Saúde mental no ambiente de trabalho e a Síndrome da Imunodeficiência Adquirida-AIDS

A humanidade já foi palco de inúmeras violações aos direitos humanos no decorrer da história, o que fez nascer nos povos a necessidade de um mundo mais solidário e fraterno. Contudo, a efetividade desse ideal depende do avanço na luta pelos direitos humanos.

O direito à vida, basilar dos demais direitos que objetivam garantir o bem-estar físico e mental do indivíduo, não pode ser considerado sob a óptica restrita de processo orgânico, mas sim em um sentido mais abrangente, de forma a afiançar uma vida digna e propiciar fatores como alimentação, moradia, meio ambiente ecologicamente equilibrado, saúde, trabalho, educação, entre outros.

Nesse contexto, o direito à saúde é condição determinante na busca e implementação de uma cultura em direitos humanos, visto ser instrumento ao exercício da cidadania e condição essencial à dignidade da pessoa humana, ambos fundamentos do Estado Democrático de Direito.

A Síndrome da Imunodeficiência Adquirida, considerada como epidemia pela Organização Mundial da Saúde desde 1981, já vitimou milhões de pessoas no mundo inteiro. Diante do quadro assustador que a enfermidade apresenta, necessário se faz a implementação, pelo Poder Público, de medidas eficazes e urgentes na prestação dos serviços de saúde.

O Brasil possui o programa de combate ao HIV mais bem-sucedido entre os países em desenvolvimento, com progressos substanciais que servem de exemplo a outros países. O embate entre o governo brasileiro e os maiores laboratórios produtores de medicamentos aos soropositivos foca-se na quebra de patentes, o que reduziria consideravelmente os preços dos remédios.

Ainda há muito o que se avançar na luta contra à AIDS, saindo da área da saúde e alcançando outros segmentos sociais. Em razão das proporções que a epidemia atingiu, esta deixou de ser um desafio apenas para a comunidade científica, passando a exigir o envolvimento de profissionais de diferentes searas, a fim de deter o aumento no número de casos e reduzir as dificuldades enfrentadas por aqueles atingidos pelo HIV.

O indivíduo infectado, além das manifestações inerentes à doença, confronta-se também com o preconceito e a discriminação, os quais causam danos sociais imensos, implicando em constantes ofensas à dignidade da pessoa humana e, consequentemente, a preceito previsto na Carta Magna vigente.

É inconteste que, em duas décadas de epidemia, ocorreram grandes conquistas relativas aos direitos da pessoa vivendo com AIDS, todavia, os avanços precisam ser aprofundados, especialmente nas relações de trabalho, objetivando proporcionar ao obreiro contaminado condições de subsistência e realização pessoal, em razão do caráter de laborterapia que a atividade profissional possui.

A discriminação no trabalho revela-se como a mais danosa ao portador do vírus HIV, visto que, com o rompimento do pacto laboral ocorre a perda dos salários e benefícios, agravando-se a situação social, econômica e psíquica do trabalhador soropositivo, o que gerará sérias repercussões em sua qualidade de vida.

Enfatize-se que, o fato do obreiro ser portador do vírus HIV não é motivo para a rescisão do contrato de trabalho pelo empregador. Ao contrário, a continuidade da relação empregatícia garante ao portador vencimentos, benefícios previdenciários e contagem de tempo de serviço para aposentadoria. Configurada a despedida discriminatória, o empregador poderá ser condenado à reintegração do obreiro, indenizações por danos morais e materiais, entre outras verbas.

Saúde e trabalho caminham juntos na vida e no Direito. A relevância dessa parceria é sentida tanto na vida pessoal do empregado infectado como no desempenho operacional da entidade empregadora, em razão da empresa ser conseqüência direta da cooperação de seus integrantes.

Por este motivo, os empresários devem promover o bem-estar de seus colaboradores, reforçando a auto-estima destes e valorizando suas virtudes como seres humanos e cidadãos. A qualidade de vida, quando presente no ambiente de trabalho, implica inevitavelmente no aumento dos índices de produção.

Os impactos da AIDS na empresa também são sentidos nas relações interpessoais, com o surgimento de sentimentos como o medo, a ansiedade e a depressão, que poderão acarretar crises internas, dificuldades de relacionamentos, redução da motivação, da criatividade e da produtividade dos funcionários. Um ambiente de trabalho saudável favorecerá tanto ao obreiro infectado como a seus colegas.

Nesse aspecto, a postura de superiores hierárquicos e colegas de trabalho é decisiva para se estabelecer condições propícias à convivência. Por tal razão, necessário se faz a implantação e implementação de Programas de Prevenção e Assistência nas empresas, de forma a sensibilizar, informar e educar chefias e funcionários acerca da epidemia.

É importante destacar que os custos no tratamento dos trabalhadores atingidos pela doença têm sido muito superiores àqueles voltados à implantação de programas internos de prevenção e assistência aos funcionários e seus dependentes, ou seja, gasta-se mais no tratamento das conseqüências do que na prevenção das causas.

O médico do trabalho possui importante papel na construção de um saudável ambiente de trabalho, pois, normalmente, possui ascensão sobre a administração da mesma e grande prestígio junto aos empregados, devido ao status de tal profissão na comunidade.

No campo do Direito, ilustra-se que inúmeras são as legislações que tratam da matéria, nos mais variados ramos. Por certo que muitas foram as conquistas em prol das pessoas vivendo com AIDS, que ocorreram, principalmente, pela mobilização social e atuação das organizações da sociedade civil.

Contudo, há que se continuar buscando melhorar as condições de vida aos portadores do vírus HIV, especialmente nos locais de trabalho, pois a segregação e o desemprego matam mais que a própria doença.

Marcel Francelino da Silva é formando em Direito, membro do Grupo de Pesquisa Interdisciplinar de Biodireito e Bioética das Faculdades Integradas Curitiba. Analista Judiciário TRT 9.ª Região.

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