Madrasta confessa assassinato de menina

As suspeitas de que uma pessoa muito próxima a Gabriela Moreira dos Santos, 7 anos, seria a responsável pela sua morte se concretizaram durante a madrugada de ontem. Andréia de Freitas, 27 anos, madrasta da garota, confessou o brutal assassinato durante interrogatório na Delegacia de Homicídios. O fato de ela estar grávida de oito meses e de ter ciúmes do tratamento carinhoso dado à menina pelo marido motivaram o crime.

De acordo com o delegado Luiz Alberto Cartaxo, as contradições apresentadas no interrogatório da acusada levaram à elucidação da autoria. Além disso, foram apreendidas provas na casa da família, como as roupas de Andréia sujas de sangue e que estavam escondidas em um armário, e a arma do crime. A faca permaneceu cravada no corpo de Gabriela.

Pelas investigações, o assassinato ocorreu por volta das 7h de segunda-feira, antes de a madrasta sair para o trabalho de doméstica, no bairro Jardim Social. Somente as duas estavam na casa. Segundo Cartaxo, Andréia e Gabriela não tinham uma convivência muito boa e a doméstica reclamava da falta de atenção do marido. A garota recebia tratamento especial pois sofria de problemas renais e fazia tratamento médico há alguns anos, no Hospital Pequeno Príncipe. Na manhã de segunda-feira, a criança estava brincando quando derrubou uma lata de óleo queimado no chão, sujando toda a varanda da casa. Esse fato se transformou no estopim da fúria da madrasta. Ela pegou a garotinha e a jogou contra o piso, para repreendê-la. Em seguida, bateu a cabeça de Gabriela contra o chão, o que fez com que desmaiasse. Essa ação explica por que a garota estava suja de óleo, inclusive com manchas no rosto.

Facadas

Tomada pela raiva, Andréia aproveitou que a enteada estava desacordada e a puxou pelos pés para um pequeno cômodo dentro da residência. Lá começou a desferir as facadas. Foram 96 perfurações pelo corpo e a faca deixada cravada no peito. Conforme o delegado, Andréia ainda tentou queimar o corpo, mas não conseguiu. Depois da barbárie, a madrasta trocou de roupa e saiu para o trabalho normalmente, retornando mais cedo para sua moradia, por volta das 17h50.

A reação de Andréia, ao encontrar o corpo, foi uma das principais pistas para a polícia. "Ela não agiu como uma pessoa que encontra um corpo naquela situação. Saiu do local do crime, fechou o portão da casa e foi avisar uma amiga sobre o ocorrido. Normalmente, a pessoa entra em choque, sai correndo e gritando por socorro, o que não aconteceu", comparou Cartaxo. Foi a amiga da doméstica que avisou a polícia e o pai da menina sobre o assassinato.

Na Delegacia de Homicídios, após diversas contradições, a madrasta confessou o crime, por volta das 3h. Ela foi autuada por homicídio qualificado, com pena prevista entre 12 a 30 anos de reclusão.

Mãe em prantos no IML

Inconformada com a perda da filha, Maria José Moreira falou pouco sobre o ocorrido. Não conseguia se conformar com a situação e chorava bastante. A irmã dela, Luíza, disse que Maria estava em Arapoti, tratando do negócio de um imóvel, quando recebeu a notícia. "Ela passou uma mensagem para o celular do ex-marido para saber como Gabriela estava. Depois recebeu um telefonema dele contanto sobre a morte", afirmou.

Maria retornou a Curitiba e passou a manhã no IML, para acompanhar os procedimentos sobre a morte da filha mais nova. Ela tem outras duas meninas de 9 e 11 anos que moram juntas, no Conjunto Vitória Régia, Cidade Industrial. Conforme Luíza, Gabriela morava com o pai devido ao tratamento médico que estava fazendo e porque ele tinha mais condições financeiras para criá-la. No entanto, ressaltou que a garotinha não foi abandonada e sempre passava um tempo junto com a mãe e suas irmãs.

Doméstica já teria predisposição ao crime

A gravidez geralmente é responsável por uma série de mudanças biológicas, hormonais e psicológicas na mulher. Porém, dificilmente ela pode desencadear uma surto de violência como o que foi cometido por Andrea, grávida de oito meses. Esta é uma das afirmações que o médico psiquiatra Rui Fernando Cruz Sampaio fez ao analisar de forma genérica o caso do assassinato de Gabriela.

