O direito de escolher

A Câmara Brasileira de Comércio Eletrônico está lançando no Brasil a Coalizão para a Livre Escolha de Software, coordenada internacionalmente pela Computing Technology Industry Association, uma organização que congrega 13 mil associados em 89 países, dedicando-se a fomentar o desenvolvimento das tecnologias da informação. A coalizão (www.softwarechoice.org) pretende “promover a discussão e alertar governantes, legisladores e formadores de opinião sobre a necessidade e conveniência de garantir a possibilidade de desenvolvimento de múltiplas plataformas de software, sem restrições impostas por políticas ou preferências governamentais”. A idéia é assegurar ao usuário o direito de livre escolha e à indústria, os princípios da isonomia e da neutralidade.

A iniciativa é mais do que oportuna. No Brasil, o poder público tem passado por cima da Constituição, adotando medidas que ferem o princípio da livre escolha e que privilegiam determinada empresa. Um exemplo clássico foi a licitação do MEC para a informatização das escolas públicas, em 1997, na gestão do ex-ministro Paulo Renato. Para começar, uma das exigências do edital era que o fornecedor oferecesse computadores padrão IBM-PC, o que exclui outras plataformas, como o Macintosh, da Apple, que roda o sistema Mac OS. Só isso já provocou a justificada ira da minoritária, porém convicta, comunidade de usuários Mac no País. Como se não bastasse, o software a ser rodado nesses PCs já estava previamente definido: sistema Windows e pacote de aplicativos Office, da Microsoft, outra irregularidade, já que existem sistemas alternativos que também rodam em PC, como o Linux, que é gratuito. É uma reserva de mercado que só beneficia a empresa de Bill Gates.

No Brasil, o virtual monopólio do padrão “Wintel” (de Windows + Intel, principal fabricante de chips CPU para PC) é uma das mais nocivas conseqüências da famigerada reserva de mercado da informática para fabricantes nacionais, que vigorou entre os governos Geisel e Sarney. Foi essa legislação que abortou o primeiro clone de Mac do mundo. Em 1986, uma empresa brasileira chamada Unitron, usando técnicas de engenharia reversa, criou um computador Mac-compatível, o Unitron Mac-512. O processador era o mesmo Motorola 68000 dos primeiros Macs. O Mac OS, que na época se chamava simplesmente System, foi traduzido para o português. A Unitron bem que tentou obter o licenciamento, mas a Apple disse que só o concederia se fosse sócia majoritária do projeto ? o que era proibido pela lei, por isso a idéia não vingou. Até 1992, o contrabando era praticamente a única forma de trazer um Mac ao País. É por isso que, no Brasil, até hoje a participação da Apple é menor, e a da Microsoft é maior, que a média mundial.

Garantir a liberdade de escolha do consumidor e a competição com igualdade de condições entre os fabricantes de hardware e software é a melhor maneira de remover definitivamente toda a nefasta herança de uma lei criada durante o regime militar.

Ari Silveira

(ari@pron.com.br) é chefe de Reportagem em O Estado

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