Campo Largo

Tatuagem de aranha motiva 1ª união entre mulheres no PR

A coisa começou assim: Rafaele Franco Ribeiro, 26, anos ficou fascinada com a viúva negra (aranha), que Denise Maria da Silva, 46 anos, tinha tatuada no pescoço. E confessou que também tinha uma aranha tatuada na virilha. As duas eram colegas de trabalho na empresa Fiat, em Campo Largo, onde Denise é encarregada de pessoal. Rafaele mostrou a sua aranha para Denise e as duas se tornaram amigas. Mais que isso. Passaram da amizade ao namoro, que durou dois meses e a um relacionamento de mais nove meses. Hoje às 9h30 as duas se casaram legalmente no Cartório Ferraria, no bairro Ferraria de Campo Largo.

Denise chegou ao cartório com um discreto, porém elegante conjunto formado por calça preta, colete preto e camisa branca. E um grande sorriso no rosto. Rafaele estava vestida de branco, como é característica de todas as noivas. E estava um pouco nervosa. Familiares e amigas acompanhavam as duas. Na hora de tirar uma foto na frente do cartório, a amiga Petra gritou: “Dá um beijo”. E as duas atenderam ao pedido. A cerimônia que aconteceu depois seria mais uma união homoafetiva não fosse um detalhe: este foi o primeiro casamento entre mulheres no Estado do Paraná, que transformou a união num fato histórico.

Antes deste casamento, a pouco mais de um ano, houve a união afetiva em Curitiba entre Rebeca e Cauani, que foi a primeira união estável entre mulheres no Paraná. Embora sejam atos civis com muitas semelhanças, a união afetiva produz uma situação de fato que pode ser contestada, enquanto o casamento gera todos os direitos sem questionamentos, garantindo maior segurança em questões sucessórias, patrimoniais, previdenciárias e uso do nome. Rafaele, por exemplo, acrescentou o Silva de Denise a seu nome.

O casório

Ao lado das duas- Rafaele e Denise – estavam as testemunhas Cristina Franco Ribeiro (irmã de Rafaele) e Sonia Maria Leopoldino da Silva. E observando a cerimônia, o garoto André, de 5 anos, filho de uma união informal de Rafaele com um rapaz. “O relacionamento não deu certo e eu conheci Denise e a gente se gostou”, confessou emocionada depois. Ao ato de assinatura do documento de união civil conduzido pelo tabelião Luís Flávio Fidelis Gonçalves, seguiu-se uma cerimônia presidida pelo juiz de paz Rogério Alceu Aleixo, que usou todos os floreios de ocasião destinados a casamentos entre pessoas de sexos diferentes. “Haja sempre serenidade e paz em vossos corações e que vocês consigam trilhar juntas o vosso caminho”, disse ele.

Na hora das noivas trocarem as alianças, ele observou: “A aliança é a mais perfeita forma geométrica já criada. O círculo é a forma mais perfeita para celebrar uma união. E o material com que foi feita esta aliança tem um significado de perenidade: não enferruja, não perde o brilho. Que seja assim a união de vocês”, disse, sereno e quase paternal.  Ao final, decretou: ‘Eu vos declaro casadas. Parabéns‘. Denise abriu o maior sorriso do mundo e parecia ainda atordoada quando Rafaele pegou o seu rosto e sapecou um beijo apaixonado.

Planos

Uma coisa já ficou definida: Rafaele vai ficar em casa cuidando da retaguarda enquanto Denise vai pegar no batente em seu emprego. “Eu prefiro assim”, diz Denise. As duas também têm planos de acrescentar através de inseminação artificial mais um filho à família, que já tem André, que ainda não sabe exatamente se a mãe é casada com homem ou mulher. “Ele ainda é novo. Depois a gente esclarece isso”, diz Denise. Indagada quando ocorreu sua preferência por mulheres, Rafaele disse que nasceu assim, desde criança gostou de mulheres. No início tentou esconder a preferência e até arriscou um relacionamento com um homem: “Não deu certo”.

O juiz de paz Rogério Alceu Aleixo não achou nada estranho o fato de estar casando mulheres em vez de pessoas de sexos diferentes. “A lei permite. Eu acho bom. Isso garante os direitos diante das dificuldades. Para ser sincero, isto já devia ter acontecido há mais tempo. Até para acabar com a discriminação”, disse ele com a mesma serenidade com que cel,ebrou o casório.

O tabelião Fidelis Gonçalves disse que seu estabelecimento fez algo histórico, “porque muitos cartórios não aceitam ainda a realizar este tipo de cerimônia, alegando não ter previsão legal. Eu acho o seguinte: não é proibido, então faço. E já tem pessoas de outros municípios ligando, interessadas em casar em nosso cartório”. No entanto, ele alerta estas pessoas que a cerimônia somente é possível quando um dos cônjuges reside na circunscrição do tabelionato, o que foi o caso das duas mulheres que se casaram.

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