Segundo Sampaio, geralmente a gravidez desperta maior sensibilidade na mulher, tonando-a mais carinhosa e afetuosa. Casos de violência são mais comuns após o parto, quando a mãe entra em depressão e pode chegar até mesmo a agredir a criança. "A gravidez deixa a mulher mais instável, mas dificilmente faz com que ela tenha um crise como a de Andréia", acredita o médico. Baseado em hipótese, Sampaio disse crer que a mulher já tinha uma predisposição e um impulso à violência, que poderia ter sido desencadeada mesmo se ela não estivesse grávida.

Criminosa ficará em local seguro

Andréia de Freitas, grávida de oito meses, está presa na Delegacia de Homicídios, mas deverá ser transferida assim que um local seguro para ela e para a criança que está para nascer seja encontrado. "Estamos tomando cuidado para preservar essas duas vidas", disse Cartaxo. O comum seria que a madrasta fosse encaminhada para a carceragem feminina do 9.º Distrito Policial (Santa Quitéria). Porém pela brutalidade do crime – envolvendo uma criança – é impossível prever qual será a reação das outras presas recolhidas no distrito, que está superlotado com 83 detentas. A capacidade é para 30.

Sobre a guarda da futura criança, o delegado informou que a situação será resolvida pelo juiz da Vara de Infância e Juventude, que já foi comunicado. O Conselho Tutelar também está acompanhando o caso. "Acredito que o pai terá a preferência", afirmou o policial.

Tristeza

Depois de confessar o crime, a doméstica demonstrou arrependimento. A perplexidade na descoberta da autoria também chocou o pai da criança, que é pedreiro. "Ele chorou compulsivamente", relatou Cartaxo. Ainda durante a madrugada, o pai falou para uma emissora de rádio: "Jamais imaginei chegar em casa e ver minha filha esfaqueada. É difícil acreditar. Perdi filha, mulher. Tudo".

A liberação do corpo de Gabriela aconteceu na manhã de ontem no Instituto Médico-Legal. Por volta do meio-dia, o caixão com o corpo da garotinha partiu no carro da funerária em direção a Arapoti, cidade onde será enterrada.

"Ela falava demais e isso me irritava"

"Ela falava demais. Fiquei irritada, nervosa e perdi a paciência." Esta foi a justificativa dada por Andréia de Freitas, 27, quanto à barbárie que cometeu. Em entrevista concedida à reportagem da Tribuna do Paraná, a empregada doméstica contou com detalhes como retalhou a enteada Gabriela, de apenas 7 anos.

Sentada sobre um colchão, na cela escura e individual da Delegacia de Homicídios, Andréia demonstrou frieza ao falar sobre a garotinha. "Ela conversava muito, era mal-educada e sempre atrapalhou minha relação com o pai dela. Quase todos os dias, por volta das 5h, a Gabriela saía do quarto dela e vinha se enfiar na cama com a gente. Isso me irritava muito. Chegava em casa cansada e tinha que limpar a bagunça que ela fazia durante o dia. Sei que a culpa não era dela, mas da mãe, que não soube lhe dar educação", disse a doméstica.

No dia do crime, o marido e o irmão de Andréia, que mora com o casal, saíram para trabalhar por volta das 6h30. Sozinha com a criança, ela chegou ao ápice do descontrole. "Fui pentear meu cabelo e me arrumar para ir trabalhar e ela foi atrás de mim no banheiro. A menina ficou falando, falando, perguntou se o café estava pronto e eu comecei a me irritar. Me mostrou uma tampinha que ela estava brincando, derrubou uma lata de óleo e passou a me encher o saco. Já não estava bem, o bebê se mexia muito, e daí perdi a calma. Apanhei um pouco de álcool, a segurei pela mão, derramei o líquido na cabeça dela e risquei um palito de fósforo. Fiquei muito nervosa. Ela chorava muito. Corri na cozinha, peguei uma faca e comecei a furar a menina. Nem sei quantas facadas dei", relatou Andréia.

Em seguida, a madrasta contou que limpou o tênis, que estava sujo com o sangue da enteada, trocou de calça, escondeu a calça suja de sangue no armário, e foi trabalhar. No final da tarde ela retornou para casa e foi atrás dos vizinhos, fornecendo a primeira versão do crime, que depois ela mesma desmentiu. "Eu estava apavorada. Sei que o que fiz foi chocante e estou arrependida. Sei que vou pagar por isso e tenho certeza que meu marido não vai me perdoar", finalizou Andréia.

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