Estrada de Garuva está repleta de buracos

garuva300105.jpg

Os buracos já são
conhecidos dos motoristas.

O técnico mecânico Antônio Rodrigues Veiga e o comissário de bordo Leandro Eduardo de Oliveira, de Curitiba, não se conheciam. Mas as suas vidas se cruzaram quando passaram pelo mesmo buraco na rodovia que liga Garuva (Santa Catarina) e Guaratuba (Paraná). Até a divisa do estado vizinho, a estrada se chama SC-415 (extensão de 17 quilômetros). No Paraná, passa a ser PR-412 (23 quilômetros).

Quem utiliza essa via precisa ter atenção redobrada. São vários buracos na parte sob responsabilidade catarinense. Alguns se tornaram verdadeiras crateras. Mesmo dirigindo a uma velocidade baixa e tomando cuidado para não cair nos buracos, Oliveira passou por uma enorme depressão, que danificou uma roda dianteira e um dos pneus da traseira. "Passei em um buraco na cabeceira de uma ponte, o que é muito perigoso. Estava atrás de um veículo, que conseguiu desviar do buraco, eu não. O carro se descontrolou. Troquei o pneu da frente no local e fui para um borracheiro", conta.

O comissário de bordo parou na borracharia de José Cardoso, localizada no quilômetro 20, perto da divisa entre Santa Catarina e Paraná. Foi lá que encontrou Veiga, que também solicitou os serviços de Cardoso para consertar uma roda amassada e um pneu danificado. O técnico mecânico havia passado pelo mesmo buraco, na cabeceira de uma ponte. "A estrada está muito ruim. Você sai de um buraco para cair em outro. Por sorte, o estrago não foi muito grande, mas é um transtorno para as nossas férias", diz Veiga, que estava viajando com toda a família.

José Cardoso informa que cobra uma média de R$ 10 por serviço, dependendo do estrago causado no carro. "Mas, para mim, não será apenas os R$ 10 para o seu José. Quando chegar em Curitiba, terei que passar na concessionária para arrumar definitivamente a roda e trocar os pneus. Tudo vai me custar uns R$ 500", comenta o comissário Oliveira.

O borracheiro está tão acostumado com os serviços que aparecem para fazer que executa a tarefa de maneira automática. Ele fala que a rodovia está mal conservada há quatro temporadas. As trocas de pneus, as rodas amassadas e as calotas do meio da rodovia viraram cena comum. "Na véspera no Natal, fiquei prestando socorro até às 3h30 da manhã por causa dos buracos. Conheço um por um e até eu já caí em um deles. Fui fazer um socorro e não tinha como desviar do buraco. Para mim, essa situação até que é boa, mas estão acontecendo muitos acidentes graves na estrada, inclusive com mortes", salienta Cardoso.

Muitos motoristas que têm problemas na estrada por causa dos buracos nem chegam a ir até um borracheiro. As várias lanchonetes e lojas na beira da rodovia também servem como socorro nesse momento difícil. A proprietária do Mini Mercado Cotia, no Paraná, Helena Pereira, sempre auxilia os condutores que param em frente ao seu estabelecimento. "Em um dia, três carros pararam aqui para trocar o pneu. O estado da estrada prejudica muito o movimento. Muita gente diz que não pega mais esta rodovia. Na parte do Paraná, é muito tranqüilo", declara.

Calotas perdidas viram troféus

Os pneus furados e as rodas amassadas rendem um tipo de diversão para alguns moradores da beira da SC-415: pegar as calotas perdidas no meio da estrada. O dono da banca Recanto do Vimi, João da Silva Santos, que mora há 20 anos no local, revela que seu filho pega as peças perdidas pelo meio do caminho. "De vez em quando ele faz isso. Ainda temos algumas, mas já vendemos bastante. As pessoas que passam pela estrada compram muito, mesmo as arranhadas ou um pouco amassadas", afirma. Os motoristas que perderam as suas calotas às vezes voltam para reaver as peças. Acabam encontrando-as na loja de Santos. "Eles dão uma gorjeta para o menino e levam as calotas."

