Privilégio compartilhado

Uma lástima que nenhum assessor do presidente Luiz Inácio não lhe tenha dito – com tato e respeito – sobre quão inoportuna e até discriminatória foi a abordagem do chefe da nação sobre o problema da ética.

Poucos dias se passaram e Lula repetiu o que havia declarado, quanto a não ver ninguém com autoridade suficiente para lhe dar lições de ética. No ambiente propício dos festejos da posse da nova diretoria do Sindicato dos Metalúrgicos de São Caetano do Sul, o presidente não se fez de rogado e acrescentou que pessoa mais ética do que ele está para nascer.

Ora, convenhamos, com todo o apreço merecido pela pessoa do presidente da República, não podemos concordar com o juízo de valor esboçado em duas ocasiões. Se o presidente não revisou o discurso, não se tem como invalidar o argumento da ausência de conselheiros pessoais com autoridade para criticar a descabida fala.

A pior avaliação, no entanto, passa a ser a suposição de que admoestado a não desviar o discurso para essa trilha perigosa, sobretudo quando ética e moral, enquanto valores de comportamento, são indispensáveis para quaisquer cidadãos, Lula desconsiderou a advertência e, de novo, dirigiu o fogo na direção da elite.

Não é obrigação do presidente alardear em seus discursos a ética pessoal que todos nele reconhecem. Mesmo vilipendiado pela profunda crise política no governo e no Congresso, como se sentem todos os cidadãos, o presidente não pode extravasar a ponto de arrogar-se à posse de um privilégio que, todos sabem, é partilhado pela coletividade.

O presidente da República representa – até que se comprove a erosão de sua autoridade institucional pelo acobertamento das ações criminosas ora imputadas a muitos de seus auxiliares -, o repositório dos anseios nacionais por progresso, justiça, bem-estar social e qualidade de vida.

Nessa condição, o presidente não é superior a nenhum outro de seus governados, tampouco em questões de ética e moral. O dever assumido ao jurar a Constituição, ato simbólico referendado pelos 53 milhões de votos da límpida vitória do ex-metalúrgico, não concedeu a Lula uma vaga no Olimpo.

Com honestidade e retidão de caráter ele garantiu que a esperança haveria de vencer o medo. Que o lema eletrizante não seja tragado pelo charco que até os incorruptíveis atrai.

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