Tradições de um namoro de interior

Preservar. Quando o assunto é namoro, esse é o principal verbo no interior, especialmente no vocabulário dos pais. Em alguns lugares onde as "tentações" da capital não alcançam, o namoro e os envolvidos – o casal e a família – seguem na linha, à moda antiga. "O namoro é diferente até onde a mídia não chega. Para quem não tem acesso, o namoro é mais certinho, mas quando a novela ensina, os namoros são iguaizinhos", acredita a socióloga Maria Olga Mattas.

A equipe de reportagem de O Estado foi conferir para saber, no Dia dos Namorados, a quantas andam os namoros entre as "moças respeitosas" e os "rapazes tímidos" que se conhecem ou na escola, ou nos bailes ou, ainda, nas igrejas. "Meu primeiro namorado eu conheci no segundo colegial. Durou pouco. É difícil para quem mora no sítio porque poucas vezes o namorado que mora na cidade vai à casa da namorada, mas como eu fazia curso em Alto Paraná três vezes por semana a gente se encontrava", conta Juliana da Mata, de 18 anos. Mesmo tendo durado pouco e os encontros não serem em casa, nos primeiros meses as famílias se conheceram e foi tudo bem formalizado. "Minha mãe nunca gostou muito da idéia, mas o meu pai quis ir lá na casa dele conhecer a família. E lá eles conversaram", lembra.

Juliana passou sua adolescência em um sítio no município de Maristela, próximo a Paranavaí. Hoje, com 18 anos, estuda em Maringá e, mesmo sendo uma cidade de cerca de 300 mil habitantes, já sente a diferença. "Os meninos do sítio, por mais simples que sejam, não têm dificuldade de chegar e conversar com os pais e pedir ajuda. Já os da cidade têm medo e vergonha e nunca se disponibilizam. E as meninas de mais respeito de Maringá são mais soltas do que as de lá (Maristela)", afirma.

A socióloga confirma: "O exemplo de pedir para os pais, se fizer isso aqui (Curitiba), a moça manda o cara passear na hora", concorda Maria Olga Mattas.

"Colombo está bem próxima de Curitiba, mas guarda valores bem tradicionais, o que faz com que as pessoas arrumem namorado da mesma região e da mesma cultura. Nesse sentido acaba sendo um namoro muito próximo", explica o padre Marcos Leite Azevedo, da Igreja Matriz. O padre conta que naquela região a questão cultural e familiar fala muito alto na hora da decisão sobre quem namorar. "O jovem daqui é jovem que preza muito a igreja, 95% são católicos, e há uma aceitação muito grande entre o que é certo e o que não é. O moço quando vai namorar quer saber a origem, a família, quem são os pais, a integração dessa família na sociedade", afirma. Quando escolhida a felizarda, o namoro começa sério.

Velório foi ponto de partida de namoro para casal jovem

Na Lapa, a questão da família também permanece muito forte nos namoros. "O que acontece no interior é que o pessoal acaba ficando muito próximo. Namorando, casando entre eles mesmos do interior. É muito difícil um rapaz da cidade namorar uma moça daqui", explica o padre Gilberto Aurélio Bordini, da Paróquia Santo Antônio. Esse namoro é difícil, mas há exceções.

Tamara dos Santos Ribas, de 16 anos, conheceu o namorado Anderson, de 22, quando voltou da praia para o velório do bisavô. Foi amor à primeira vista, pelo menos da parte dele, como contou a mãe de Tamara. "Então esse meu primo, de Curitiba, que eu nunca tinha visto, estava na rodoviária me esperando quando eu voltei. Em uma semana ele me pediu em namoro, num banco em frente à cadeia. Ele estava bem nervoso. Em duas semanas ele foi pedir para o meu avô, que rezou aquela missa toda, mas acabou deixando. E já faz dois anos e três meses que a gente namora. O nosso programa, quando ele vem, é assistir filme em casa com todo mundo", conta Tâmara.

A mãe de Tâmara confirmou toda a história e contou ainda mais detalhes sobre o início do namoro dos primos. "Ele pediu ela para o meu pai porque a gente tem esse costume de pedir. Aí a gente explicou para ele que seria do nosso jeito, do tradicional, que não deixamos sair à noite e que não teria liberdade. Perguntamos se ele aceitaria desse jeito. Ele acabou aceitando", conta Neuza dos Santos, 39 anos.

Família

"No interior, principalmente no sítio, a influência que a família tem é muito forte. Os pais ainda querem preservar. Os pais têm a tendência de passar para os filhos o que receberam dos pais", explica o padre Gilberto.

A família Hoffman, também da Lapa, é um exemplo do que é preservar. "O namoro de televisão não é correto. É tudo muito apressado. A minha filha, de 22 anos, trabalha na cidade e namora há seis anos. É o primeiro namoro, tanto dela quanto dele. Eles estão esperando se formar para se casar", conta Maria de Lourdes Zella Hoffman, 49 anos. Dona Maria de Lourdes e seo Alceu têm sete filhos, três são casados e outros três não estão nem namorando, mas já receberam todas as informações que precisam sobre o assunto, para não "acontecer coisa errada". (NF)

Bolo recheado marca devoção a santo casamenteiro

Lígia Martoni

Comemorado amanhã pelos católicos, o Dia de Santo Antônio – mundialmente conhecido como o "santo casamenteiro" – é rememorado pelos fiéis não apenas como promessa de achar o par ideal, mas como forma de partilha e solidariedade. O símbolo da tradição é o bolo de Santo Antônio, agregando uma grande festa e muita expectativa para achar os cerca de 1,5 mil santinhos colocados no meio da guloseima que, em Curitiba, está sendo vendida entre hoje e amanhã na igreja Bom Jesus, no centro.

Este ano o bolo de Santo Antônio deve ser consumido por 30 mil pessoas, em média. Cerca de duas toneladas do doce foram preparadas especialmente para a ocasião. De acordo com o frei Clemente Kesselmeier, tamanho preparo significa também um grande compartilhamento. "O bolo remete ao pão, que devemos dividir em comunhão. Se tudo que temos for partilhado igualmente, haverá multiplicação, abundância para todos", afirma.

Santo Antônio ficou conhecido nos anos 1200s por defender principalmente as mulheres, que na época eram dadas em casamento pelas famílias e não tinham direito de escolher o marido, conforme relata frei Clemente. "Ele foi o único naquele tempo a lutar pela opção de as mulheres escolherem com quem gostariam de se casar e hoje sua representação tem tudo a ver com o cenário atual do mundo", acredita.

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