Desacordo entre Urbs e prefeito na tarifa de ônibus

O prefeito em exercício de Curitiba, Beto Richa, suspendeu ontem o aumento de 15% na passagem do transporte coletivo na cidade. Ele alegou que não teve conhecimento dos estudos que resultaram no novo valor de R$ 1,90. O preço de R$ 1,65 volta a vigorar a partir da zero hora de hoje. A presidente da Urbs, Yara Eisenbach, no entanto, afirmou que a passagem vai aumentar de qualquer maneira. De acordo com ela, o sistema de integração nas quatorze cidades da Região Metropolitana de Curitiba pode ficar comprometido se o valor da passagem continuar o mesmo.

A suspensão do reajuste aconteceu depois que Beto Richa assinou um decreto cancelando a determinação anterior, expedida pelo prefeito Cassio Taniguchi. “Eu soube do aumento pelos jornais e fiquei surpreso. Estou sendo cobrado nas ruas e não tenho as respostas”, justifica. “Se me convencerem que é um valor correto, a passagem pode voltar a R$ 1,90. Até lá, a tarifa de R$ 1,65 será aplicada”, avisa Beto, que solicitou as planilhas de custos para a Urbs. Ao mesmo tempo, o prefeito em exercício confirmou o reajuste nos salários dos funcionários do sistema de transporte coletivo – previsto para fevereiro -, mesmo sem o aumento na tarifa.

Beto acredita que houve falha na comunicação interna. “O aumento entrou em vigor no meu mandato e eu não sabia. Não há a necessidade de mudar a direção da Urbs”, comenta. Ele explica que a medida não causa mal-estar no Executivo municipal. “Tenho certeza de que o prefeito Cassio faria a mesma coisa se a situação fosse inversa”, revela. Beto tentou entrar em contato com Taniguchi, que está em viagem, mas não conseguiu.

Naturalidade

A presidente da Urbs, Yara Eisenbach, viu com naturalidade a atitude do prefeito em exercício. “Realmente houve falha na comunicação. Será agendada uma reunião com Beto Richa e os técnicos da Urbs”, afirma. “Ele tem o direito de conhecer o estudo.” Yara expõe que o aumento da passagem só abrange o repasse dos custos para manter o sistema integrado de transportes.

Segundo dados da empresa, a maior parcela do valor de R$ 1,90 está relacionada com o aumento de 10,2% nos salários de 14.500 funcionários do transporte coletivo, com data-base em 1.º de fevereiro. Além disso, o combustível (diesel) teve aumento de 2,5% somente no Paraná, devido a problemas técnicos na refinaria da Petrobrás em Araucária.

A presidente da Urbs avisa que a passagem vai aumentar de qualquer maneira para cobrir esses custos. “O reajuste de 15% corresponde aos aumentos em outros setores, como água (14%), energia (15%) e telefone (14,34%)”, compara. Yara defende-se, dizendo que a tarifa seria maior ainda se fossem considerados os índices corrigidos para a troca da frota, obrigatória a cada dez anos. “A passagem passaria de R$ 2,20”, comenta. A presidente da Urbs também afirma que os custos da mudança dos motores, prevista para diminuir a poluição, não constam na planilha. “Neste caso, o valor efetivo seria superior a R$ 2,36.” A Urbs considera que terá um aumento no valor de manutenção dos ônibus por causa dessas medidas.

Redução da frota

A redução no número de veículo não está descartada, se o aumento não entrar em vigor. “Mas não acredito que chegue nesse ponto”, conta Yara. Ela destaca que a Urbs já teve prejuízo com a medida, estimado em R$ 4 milhões. “No período entre os dias 25 e 1.º, são realizadas as vendas dos vales-transporte para as empresas. Elas vão pagar R$ 1,65 no número de passagem de todo o mês.”

Os usuários que pagaram R$ 1,90 pela tarifa não receberão o dinheiro de volta. “Uma lei estava em vigor e o preço era aquele”, afirma Yara. Para ela, o reajuste não vai pesar no bolso do trabalhador. “Quem paga é a empresa, nunca o empregado”, acredita. “Em um sistema integrado, para alguém pagar menos, outro precisa pagar mais”, afirma. Se confirmada para 1,90 reais, a tarifa em Curitiba será a maior do país, considerando-se todas as capitais.

