Devorado pela fama

Com boa pinta, ex-goleiro Ado era alvo das mulheres

Depois de voltar do México, com o titular Félix em idade avançada, não havia dúvidas que Ado seria o goleiro titular do Brasil na Copa do Mundo de 1974. Mas isto não aconteceu. A queda foi vertiginosa. No ano seguinte, ele apresentava comportamento diferente de quando treinava três horas de manhã e outro tanto à tarde. Zagallo chegou para ele em 1971 e disse: “Ado, vê se capricha no treinamento, vê se mantém a sua forma. Ano que vem vou te chamar como titular”. No ano seguinte tinha a Taça Independência, com várias seleções para comemorar os 150 anos da independência do Brasil. O goleiro corintiano ouviu e respondeu: “Pode deixar. Quando chegar a hora, podem ficar descansados, eu estarei firme, em ponto de bala”. Mas treinamento que era bom, nada. Ado dizia que tinha bursite, problemas nos joelhos, que o impediam de se dedicar aos treinos. Podia ser verdade. Mas a fama de boêmio estava grudada. E era duro de tirar. E ele só ajudava ela ficar ainda maior.

Em outubro de 1971 a revista Placar apontava o problema de Ado que o impedia de ser o goleiro número 1 do Brasil por muitos anos: “O crime de Ado talvez seja ser alto, forte, loiro e boa pinta, goleiro do Corinthians, da Seleção, campeão do mundo, ganha bem e ter apenas 23 para 24 anos. Para muita gente isto tudo é demais”. E, além disso, ele não era santo: “De vez em quando alguém me pergunta o que é que você fez ontem? Se eu digo que fiquei em casa fazendo um quebra-cabeça, o sujeito sai rindo. Não acredita nem um pouco. Por quê? É a tal da imagem. No Rio já aceitam que o jogador é um sujeito comum: come em restaurante, vai ao cinema, à praia, anda na calçada, faz tudo como as outras pessoas, quando não está trabalhando. Em São Paulo acham que o jogador deve ficar trancado o tempo todo”.

Ele esteva entre os convocados em 1971, mas ficou fora da lista dos relacionados em 1972 para a disputa da Taça Independência, também chamada de Mini-Copa, pelo expressivo número de seleções estrangeiras que participaram da competição no Brasil. Ado perdeu lugar para Leão, do Palmeiras, que foi o terceiro goleiro no México e que seria o titular dois anos depois na Alemanha. Ado nunca mais voltou para o gol da seleção. Se era verdade que ele tinha problema de contusão, as fotos e reportagens da época não deixavam dúvidas: a vida social e noturna do goleiro era de alta intensidade.

Uma reportagem registra sua estadia no Rio. Cada dia com uma mulher diferente e cada uma mais bonita que outra. O jogador curtia badalação, carrões, entre eles um Alfa Romeo, roupas de grife da Rua Augusta e não ficava nisso. Ele se prolongava em noitadas nas ruas Consolação e Nestor Pestana, sem contar a famosa e badalada Boate Cave, na qual era considerado cliente cativo. Como ele era um atleta e tinha que treinar, no dia seguinte o corpo sentia os efeitos das noitadas. Na hora de ir para o treino, o goleiro estava sonolento e de ressaca. Ado colocava óculos escuros para dissimular o cansaço. Na hora de desempenhar, os reflexos não eram os mesmos. O futebol, que era origem de toda aquela boa vida, começou a entrar em declínio. O goleiro que fazia defesas impossíveis começou a falhar. Em um jogo contra a Portuguesa, o ponta-direita Ratinho desferiu um chute despretensioso numa noite em jogo de meio de semana no Pacaembu. Bola defensável, o goleiro falhou e ela entrou.

Arquivo

Ado já não era o mesmo.

‘A bola é curta‘

Ado hoje: “Eu ganhava até bem porque era jogador de seleção. Mas o problema do jogador de futebol é que ele não é preparado para o pós-futebol. A bola é curta”.

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