Troca-troca

A reforma política não sai. É certo que ela não se dará por uma decisão pensada e elaborada do Congresso Nacional, com assentimento dos partidos políticos e o beneplácito do Poder Executivo. Não que seja dispensável. Pelo contrário, é espinha dorsal da recuperação da nossa combalida democracia, que anda aos tropeços, não poucas vezes sujando-se na lama que pavimenta caminhos nada éticos, em prejuízo dos interesses nacionais. Acontece que a legislação malfeita e que dá guarida a tantos desmandos baseia-se em partidos que são ficção, aos quais são dispensados ideologias e programas. São corpos sem cabeça. E os candidatos, na forma como são escolhidos, em maioria sempre fazem usucapião de suas vagas nas listas partidárias, elegendo-se os que têm e os que não têm votos. A grande maioria não tem votos e mesmo assim conquista seus postos legislativos por força do chamado voto de legenda.

Essa estrutura política deformada e que não é reformada, salvo por um ou outro passo trôpego dado de vez em quando, tem uma chance de ouro para melhorar agora que o Tribunal Superior Eleitoral decidiu que os mandatos são dos partidos e não dos candidatos. Destarte, será impedida a troca de legenda em meio aos mandatos, o que na prática significa que o eleito não mais poderá virar a casaca. Dizer ao povo nos palanques que pensa e quer por ele fazer determinadas coisas e depois, trocando de legenda, deixar o dito pelo não dito e fazer o contrário.

Para proteger o vício do troca-troca, a Câmara já andou legislando de forma a limitar a proibição do TSE. E os partidos PSDB, DEM e PPS entraram com mandado de segurança no STF pedindo que sejam declarados extintos os mandatos dos vira-casacas e sejam convocados os respectivos suplentes das legendas. Com isso, o grupo situacionista sairia perdendo, pois o processo tem sido sempre engordar as hostes governistas com a adesão de membros de agremiações oposicionistas. O poder tem o ímã da caneta cheia para nomear e a chave dos cofres para distribuir verbas, instrumentos suficientes para fazer de um socialista um capitalista ou vice-versa, num piscar de olhos.

Hoje, quarta-feira, a suprema corte julgará esses mandados de segurança. O ministro Celso de Mello, que no Tribunal Superior Eleitoral decidiu que os mandatos são dos partidos e a troca de legenda resulta em perda do mandato, declarou que ?a idéia é julgar o mais rápido possível?, porque o STF tem que definir o papel dos partidos políticos no País. Tal declaração, partindo de quem partiu, dá a esperança de que haja ambiente propício no Judiciário para o provimento dos mandados de segurança. Mas não batamos palmas já. É ver para crer. Não se pode esquecer que o procurador-geral da República, Antônio Fernando de Souza, em parecer que encaminhou ao STF, recomendou que sejam negados os pedidos de segurança da oposição e que tudo fique para as próximas eleições. Quem foi eleito para o atual mandato, trocou de legenda uma, duas ou mais vezes, jogando o seu jogo pessoal e interesseiro e não o do seu eleitorado, não perderá por enquanto o mandato, mesmo que com as mudanças o tenha esvaziado de qualquer conteúdo. E que a decisão judicial já exarada tenha afirmado que o mandato não é dele, mas do partido. Ficará na cadeira parlamentar, seja de deputado, senador, deputado estadual ou vereador. Tudo ficaria para o próximo mandato e com os amaciantes já providenciados pelo Congresso.

Assim, é muito mais provável que esse importantíssimo passo da reforma política a prestações seja dado às meias. Que tudo ficará como está e um pouco diferente, na próxima legislatura.

Se assim ocorrer; se o Supremo decidir como pede o procurador-geral, restará ao povo abrir os olhos e, nas próximas eleições, simplesmente ignorar os vira-casacas, os que fizeram troca-trocas. E, não os reelegendo, depurar um pouco o ambiente político, que cada dia mais reclama medidas saneadoras e em defesa dos interesses da nação.

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