Ferryboats operam de modo precário

A travessia de ferryboat que liga Guaratuba a Caiobá, no litoral do Paraná, dura apenas alguns minutos. Tempo suficiente para que o passageiro note uma certa fragilidade no modo de operação das embarcações. O não cumprimento de normas da Capitania dos Portos, responsável por fiscalizar as condições de segurança do serviço, é diário.

Mesmo com média anual de 1 milhão de veículos e movimentação de R$ 5 milhões ao ano, a operação da travessia de 1,2 quilômetro de extensão, feita desde 1996 pela empresa F. Andreis, é criticada. Mais que a falta de manutenção das embarcações, o sistema de ligação entre balsa e rebocador é definido como rudimentar pelo engenheiro naval Ghert Prange. O sistema seria inadequado para local sujeito a ventos e marés, como é o caso da baía. ?O sistema de engate é muito rudimentar. O pino que liga o rebocador à balsa passa folgado nos buracos da balsa, leva tranco quando tem onda e isso o quebra?, avaliou.

Segundo o engenheiro, o sistema poderia ser substituído por um engate tipo cardan, de cruzeta de automóvel. ?Isso já foi mostrado à gerência da F. Andreis, que nunca mudou porque é mais fácil trocar o pino do que fazer algo bem feito?, criticou. As rampas de acesso ao ferryboat, feitas de tábuas de madeira, freqüentemente têm pregos soltos. No entanto, segundo o Departamento de Estradas de Rodagem do Paraná (DER-PR) – órgão responsável pela fiscalização de operação, fila de veículos e aproveitamento das balsas -, durante o período da concessão já foram investidos mais de R$ 5,4 milhões em embarcações, instalações, ferramentaria e máquinas.

São seis embarcações utilizadas no trajeto, sendo três balsas de propriedade da F. Andreis e três ferryboats do DER: Piquiri, Nhundiaquara e Guaraguaçu, este último o mais antigo (começou a operar em 1981) e no momento parado para manutenção. Cada uma tem capacidade para transporte de 48 veículos e 100 pessoas.

Normas

As regras impostas pela Capitania dos Portos para embarcação de travessia não são respeitadas pela F. Andreis, segundo o capitão-de-corveta Avelino de Freitas. ?Os passageiros não podem ficar encostados na balaustrada nem circulando entre os veículos, além da necessidade de calçamento dos veículos, que não é feito?, apontou.

A Capitania determinou o aumento da tripulação, de duas para seis pessoas, o que também não seria cumprido. ?A atividade de navegação é, por natureza, de risco, e a segurança é fruto de precaução. À medida que uma empresa não cumpre as normas e normalmente não se preocupa com elas, eu ponho em dúvida a sua segurança?, afirmou Freitas.

Existem diversas notificações da Capitania pelos procedimentos não seguidos, mas que até agora não foram transformadas em multas por conta de uma ação movida pela F. Andreis na Justiça Federal. A empresa pede a sustação dos autos de infração e a proibição de aplicação de novas penalidades referentes à permanência de pessoas em local inadequado na embarcação. A F. Andreis foi procurada para comentar o assunto, mas não retornou as ligações da reportagem.

Nova licitação pode mudar empresa

Uma licitação para definir a operação da travessia com o ferryboat na próxima década está em curso há quase um ano. De acordo com o DER-PR, o processo licitatório está em fase de habilitação (análise da documentação) e alguns pontos foram revistos para flexibilizar as regras e aumentar a concorrência. As fases seguintes são de apresentação de proposta técnica e proposta de preço, mas não há prazo definido para término do processo. Inicialmente, a previsão era que a escolha da empresa acontecesse em até três meses. Segundo o edital elaborado por técnicos do DER, o preço e a capacidade técnica são as características levadas em conta na concorrência. A empresa vencedora será aquela que atender a todas as exigências técnicas do edital e apresentar os menores preços para as tarifas. Além da F. Andreis, a empresa Interportos participa do processo. Implantado em 1960 como uma solução de transporte para os moradores de Guaratuba, o ferryboat logo passou a incentivar o turismo na região. Antes da sua implantação, o acesso dos moradores de Guaratuba ao balneário Caiobá e às demais praias do Estado era feito por uma estrada de terra passando por Garuva (SC). Outra opção era fazer a travessia de barco através de pequenas lanchas. A concessão para que a F. Andreis operasse com exclusividade no trecho foi concedida em 1996, com validade de dez anos. Um aditivo tem permitido a continuidade do serviço. (LC)

Pino solto teria deixado balsa à deriva

No fim de abril, uma balsa que fazia a travessia ficou encalhada próxima ao Iate Clube de Caiobá. Embora não tenha deixado feridos, passageiros testemunharam que uma pessoa da tripulação teria soltado o pino que liga a balsa ao rebocador, deixando-a à deriva.

O rebocador acabou encalhado em um banco de areia e a balsa no manguezal. Maria Cristina Cecato de Lima era uma das passageiras no dia. Ela estava com o marido, o filho e a sogra. ?Começou um pequeno tumulto, com funcionários correndo. Deu para perceber que algo estava errado. A balsa começou a ficar longe do empurrador e todos viram que o pino tinha se soltado. Ficamos à deriva um tempo suficiente para nos distanciarmos do percurso. Com grande sorte e muita dificuldade conseguiram recolocar o pino. Em uma travessia tão curta, esse problema nunca deveria acontecer. Foi uma tensão muito grande?, relatou. Há indícios que demonstram desvios de procedimento no dia do acidente. O caso continua sendo investigado pela Capitania dos Portos, por meio de um inquérito que tem prazo de conclusão de 90 dias a partir da sua abertura, podendo ser prorrogado.

Pela Vara de Paranaguá corre uma ação popular de autoria do advogado Luiz Gastão Mocellin que acusa a F. Andreis de ocupação irregular da área que pertenceria à Marinha, na qual explora a atividade. O valor da causa está em R$ 10 milhões. ?É uma empresa que não traz benefício para a cidade e só arrecada. Até mesmo seus funcionários são de fora?, disse o advogado.

Últimos acidentes ocorridos na travessia

29/4/2008: balsa encalhou próximo ao Iate Clube de Caiobá, depois de o pino que liga a balsa ao rebocador ter se soltado.

27/3/2005: abalroamento (colisão) do ferryboat Piquiri com jet-ski.

3/6/2004: abalroamento da balsa Sonica III com barco de pesca.

16/12/2003: balsa Sonica III encalhou devido à rajada de vento forte.

3/6/2001: queda na água de veículo que estava no ferryboat Nhundiaquara.

8/1/2001: queda na água de veículo que estava no ferryboat Nhundiaquara.

6/4/2000: abalroamento do ferryboat Guaraguaçu com rebocador da F.Andreis.

6/9/1999: abalroamento do ferryboat Nhundiaquara com a embarcação Number One.

4/1/1999: do ferryboat Nhundiaquara, queda de pessoa ao mar e morte.

28/1/1996: abalroamento do ferryboat Nhundiaquara com jet-ski, com desaparecimento e morte do piloto do jet-ski.

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