O artesão Rafael Souza tem, em frente de sua casa, uma coleção de calotas. Todas ficam expostas e não passam desapercebidas por quem trafega na rodovia. "Elas caem na estrada, mas não é todo dia que consigo pegar. Tem locais que ficam cheios de calotas perdidas", revela. Ele também vende as peças para os condutores e para os borracheiros da região. "Cobro entre R$ 3 e R$ 5, dependendo do estado que ficou", responde. A exposição foi construída para tentar alcançar vendas e também por diversão. Mas possui uma outra função. Serve de alerta para os motoristas mal, avisados. Por ali, ele pode perder as calotas, os pneus, as rodas e até mesmo a própria vida. (JC)

Lei restritiva não funciona

O deputado estadual Antônio Anibelli (PMDB) fez um projeto de lei, aprovado e sancionado há dois anos (Lei n.º 14.055), que restringe a passagem de caminhões pela travessia de ferryboat em Guaratuba. Somente os veículos com comprimento igual ou inferior a 14 metros e peso bruto igual ou inferior a 26 toneladas poderiam utilizar a balsa. Ficaram excluídos também as carretas e caminhões cuja mercadoria tenha sido produzida no litoral paranaense e aqueles que tenham destino final ou origem no município de Guaratuba.

"A passagem de caminhões pesados põe a população em risco por 24 horas. Eles causam a destruição das estradas e das cidades. As carretas pesadas trincam paredes, passam em alta velocidade e ainda não trazem lucro nenhum. Dizem, inclusive, que estão emplacando caminhões em Guaratuba para não terem problemas", afirma.

A lei, porém, não está sendo cumprida porque a F. Andreis, empresa de transporte hidroviário que tem a concessão do ferryboat desde novembro de 1996, conseguiu uma liminar na justiça para garantir a passagem de caminhões durante o ano todo. A única restrição acontece durante a temporada, período em que está prevista, no contrato de concessão, a interrupção do trânsito de caminhões devido ao movimento de turistas. Depois de março, o tráfego passa a ser normal.

O gerente de contrato da F. Andreis, Valdir Boligon, explica que o empreendimento seria comprometido se a passagem de caminhões fosse realmente proibida. Um dos argumentos da empresa para conseguir a liminar foi a demissão de 40 funcionários por não ser mais viável tocar o negócio. "Se isso acontecesse, deveria haver uma forma do governo ressarcir o prejuízo. Seria isso ou o repasse na tarifa para manter o equilíbrio das finanças", comenta. A tarifa hoje custa R$ 3,90 para veículos de passeio. (JC)

LRF proíbe investimento paranaense

A SC-415, apesar de ser uma rodovia catarinense, era conservada até pouco tempo atrás pelo Departamento de Estradas e Rodagem (DER) do Paraná. Mas depois da aplicação da Lei de Responsabilidade Fiscal, há quatro anos, o Estado ficou impossibilitado de investir na parte da estrada localizada dentro do território de Santa Catarina.

Depois de muitos protestos de usuários, o estado vizinho está prometendo a reabilitação da rodovia desde fevereiro do ano passado, segundo o que divulgou a imprensa catarinense. O edital de licitação seria lançado um mês depois, mas o processo somente foi concluído em setembro. Em entrevista para O Estado em novembro de 2004, depois de um protesto na rodovia, o diretor-geral do Departamento de Infra-Estrutura (Deinfra) de Santa Catarina, Romoaldo de França, disse que a SC-415 não estava inclusa no plano rodoviário estadual. De acordo com ele, "a rodovia foi construída há 25 anos, por meio de uma parceria entre os governos de Santa Catarina e do Paraná. Porém ninguém assumiu a responsabilidade sobre ela".

O governo catarinense alega que não tinha como fazer a manutenção da rodovia porque o Tribunal de Contas do estado não aceitava investimentos em um local que não era reconhecido como parte da malha viária catarinense. A estadualização do trecho foi realizada para que as obras pudessem sair do papel. O prazo, então, foi prorrogado para novembro do ano passado, pois tinham ocorrido esses problemas burocráticos. O Deinfra, na época, informou que as obras no trecho estariam concluídas em três meses, junto com o final da temporada de verão.

O novo prazo estipulado pelo Deinfra era 10 de janeiro deste ano. Até agora, porém, não há máquinas na pista. Apenas homens estão trabalhando na operação tapa buracos. A Secretaria de Estado de Infra-Estrutura de Santa Catarina comunica que a licitação está completa e a empresa contemplada está começando os trabalhos de topografia. As obras estão orçadas em R$ 6,6 milhões.