Dieese contesta aumento com evidências

Pela análise do Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos (Dieese) não há justificativas para um aumento de 15,15% no preço da passagem de ônibus em Curitiba. A folha de pagamento tem um peso de 45% na tarifa e os combustíveis 21%. Juntos eles representam 66%. Se considerarmos que motoristas e cobradores tenham reajuste de 12% em seus salários este mês, mais a queda de 3% no preço do óleo diesel no ano passado, os outros insumos teriam que ter subido nesse período pelo menos 30%. O que não ocorreu.

Segundo o economista Sandro, do Dieese, em maio do ano passado a tarifa chegou até ter uma baixa de R$ 0,05. Depois disso, não houve qualquer aumento significativo dos insumos que compõem a planilha. De acordo com o economista, em agosto do ano passado, os funcionários da Urbs tiveram aumento de salário, mas ele não teve grande impacto na planilha. Os outros insumos, como peças e acessórios, lubrificantes e pneus, também não mostraram uma alta tão elevada de preços.

Ontem, o Sindicato dos Motoristas e Cobradores das Empresas de Transporte de Passageiros estava em negociação com a Urbs. O presidente, Denilson Pires, não quis adiantar valores. A inflação para a data base de fevereiro está calculada em 8,5%. Mas o Dieese usou em seus cálculos reajuste de 12%, pois a categoria pede outros benefícios.

Acima da inflação

Sandro comenta ainda que o aumento da passagem em Curitiba está bem superior à inflação registrada desde que o Plano Real entrou em vigor. De julho de 1994 até hoje estão acumulados 169,61% contra 375% do aumento da passagem. Na época a passagem custava R$ 0,40. “É mais do que o dobro da inflação”, compara.

Sandro diz que a URBS alega que outro motivo por trás do aumento é a redução no número de passageiros. Para ele, isso virou um círculo vicioso, uma vez que os reajustes espantam cada vez mais gente.

Usuários reclamam

Mesmo com a suspensão do reajuste, os usuários já começaram a analisar o peso da tarifa de R$ 1,90 no orçamento mensal de uma família. Neide Ferrari paga quatro tarifas diariamente. O aumento de R$ 0,25 significaria um gasto de R$ 1 a mais todos os dias. “Aumentaria o desconto que a empresa faz no meu contra-cheque”, reclama.

O segurança Maurício Rodakoski, 33 anos, também estava preocupado. Ele diz que a data-base da categoria está chegando e o reajuste do salário não deve passar de 7%. “As coisas estão cada vez mais difíceis. Tenho dois enteados, um filho e minha mulher espera outro”, comenta.

Até quem é de fora de Curitiba estava assustado com a tarifa. Ribas Mainardes mora no Rio de Janeiro e estava a trabalho ontem. Segundo ele, a passagem está custando por volta de R$ 1,50 na capital carioca. “No Rio as pessoas andam trajetos longos. Além do mais, estou aqui há um tempão e nada de ônibus aparecer”, compara.

Por enquanto, quem tem ouvido a reclamação dos usuários são os cobradores. “Eles passam e perguntam se a gente está satisfeito. Só que o nosso salário não deve subir muito”, aposta Leandro Lopes.

Rede Integrada de Transporte

Frota

– 2.100 ônibus

Passageiros pagantes:

1.130.000 / dia útil

Passageiros transportados:

2.400.000 / dia útil

Linhas

– 385

Terminais – 29

Estações Tubo

– 350

468.500 Km percorridos / dia útil

Vida média dos ônibus

– 4,2 anos

Composição Tarifária

– R$ 1,70

47% – custos pessoal

15% – custos capital (compra de ônibus, por exemplo)

24% – combustível

3% – Lubrificantes / pneus

11% – peças e acessórios

Composição Tarifária – R$ 1,90

Os estudos apresentam aumentos de (em relação aos percentuais anteriores):

10,21% – custo pessoal

24,86% – custo capital

2,11% – combustível

10,56 % – lubrificantes

14,81% – pneus

26,25% – peças e acessórios

Fonte: Urbs

Voltar ao topo