Dilma vai ao Congresso e fala sobre suposto dossiê

Não há como negar que as atenções no Senado, nesta quarta-feira (7), giraram em torno da presença da ministra chefe da Casa Civil, Dilma Rousseff na audiência pública da Comissão de Serviços de Infra-Estrutura.

Dilma foi ao Congresso para falar, em princípio, sobre o Programa de Aceleração do Crescimento (PAC), mas todos já sabiam que as perguntas acabariam partindo para a questão do vazamento de informações na Casa Civil sobre gastos do ex-presidente Fernando Henrique Cardoso e sua esposa Ruth Cardoso.

E não deu outra, antes de a ministra iniciar sua exposição, o senador Arthur Virgílio (PSDB-AM) pediu a palavra e sugeriu que Dilma fizesse declarações sobre o caso do dossiê. Virgílio lembrou que ela realmente foi chamada para falar sobre o PAC, porém esclareceu que a palavra da ministra sobre o caso seria fundamental.

"De um lado e de outro estão democratas que querem o império da lei e não aceitam coação a adversários. A legitimidade desta sessão passa pela senhora começar a reunião abrindo seu coração e dizendo o que sabe sobre o dossiê" disse Arthur Virgílio.

O líder do DEM, senador José Agripino (RN), ajudou a aumentar o coro que pedia esclarecimentos sobre o dossiê. Em resposta aos questionamentos, a ministra Dilma Rousseff, lembrou que ela veio à Comissão Programa de Aceleração do Crescimento, mas que estaria disposta a responder, após sua exposição sobre este tema, às outras perguntas que fossem feitas pelos senadores.

Ditadura

Antes a ministra disse ser necessário esclarecer também a sua atuação durante o período de ditadura militar, uma vez que Agripino havia citado um trecho de uma entrevista em que Dilma Rousseff confirmou ter mentido para os seus inquisidores durante aquele período, quando ficou presa dos 19 aos 21 anos de idade.

Dilma disse se orgulhar de ter mentido muito porque, como reforçou, em situação de tortura quem tem coragem e dignidade mente.

"Isso integra a minha biografia da qual eu tenho orgulho" disse ela, observando que, com esse comportamento, salvou a sua vida e a de seus companheiros.

A ministra falou que não é correto estabelecer qualquer comparação entre ditadura e democracia, porque "não é possível que se dialogue com o pau-de-arara e o choque elétrico". Segundo a ministra, o que acontece hoje no Senado é o diálogo democrático.

"A oposição pode me fazer perguntas e eu vou responder. Estou aqui para um diálogo civilizado e democrático" afirmou aos senadores.

PAC

Sobre o Programa de Aceleração do Crescimento, a ministra ressaltou que o PAC resgatou o planejamento estatal de médio e longo prazo. Segundo ela o programa estaria baseado na articulação entre União, estados e municípios, além de parcerias com a iniciativa privada.

Na ocasião, ela apresentou um balanço da aplicação, até o momento, dos recursos previstos no PAC. A ministra defendeu que o programa foi feito para assegurar a estabilidade socio-econômica do país e para promover a redução das desigualdades regionais.

Na apresentação, a ministra da Casa Civil detalhou o andamento das obras de infra-estrutura logística, rodovias, ferrovias, portos e aeroportos, de construção de hidrelétricas, desenvolvimento da produção de petróleo e gás, além dos investimentos em infra-estrutura urbana, como habitação e saneamento.

TCU

Questionada pelo senador Flexa Ribeiro (PSDB-PA) sobre divergência entre dados do governo e do Tribunal de Contas da União (TCU) em relação ao andamento de obras do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC), a ministra apontou a demora na aprovação do Orçamento da União para 2008 como uma das causas para os atrasos na execução do cronograma do programa. Ela destacou ainda outros problemas enfrentados pelo governo.

"A fiscalização do TCU ajuda na gestão do PAC, mas temos restrição para a implementação das ações devido a processos judiciais, problemas de licenciamento ambiental…" disse a ministra.

Ainda em resposta ao senador, Dilma reafirmou a meta de conclusão das eclusas no rio Tucurui até 2010 e disse não haver risco de apagão de energia elétrica no país.

Ela disse que a expectativa de todos os investidores do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) é de que haja um grande avanço na construção civil em 2008.

"Haverá gargalos de mão-de-obra em alguns estados. A demanda por funcionários vai ser grande. Há, em algumas áreas, uma forte disputa por mão-de-obra especializada e de construção civil" comentou.

