Rainhas da Inglaterra

Abordamos, ontem, os prejuízos de cidadãos e contribuintes quando os que nos governam não se entendem. Tínhamos em mira – como ainda temos – os desentendimentos atuais e antigos entre a equipe que ocupa o Palácio Iguaçu e aquela que se despede do Palácio 29 de Março, responsável pelo governo de Curitiba. Somos forçados a abordar hoje os desentendimentos que já não podem ficar atrás do biombo na mais alta cúpula do governo federal. Lá, como acaba de dizer o ministro Amir Lando, da Previdência Social, existem os que deviam mandar, mas nada mandam. São como – o termo é dele mesmo – rainhas da Inglaterra.

Lando mesmo é uma dessas rainhas, conforme confessou na última reunião do partido a que pertence, o PMDB: “Sou como uma rainha da Inglaterra desta estrutura, onde não há verticalidade, não há hierarquia, nem há quem mande”. Dias antes, outro ministro – o dos Transportes, Alfredo Nascimento – se queixava amargamente de não ter condições de fazer nada. Está cercado de gente que atende a outros comandos. Enquanto os buracos crescem nas estradas, distribuindo insegurança, prejuízos e mortes, o ministro anda em círculos, tem as mãos atadas ou simplesmente ninguém escuta o que ele tem a dizer.

Pelo visto, o problema é maior que aquilo que se consegue ver. No Equador, outro dia, o presidente Lula ocupou-se do tema para dizer ao colega anfitrião, Lucio Gutiérrez, que tem confiança em seus ministros e, por isso, deixa que cada um monte a sua equipe. A confidência irritou seus aliados do PMDB, que se queixam exatamente do contrário. O presidente do partido, Michel Temer, entrou na conversa para afirmar que a prometida verticalização (isto é, comando que vem de cima) “ficou apenas no compromisso”. E, dando razão ao ministro dos Transportes, aconselhou: “O ministro tem de ser da confiança absoluta do presidente e, a partir daí, é essencial que ele monte sua equipe”.

Não se trata apenas de distribuir cargos. Tem a ver com a governabilidade. Lando reclama que há petistas infiltrados em todos os cantos – nos postos federais em Brasília e nos estados. Amigos seus confidenciam que ele não conseguiu mexer em quase nada da estrutura do Ministério, onde vários grupos se digladiam. Garantem que as únicas demissões que o ministro conseguiu realizar ocorreram por denúncias de improbidade. Os “companheiros” indicados pelo PT no Pará e no Amazonas teriam ido direto de seus postos para a cadeia.

Outro ministro que se queixa – mas em menor escala – é o das Comunicações, Eunício Oliveira. O governo (mas ele também não é governo?) não lhe teria facilitado a vida em nada. Como se vê, os três aliados são do PMDB, o partido que ficou mais de ano negociando sua entrada no governo – feita, conforme se disse na época, pela vontade de colaborar com o Brasil e não em busca de cargos ou benesses. Agora, às portas das eleições municipais, certamente não conseguem explicar algumas coisas aos eleitores e lançam mão de desculpas ou resolvem falar a verdade.

Em qualquer das hipóteses, entretanto, é preciso que se diga com clareza que quem ganhou a eleição foi Lula. O PMDB aderiu. Ou aceita o jogo, ou cai fora. Ficar nesse muro das lamentações em nada serve ao País e aos brasileiros, que precisam de estradas, serviços e realizações.

De outro lado, também é importante que se considere que o PT, ao partilhar o poder, precisa abrir mão dessa vontade louca de dominar tudo à sua exclusiva moda, como se tudo começasse agora. Já está provado que essas tentativas de reinvenção da roda constituem trabalho tão inútil quanto desnecessário. Nem tudo fora do PT é tão ruim, nem tudo é tão melhor. Se, desiludido, daqui a pouco o PMDB resolver cair fora, teremos reforçada a terrível sensação de que agora, como antes, o que importa aos poderosos é o poder. O povo – e suas necessidades – que se lasque.

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