O direito de votar no TJSP está garantido pelo STF, desde que seja no número um da lista de antigüidade

Não obstante o Tribunal de Justiça de São Paulo, com Loman ou sem Loman, há mais de 15 anos, regular as eleições para as suas três mais altas funções diretivas, abrindo à concorrência eleitoral ao 25 desembargadores que integram o Órgão Especial do TJSP, o STF, vencidos os anos, resolve retomar o artigo 102 da Loman (restolho da ditadura), para, liminarmente, suspender as eleições em São Paulo, impondo que esta se realize com apenas os três candidatos mais antigos na carreira.

Talvez o que tenha assustado o STF, mais particularmente o ministro e juiz paulista de carreira, Antonio Cezar Peluso, tenha sido o fato de que antes havia coincidência entre os 25 desembargadores mais antigos e o número de integrantes do OE do TJSP, ou seja, até agora concorriam às eleições os 25 desembargadores mais antigos que, por sua vez, integravam automaticamente o dito Órgão Especial, mas como a metade do OE do TJSP atualmente é eleita, pela resolução paulista e ora suspensa pelo STF, poderiam concorrer às funções de direção todos os atuais integrantes do Órgão Especial, inclusive os 12 eleitos que não alcançam, nenhum deles, o 25.º lugar na lista de antigüidade.

A resolução paulista impugnada pelo PGR, portanto, permitia que desembargadores com menos de cinco (5) anos de Tribunal de Justiça (já eleitos para o OE), se inscrevessem como candidatos às funções de direção, de onde provavelmente resultou a reação do STF, tanto mais verdadeira quando o ilustre ministro Antonio Cezar Peluzo (14/12) sustentou, em sua manifestação oral no plenário do Excelso Pretório e segundo o site Conjur,que este abriu a divergência e foi voto condutor da maioria, defendeu a incompatibilidade das regras com a Loman e alertou para os perigos de, em nome da democracia, abrir as eleições, o que poderia trazer aos tribunais,na sua opinião, o conflito típico das arenas político-partidárias movidas por ?paixões? incompatíveis com a função de magistrado, concluindo que ?é preciso evitar que, pela porta do pluralismo, entre o sectarismo que leva adiscórdias e retaliações?, disse.

Já é, contudo, de se admirar e muito que os membros da Suprema Corte, com todo respeito, não tivessem levado em conta os artigos 93, XI, 96, I e 125, todos da Constituição Federal e incidissem no equívoco, até mesmo o d.relator ministro Lewandowski, ao dizer que o Projeto de Lei 144/92 que dava forma ao Estatuto da Magistratura parou no Congresso e que, diante disso, nada impedia que o Tribunal de Justiça de São Paulo preenchesse a?lacuna legislativa? adaptando o regimento interno. O ministro afirmou, ainda, que a limitação imposta pela Loman ?impede o pluralismo político e frustra o processo eletivo, transformado em mero procedimento homologatório? (Conjur- mesma data) sobre a existência de ?lacuna legislativa? na regulamentação das eleições nos Tribunais de Justiça estaduais.

O lamentável equívoco hermenêutico,mais vez com todo respeito, decorre da confusão entre a expressão Estatuto da Magistratura contida no artigo 93, caput, da CF, com Lei Orgânica da Magistratura, de 1977. São coisas distintas. Como já escrevi neste site, artigo 93, ?caput?, da CF, é claríssimo ao tratar da questão da feitura de uma Lei Complementar que criará o Estatuto da Magistratura estabelecendo direitos e deveres do juiz perante o Estado. Repito: o 93, da CF, fala em Estatuto da Magistratura e não em Lei Complementar Orgânica da Magistratura, coisa que só foi possível em 1979 quando o regime era de exceção. Até porque é impensável, em termos jurídicos administrativos, se falar em lei orgânica da magistratura pela simples e reta razão de que a magistratura não é órgão público. É inconstitucional regular num texto legislativo estatutário matéria de ordem formal orgânica!

Ora, eleições internas nos Tribunais de Justiça estaduais é matéria de regimento interno por força das normas constitucionais supra citadas, ou seja, eleição diz respeito ao órgão público TJ e não às pessoas individualizadas dos desembargadores.

O que temos de refletir é que o CNJ legisla, executa e faz cumprir as suas próprias decisões com sustentação num prosaico Regimento Interno!

De qualquer forma, não fosse por isso, o argumento ou fundamento do voto do ministro Antonio Cezar Peluso não deixa de ser muito triste porque o douto julgador trata os 357 desembargadores restantes do TJSP como homens sem nenhum senso de responsabilidade quanto à escolha de quem mereça ou deva assumir a alta função diretiva presidencial do TJSP. Trata-se de um voto, pois, com fundamentos puramente ideológicos (no sentido de algo que flutua estritamente no camporazão suficiente). E contra ideologia imposta não há muita coisa para ser feita.

De qualquer forma, no meu entender, o atual presidente do TJSP, Desembargador Celso Limongi, deve dar uma demonstração do que seja ser presidente do TJSP e de como os desembargadores que o integram sabem muito bem se portarem com altiva dignidade, ainda mais quando se trata de cumprimento de relevante decisão jurisdicional do STF, seja simplesmente cumprindo-a, seja examinando-a casuisticamente.

Por isso é impostergável a convocação do Tribunal Pleno para se pronunciar a respeito já que o tema diz respeito ao colégio eleitoral formado por 360 desembargadores estaduais. Esta não é uma decisão que se delega, sob pena de o próprio TJSP incidir na mesma espécie de autoritarismo ideológico, ou seja, de que nós, 345 desembargadores não integrantes do OE do TJSP, precisamos de tutores para as nossas ações.

Que não se alegue urgência, falta de tempo, representatividade do OE, etc., para não realizar a convocação do Tribunal Pleno. É dever ético e moral do presidente do TJSP e dos 12 desembargadores eleitos do OE do TJSP impor a convocação do Tribunal Pleno para decidir sobre a providência a ser tomada.

Augusto F. M. Ferraz de Arruda é desembargador do Tribunal de Justiça de São Paulo. www.justicacritica.com

Voltar ao topo