Pais cansados, filhos tiranos

“Fico perplexa como uma criança, ao notar que mesmo no amor tem-se que ter bom senso e senso de medida.”

Clarice Lispector

Já escrevi alhures que o jovem, para sentir segurança, para sentir-se amado, precisa, paradoxalmente, de disciplina. A criança e o adolescente têm sede de liberdade, mas ainda não sabem o que fazer com ela. Eles ficam testando a autoridade materna e paterna a todo o instante. E quem tem filhos sabe que impor limites a eles não é nada fácil. Haja fôlego e perseverança! Mais fácil é fazer todas as vontades das “princesinhas” e dos infantes “Luízes XIV”, que mais tarde vão sentir-se perdidos num microcosmo onde vão querer reinar, mas não terão súditos.

Sempre houve, no lar, dois tipos de educação, para opção dos pais. Uma austera e comprometida com a formação dos filhos. Outra permissiva, que não merece o nome de “educação”, responsável, em grande parte, por essas “pestezinhas”, esses pequenos tiranos, arrogantes e autoritários, que reinam por aí. Hoje em dia, pode-se perceber nitidamente que os casais têm tido cada vez menos filhos, mas a educação familiar vem-se tornando cada vez mais frouxa e desastradamente liberal. Que fenômeno é esse, que vem acontecendo em nossos dias?

Não vou aborrecê-los com estatísticas. Mesmo porque não as tenho. Mas algo vem chamando a atenção para o problema. Problema? Sim, senhores, um grave problema! As pessoas têm-se casado cada vez mais tarde, cada vez mais velhas. Numa idade em que, em tempos idos, já seriam avós. É bem por isso que já estão cansadas e sem disposição para educar os filhos, impor-lhes disciplina, dizer-lhes “não”. Eles não têm mais paciência para interromper a “manha” da criança, que chora por pirraça, por chantagem. São nocivamente tolerantes. Nem se lembram de que uma palmadinha na hora certa (com animus corrigendi) viria a calhar. Preferem ostentar o título de mãe e pai extremosos (?), com a frase: “Jamais encostei um dedo em filho meu!” Mas, também, minha senhora, olhe só no que deu! É certo que, atualmente, ficou mais difícil manter aquela austeridade de outrora, quando não tínhamos o apelo incessante dessa infinidade de invenções modernas, que constituem verdadeira tentação para crianças, adolescentes e adultos. Computador, telefone celular, shoppings, programas de televisão, shows, além de incontáveis objetos e espaços destinados ao entretenimento… Tudo conspira contra a autoridade paterna e materna. É um verdadeiro desafio conter os ímpetos consumistas do pirralho.

Como se não bastasse isso, esses genitores mais velhos e cansados são eternos ausentes do lar, pois tanto a mulher como o marido trabalham fora. Assim, a educação da criança é confiada à empregada ou, quando muito, à babá. Então, só resta aos pais tentar compensar, com presentes, o amor e a atenção que não puderam ou não foram capazes de dar aos filhos. Por um misto de incompreensão e rejeição, ou por mero comodismo, fazem concessões excessivas ao filho, fazendo-o sentir-se, por absurdo que possa parecer, abandonado por desamor.

Tenho pavor de crianças que chegam a minha casa, correndo e gritando, e vão pulando, de sapato e tudo, sobre o sofá. A mamãe delas, com doçura (e total falta de autoridade), apenas balbucia, distraída, um discurso antigo e ineficaz: “Não façam assim, crianças… Comportem-se…” Crianças que falam alto, que interrompem a conversa dos adultos… Crianças manhosas, tiranas, que choram e esperneiam até conseguir o que querem…

E não venha queixar-se, minha senhora, de que me falta tolerância com seus pimpolhos. Ora, ninguém gosta de crianças mal-educadas! A não ser, é claro, quem as deseducou, ou seja, os próprios pais, que se deleitam em aplaudir e incentivar certas façanhas infantis inoportunas…

Albino de Brito Freire

, da Academia Paranaense de Letras e juiz aposentado.

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