Jovens desaparecidas levantam questões sobre o que é crime

Em Curitiba, a jovem Cristiane da Silva Bernardes, de 24 anos, procura a irmã Maristela que aos 4 teria sido vendida, em maio de 1988. Do outro lado do mundo, este mês, a brasileira criada em Israel, Ayelette Zamir, 23, procura a família no Paraná. As histórias, apesar de separadas por muitos quilômetros e pelo menos 18 anos, recentemente se cruzaram, aumentando a chance de ser a mesma. Porém, o episódio também levanta questões fundamentais e dúvidas. O que é e o que não é crime quando o assunto é criança no exterior ou desaparecida?

 Segundo o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), tirar um menor de quem o tem sob guarda para colocá-lo em lar substituto é crime, sob pena de reclusão de dois a seis anos. Também está sob pena, de um a quatro anos, prometer ou entregar o filho a terceiro mediante pagamento ou favor. Ainda é crime contra o menor ?promover ou auxiliar? o envio de criança ou adolescente para o exterior fora das formalidades legais ou ?com o fito de obter lucro? – a pena pode ser de quatro a seis anos de reclusão. Segue na lista, como traz o artigo 242 do Código Penal, o registro falso conhecido como ?adoção à brasileira?: registrar como próprio o filho de terceiro é crime sob pena de dois a seis anos de reclusão.

Como explica a delegada do Serviço de Investigação de Crianças Desaparecidas no Paraná (Sicride), Márcia Tavares, o desaparecimento não é crime, principalmente se não reclamado, mas pode ter sido ocasionado por um. ?Atuamos em qualquer caso de criança desaparecida até que se apure as causas do desaparecimento. Se sumiu porque foi morto, seqüestrado ou trata-se de adoção irregular?, explica. Segundo ela, no Paraná o crime de ?registro falso? acontece muito: este ano foram mais de 15 inquéritos. ?Por ser documental não é difícil de ser identificado, ao contrário do comércio nacional ou internacional, que dificilmente se comprova porque o pagamento é feito em dinheiro?, continua Márcia.

A delegada ainda afirma que a freqüência das ocorrências variam ano a ano. ?Este ano, por exemplo, a causa mais freqüente do desaparecimento foi o homicídio. Infelizmente encontramos seis crianças mortas. Nos anos anteriores foram mais seqüestros, em 2004, e subtração de incapazes, em 2005?, aponta. Setenta por cento das crianças saem de casa espontaneamente. As causas criminosas se dividem nos 30%.

No Paraná, há 28 menores desaparecidos. Nenhum dos inquéritos está arquivado. A existência ou não de crime continua sendo apurada. Nesse processo quem sofre, segundo a coordenadora do Movimento Nacional em Defesa da Criança Desaparecida do Paraná, Marília Marchese, é a família. ?Noventa e cinco por cento deles sumiram nas proximidades de casa. Não consigo traduzir em palavras a dor da família, especialmente da mãe. É pior que a morte. Não há o que console?, afirma.

Sobre o comércio de crianças brasileiras para o exterior, o procurador de Justiça, Luiz Francisco Fontoura, afirma que o auge foi nos anos 1980s, quando agia no Paraná ?uma quadrilha que patrocinava a vinda de casais estrangeiros. Havia um advogado que cuidava dos trâmites burocráticos, inclusive falsificando ordem judicial?. Ele diz que o crime diminuiu sensivelmente, mas não acabou.

Sobre o caso de Ayelette, a delegada do Sicride afirma que é preciso cautela, pois na região estão pelo menos sete crianças paranaenses. ?Resolver o caso de uma pode nos levar a outras?, diz. 

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