De acordo com o secretário em exercício, Jorge Folis, o contrato tem início em fevereiro. A partir de março, período em que cai o movimento na estrada, as obras começam efetivamente. (JC)

Tapa-buracos não adianta

Desde o final do ano passado, o governo de Santa Catarina está promovendo uma operação emergencial de tapa-buracos em algumas áreas. Uma nova camada de piche foi colocada em trechos mais críticos. Mas, com a ação das chuvas e com o movimento intenso, as depressões voltaram a aparecer.

Para a secretária Priscila Correia, que trabalha no restaurante Recanto Colonial, na beira da estrada em Santa Catarina, o tapa-buracos não está adiantando nada. Ela anda na rodovia todos os dias. Sai de Garuva, onde mora, para ir trabalhar. "Em alguns trechos, eles tapam alguns buracos e deixam os menores. Quando chove muito, o que tem acontecido bastante, os buracos aumentam. Dizem que a partir do dia 15 deste mês o governo de Santa Catarina iria fazer obras na rodovia, mas até agora só o tapa-buraco. Melhorou muito pouco", opina. De acordo com ela, muita gente pára no local onde trabalha apenas para trocar os pneus estourados. "Mas eu queria que os motoristas parassem aqui para conhecer o lugar."

Já o dono da banca Recanto do Vimi (SC), João da Silva Santos, acha que a estrada melhorou bastante com as ações emergenciais. Mas ele admite que os buracos estão voltando com as chuvas intensas. Por causa deles, passa as noites em alerta, esperando o pedido de ajuda de alguém na estrada. "O pessoal, à noite, passa pelos buracos e pára aqui. Ajudo a socorrer", enfatiza. Para tentar evitar acidentes, ele e seu vizinho preenchiam as depressões com barro. "A gente fazia isso porque sentia pena dos motoristas à noite, pois é muito difícil enxergar os buracos nesse período. Cada dia eram 15 carros que paravam na beira da estrada. Deixamos de fazer isso, pois com as chuvas o barro virava lodo, o que podia ser perigoso. Começamos, então, a colocar a brita que ficava na beira da estrada de volta no buraco", lembra Santos. (JC)

Caminhões são os culpados pelo estrago

Moradores e comerciantes da região por onde passa a estrada entre Garuva e Guaratuba realizaram diversos protestos, durante o ano passado, pedindo a recuperação do trecho catarinense. O presidente do Sindicato dos Hotéis, Bares e Restaurantes do Litoral do Paraná (Sindilitoral), José Carlos Chicarelli, revela que o principal motivo para a estrada estar dessa maneira é a passagem intensa de caminhões pesados.

Eles saem de Santa Catarina rumo ao Porto de Paranaguá e cortam caminho pela rodovia. Os caminhões utilizam o ferryboat para chegar até o destino final. Se não usassem essa alternativa, os veículos pesados teriam que ir até Curitiba, pela BR-376, e depois descer a Serra do Mar pela BR-277 para chegar em Paranaguá. Com o primeiro trajeto, os motoristas encurtam a distância em 70 quilômetros.

"Os caminhões pesados são incentivados a passar pela estrada. O ferryboat sai mais barato e encurta a viagem. São eles que estão causando os enormes buracos na rodovia e a situação fica crítica quando o problema se une à falta de conservação da parte catarinense", critica Chicarelli.

De acordo com ele, o governo de Santa Catarina realizava algumas obras emergenciais na estrada apenas na temporada. Com o comprometimento de começar a restauração da rodovia no último dia 10 de janeiro, o governo não fez qualquer tipo de conservação para a atual temporada de verão. "Deixaram estragar bastante", aponta.

Os caminhões pesados ocasionam estragos nas estradas e também nas ruas das cidades por onde passam, principalmente Guaratuba e Matinhos. O asfalto desses municípios não foram construídos para agüentar o peso e o movimento dos veículos de carga. O prefeito de Guaratuba, Miguel Jamur, confirma que as ruas da cidade estão com problemas por causa da passagem dos caminhões. "Há uma necessidade de recuperar tudo, pois o prejuízo é grande", explica. O estado de abandono da estrada também preocupa Jamur.(JC)

Voltar ao topo