Fenômenos naturais

El Niño não é o único vilão das chuvas no Estado

O tempo surpreendeu os paranaenses nos últimos dois meses. Muita chuva, ventanias e até tornado foram registrados no Estado neste período. Um início de primavera conturbado e que causou muita destruição. Vinte e um municípios do Paraná decretaram estado de emergência.

Entre 1.º de setembro e 15 de outubro, cerca de 150 mil pessoas foram afetadas pelos fenômenos naturais. Quase 100 ficaram feridas. Mais de 10 mil residências danificadas. E a previsão para os próximos meses não é nada animadora. Afinal, o que está acontecendo com o tempo?

O tornado registrado em Ampére, na região sudoeste do Paraná, assustou muitos moradores. Mas o fenômeno não é algo “anormal” nesta época do ano, explica o meteorologista Cezar Duquia, do Instituto Tecnológico Simepar.

Nessa área e também na região oeste, já houve outros casos de tornado. A diferença dessa vez foi a captação da imagem e a maior percepção dos moradores.

“Pode não significar que esteja acontecendo mais. Mas existe um maior registro. Há 15 anos, os centros urbanos eram menores do que hoje. Atualmente, qualquer pessoa tem condições de fazer um registro como este”, esclarece.

O tornado pode acontecer em qualquer lugar onde haja condições para isso. O meteorologista lembra que já houve um fenômeno desse tipo em Ponta Grossa, na região dos Campos Gerais.

Segundo Duquia, existem linhas de instabilidade que chegam antes da frente fria. Seria como a frente da frente. Ao longo dessa linha, surgem núcleos de chuvas. Embaixo das nuvens, pode aparecer uma espécie de funil, que suga para cima o que tem na superfície, dando origem ao tornado.

No entanto, a condição não ocorre em toda a nuvem. O tornado é algo rápido e localizado. As regiões oeste e sudoeste do Paraná sofrem mais por causa da alta temperatura e da umidade. Esses são dois fatores considerados combustíveis para gerar instabilidade. “É como se estivesse em uma chaleira”, compara Duquia.

Não existe um grande vilão para tudo isso. Muito se fala do El Niño, fenômeno em andamento e que aquece as águas do Oceano Pacífico, próximo da costa do Equador, Peru e da Colômbia. Uma das consequências desse aquecimento é o aumento de chuvas na região sul do Brasil (ver quadro).

“Mas não podemos colocar 100% de culpa no El Niño”, comenta Duquia. A mesma opinião foi dada por todos os especialistas ouvidos pela reportagem. O aquecimento global, que têm causado um aumento nas temperaturas médias em todo o planeta, pode também estar contribuindo para o ocorrência destas manifestações. “Quem tem mais peso? Realmente eu não sei. São todos fatores que se relacionam”, afirma José Fernando Pesqueira, pesquisador do grupo de previsões climáticas do Centro de Previsão de Tempo e Estudos Climáticos do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Cptec/Inpe).

De acordo com Rosandro Minuzzi, meteorologista do Instituto Agrônomo do Paraná (Iapar), não existe um consenso sobre o que motiva o aparecimento do El Niño. Uma das razões para o aquecimento das águas do Pacífico seria o enfraquecimento dos ventos alísios. Mas e o que causa isto? É uma pergunta ainda sem resposta.

“O El Niño é o exemplo da forte conexão entre oceano com a atmosfera. Modifica o comportamento da circulação da atmosfera, que altera o comportamento do oceano. É como se fosse um grande ciclo”, explica.

Frente fria compensa desequilíbrio de temperatura

As frentes frias, seguidas de massas de ar frio, surgem para compensar um desequilíbrio na temperatura entre a linha do Equador e os polos. Um equilíbrio que nunca vai acontecer.

No entanto, o El Niño deixa a região da linha do Equador mais quente e isso gera uma tentativa de compensação. Surgem ainda mais frentes frias. Segundo José Fernando Pesqueira, do Cptec/Inpe, paralelamente, existe o transporte de ar quente e úmido da região norte para o sul do País.

Neste ano, choveu demais nos estados do norte e nordeste, o que elevou o nível dos rios. Com isso, vem um volume muito grande de umidade. ,Pesqueira explica que não é possível determinar até quando o El Niño deve durar.

Mas a previsão indica que o fenômeno deve enfraquecer entre dezembro e março do ano que vem. Isso não significa que vai parar de chover, pois o verão é uma estação chuvosa. (JC)

Flora e fauna se ressentem das grandes variações

O excesso de chuvas pode causar impactos no aparecimento das flores e na reprodução dos animais. As enchentes trazem consequências para a fauna aquática.

“E mal consegue se recuperar de uma, já vem outra”, lembra o professor José Marcelo Rocha Aranha, professor da disciplina de Ecologia da Universidade Federal do Paraná (UFPR). Algumas espécies de animais têm uma “janela” para a reprodução, principalmente quando o tempo começa a esquentar.

A variação muito grande entre dias frios e quentes pode atrapalhar e fechar este período propício para que os animais se reproduzam. É como se fosse alterado o relógio biológico.

De acordo com o professor, o mesmo acontece com a flora. Uma flor aberta antes do tempo, por causa do calor, “espera” o inseto que vai fazer a polinização. Mas se voltar a ficar frio, o inseto não aparece.