Relatório ou libelo?

Os relatórios extraídos das comissões parlamentares de inquérito, elaborados por um de seus membros, embora possam recomendar punição para este, aquele ou muitos parlamentares, não são, no sentido estrito, libelos crime acusatórios. São opiniões embasadas em auditivas de testemunhas, confissões e desmentidos e exame de documentos. A aprovação do relatório está longe de significar uma denúncia, já que o plenário da comissão não julga, mas apenas recomenda ao plenário da Câmara Federal a punição ou absolvição do indiciado. E este julgamento de plenário é político, pois quem pode punir para valer e até mandar para a cadeia é a Justiça.

Não obstante, os membros de comissões como a dos Correios, que tem como relator Osmar Serraglio, do PMDB do Paraná, ganha maior importância porque, como as outras, atinge a opinião pública, mas, ao contrário da maioria, a alcança num ano eleitoral e quando já se conhecem os candidatos, um deles o atual presidente Lula.

Por isso o esforço inaudito, aberto e até descarado, de correligionários e companheiros do presidente da República para amainar o conteúdo do relatório de Serraglio, que, ao contrário do que desejam os situacionistas, admite que existiu o mensalão, ou seja, o pagamento regular de propinas para deputados a fim de que votassem matérias de interesse do governo.

Serraglio, que produziu um documento sério e extremamente trabalhoso, considerando o sentido político de seu relatório, ao admitir porque achou provada a existência do mensalão, discordou dos situacionistas que o pressionam para que entenda que esse tipo de compra de apoio político não existiu. Serraglio fez um relatório menos contundente, embora equivocadamente os situacionistas o considerem mais grave. Se seguir a linha pleiteada pelos governistas, terá de considerar que todo o dinheiro que rolou via valerioduto entre os poderes Executivo e Legislativo e entre os partidos políticos governistas e até oposicionistas, foi ?apenas? caixa 2, dinheiro para financiar campanhas de origem desconhecida ou pelo menos duvidosa e destino sobejamente sabido, estará agravando suas conclusões.

Como o próprio Serraglio adverte, é melhor aceitarem o seu relatório admitindo a existência do mensalão, pois o caixa 2 pode atingir de frente o próprio presidente Lula. Se o caixa 2 é dinheiro ilegal e não declarado à Justiça Eleitoral, para custear campanhas do PT e seus aliados, beneficiário foi também, senão principalmente, o próprio Lula. Este teria sido eleito de forma ilegal e ilegal seria o seu mandato. Não se trata de impeachment, mas da possibilidade de a Justiça Eleitoral considerar que o presidente não foi eleito livremente pelo voto popular, mas através da compra de todo o aparato que envolve uma campanha presidencial. Esse aparato, que vai da propaganda à troca de favores, passando pelos negócios em dinheiro vivo, quando custeado por caixa 2, torna a eleição senão nula, pelo menos anulável.

Já tivemos até para mandatos executivos em curso decisões judiciais que resultaram em perda de mandatos pelo uso e abuso do poder econômico e a compra de votos. Por que não poderia acontecer a mesma coisa agora, quando se refere à eleição do presidente da República?

Tal provavelmente não vai acontecer, pois o candidato situacionista Lula deverá ser salvo pelo gongo. Faltam poucos meses para o pleito, tempo insuficiente para pulular tão agressiva infecção no processo político. Mas não se cutuca onça com vara curta. Serraglio já advertiu que a pressão para que mude seu relatório pode prejudicar Lula se, pelo uso de caixa 2, for levantada perante a Justiça Eleitoral a ilegitimidade do mandato do atual presidente e candidato à reeleição. Por isso, é melhor deixar como está para ver como é que fica.

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