Dossiê

Sobre o tão esperado assunto da tarde, a ministra chefe da Casa Civil reconheceu que houve vazamento de informações sigilosas da Casa Civil sobre gastos do ex-presidente Fernando Henrique Cardoso. Segundo ela, as informações vazadas para a imprensa fazem parte de um banco de dados da Casa Civil elaborado a pedido do Tribunal de Contas a União (TCU) para facilitar a fiscalização de gastos com suprimentos de fundos (cartões corporativos e contas tipo B). A ministra garantiu que o vazamento de informações está sendo apurado por auditoria interna e pela Polícia Federal.

"Foram vazadas informações privativas da Casa Civil. Uma comissão de sindicância da Casa Civil e a Polícia Federal estão investigando quem vazou. Posto que não há dossiê, temos que investigar quem vazou essas informações que são uma prerrogativa da Casa Civil" disse a ministra.

Dilma tocou no assunto após ser questionada pelo senador Mário Couto (PSDB-PA), autor de requerimento rejeitado para que a ministra comparecesse à CI tratar do suposto dossiê.

"É dossiê, é banco de dados, de onde originou esse documento? O jornal O Globo diz que há mal-estar na Casa Civil, que os funcionários estão acusando-se. A senhora ligou para dona Ruth Cardoso para falar sobre o vazamento. Gostaria que a senhora dissesse à Nação de uma vez por todas qual é a verdade. A Nação quer saber e cobra isso de nós" disse Mário Couto.

Dilma Rousseff garantiu que a Casa Civil só tem uma versão para o acontecido. Ela afirmou que não há dossiê e, sim, um banco de dados feito após uma auditoria do TCU, em 2004, para identificar que havia uma "imensa dificuldade de obter informações sobre despesas pagas mediante suprimento de fundos", e que esses dados eram de difícil acompanhamento, avaliação e prestação de contas.

"O processo de levantamento de dados não tinha separação das despesas por quem as fez; eram desmembrados por centro de custo e não por portador. Vinha tudo misturado, os gastos sigilosos e os não sigilosos" contou a ministra.

Por causa disso, afirmou Dilma, a Casa Civil decidiu organizar os dados para que o TCU pudesse auditá-los. Por isso, foi criado o Banco de Dados de Suprimento de Fundos (Suprin). A ministra garantiu, inclusive, ter comunicado ao Senado, mediante pedido de informações do senador Arthur Virgílio (PSDB-AM), que esse banco de dados estaria sendo confeccionado desde 2004.

"Fizemos o Suprin para melhorar a prestação de contas. Uma nova auditoria em 2005 constatou que as dificuldades de controle tinham sido remediadas" disse.

A ministra destacou ainda que os dados do Suprin estão à disposição dos membros da Comissão Parlamentar Mista de Inquérito dos Cartões Corporativos e dos parlamentares em geral e reafirmou a intenção do governo de manter o banco de dados em funcionamento.

"Evasiva"

Arthur Virgílio considerou "evasiva" a resposta da ministra. Para o senador, a falta de respostas ao requerimento de informações apresentado por ele e o posterior vazamento das informações configuram crime de responsabilidade. Ele lamentou ainda não ter recebido as informações que pediu sobre gastos feitos por ele mesmo quando ocupava a Casa Civil.

O senador Mário Couto ratificou que o vazamento é um crime e pediu apuração do caso, "para que o país possa se convencer de que o governo não tem nada a esconder".

"Precisamos esclarecer melhor esse fato que mancha a democracia brasileira" acredita Couto.

Sigilo

A ministra afirmou ser favorável à divulgação de dados referentes a gastos com cartões corporativos a partir do momento em que as informações não mais comprometam aspectos ligados à segurança do presidente da República.

"Eu não vejo nenhum problema em divulgação, a partir de determinado momento, dos dados considerados antes sigilosos. Vai ser um aprimoramento nosso divulgá-los. Isso não depende só de mim. É uma questão de sigilo e esta afeta à segurança. Eu defendo que com a passagem do tempo, ao não comprometer mais a segurança, sejam divulgados. Eu acho que deve ser tornado público, sim" afirmou.

O líder do governo no Senado, Romero Jucá (PMDB-RR), saiu em defesa da ministra dizendo que Dilma sempre se dispôs a participar do encontro e prestar esclarecimentos aos parlamentares. Em entrevista à imprensa, o líder do governo disse que, em sua avaliação, a ministra se mostrou preparada e com equilíbrio emocional e político, durante a audiência.

Na opinião de Jucá, as respostas de Dilma demonstraram que a ministra, que teve coragem para enfrentar a ditadura, agora teve coragem para tocar o Programa de Aceleração do Crescimento (PAC).

Jucá afirmou que a ministra é "a maior vítima" do vazamento de informações da Casa Civil e garantiu que há todo o interesse do governo em esclarecer o assunto. O líder do governo disse acreditar que, com as respostas apresentadas por Dilma na audiência, o assunto do dossiê fica "encerrado no Senado".

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