, na base de 100 mg / dia, carnosina reduz o teor urinário de dialdeído malônico (MDA) em 25 a 30% . MDA é um produto de degradação dos ácidos graxos insaturados após ataque de radicais livres (peroxidação). É um potente ?cross-linker? (jnterligador) de proteínas e enzimas, inativando-as no organismo (Kyriazis, M. (2001) IAS Anti-Aging Bull 4(11): 24).

Nas palavras de James South, a teoria do envelhecimento (e morte) através da ação dos radicais livres é a mais velha mas possivelmente também a mais válida por cobrir toda topografia celular. As demais teorias se baseiam na disfunção apenas de mitocôndrias e membranas.

Notas:

(*) Tony Segal e colaboradores da University College London se contrapõem a esta explicação com base numa experiência em que bloquearam o fluxo de potássio nos peroxisomas usando veneno de escorpião. Sem a mobilização de K+ são as enzimas-chave (e não os radicais livres) que deixariam de atuar e os fagócitos perdem a eficiência ante os germes.

Obs.: Não se automedique. Intensifique o diálogo com médicos, nutricionistas e farmacêuticos.

José Domingos Fontana (jfontana@ufpr.br) é professor emérito da UFPR junto ao Departamento. de Farmácia, pesquisador 1A do CNPq e 11.º Prêmio Paranaense em C&T.

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