Cedo demais para deixar de ser criança

Nem ainda um adulto e nem mais uma criança. Esta descrição revela a dúvida que é a adolescência. Nesta fase, um período de transição, o adolescente busca identificar-se e inserir-se no mundo. É neste momento, portanto, que os questionamentos se intensificam, assim como a ansiedade de enfrentar as novidades da vida adulta que se aproxima. Adolescer é um fenômeno ?biopsicossocial?. É uma etapa delicada de transformações, que não se resume em apenas passar pela puberdade, quando a voz do menino muda, surgem as espinhas, a menstruação da menina chega e o corpo começa a se desenvolver.

A adolescência como se tem hoje, explica a psicóloga Nancy Greca Carneiro, professora da Pontifícia Universidade Católica do Paraná (PUC-PR), no século passado não existia. Esse fenômeno, segundo ela, nasceu e é caracterizado historicamente. ?O período entre o deixar de ser criança e assumir responsabilidades de um adulto naquela época era muito curto e rápido. Sempre existiu, mas costumava ter acontecimentos e marcos muito precisos. Era um conjunto de rituais – a menstruação, o debutar, entre outros -, muito ligado ao fenômeno biológico da puberdade, tanto em sociedades orientais quanto ocidentais. Era objeto da antropologia?, cita a psicóloga.

No entanto, segundo ela, verifica-se um fenômeno muito interessante da chamada fase da adolescência, que costumava ser limitada entre os 13 e 18 anos. ?O que vemos atualmente é uma expansão da adolescência, que não pode mais ser vista como uma passagem. Hoje há uma antecipação exagerada da adolescência, ou seja, muito cedo perde-se a infância e as crianças começam a assumir comportamentos, hábitos e outras insígnias dessa nova fase – até a entrada precoce no mundo do namoro e do sexo, talvez pelo apelo da televisão e do mundo do consumo?, afirma Nancy.

Só que o inverso também é verdadeiro. ?Hoje também encontramos pessoas com mais de 25 anos com características de adolescentes. Temos inclusive o termo adultescente, considerando aspectos econômicos, ou seja, de um adulto que não trabalha, só está estudando, mora e é sustentado pelos pais; e aspectos sociais como o do casamento, que acontece bem mais tarde, e também o apelo da mídia, que incita o adulto a se adolescentizar pelas roupas, pela ânsia em manter a beleza?, aponta a professora da PUC.

No entanto, de acordo com Nancy, alguns fenômenos seguem sendo importantes e acontecendo universalmente. ?O adolescente ainda se define por três aspectos: o encontro com o sexo e como administrar isso; as mudanças corporais e como se relacionar com o corpo nessa fase; e também pela nova relação que se estabelece com os pais, a pátria e as responsabilidades?, indica. Segundo ela, a adolescência é o termômetro da sociedade e quem vai assumir o destino da vida social vivida agora e, por isso, é uma fase que merece atenção e cuidado. ?O que acontece em nossa cultura hoje, em geral, é que é narcisista, imediatista, o que acaba produzindo adolescentes sem muitos ideais, perdidos na sociedade de consumo, que se dividem em muitas tribos?, diz Nancy.

Comportamento

A psicóloga Maria Augusta Guimarães tem contato direto com esse público. Ela coordena o núcleo de adolescentes da ONG curitibana Serpiá, um espaço de expressão, atividades e atendimento psicológico a essa faixa etária. Ela diz que algo universal nos adolescentes é a contestação e a rebeldia, que hoje aparece na moda, no pintar os cabelos, nos piercings e nas tatuagens – que aparecem mais cedo. ?É uma revolta contra o mundo infantil e adulto também, uma afronta. Não conseguindo se inserir em nenhuma das fases, surgem as confusões e, muitas vezes, se exteriorizam na aparência ou ainda pelo humor variante?, exemplifica.

Segundo Maria Augusta, a adolescência é uma fase que traz muitas inseguranças, tanto psicológicas quanto fisiológicas e biológicas. É portanto, a fase do conflito.     ?Continua existindo o adolescente revoltado. É necessário passar por essa fase de contestação, para que tenha mais certezas no futuro. O que a gente vê, nessa etapa, é que eles mudam muito rápido de tribos, na busca de uma identidade e de um referencial. A menina que era patricinha vira skatista e ainda hippie ou intelectual?, comenta a psicóloga.

No dia-a-dia do trabalho com os adolescentes, Maria Augusta sabe bem sobre o que eles conversam hoje. ?Falam muito sobre as dificuldades com os pais, sobre os relacionamentos afetivos. Também têm dúvidas sobre casamento, profissão e dizem buscar um ideal de felicidade. As dúvidas são muitas?, conclui.

Ser pai de adolescente não é uma tarefa fácil

Rosângela dos Reis Rauch é mãe de uma adolescente de 15 anos. Ela diz que não é uma tarefa muito fácil e exige muita paciência, tolerância e união. ?Por um lado é bom, pois a conversa é mais franca e direta. Por outro, você tem que ter mais argumentos para convencer e os conflitos são diários?, diz. Assim como os adolescentes, também os pais têm suas dúvidas. ?Não sei se as dificuldades somos nós que fazemos, por falta de paciência e clareza. Mas o mundo está muito conturbado e vendo a tevê ou outras experiências acabamos desconfiando de nossos filhos, o que faz a gente passar um papelão e procurar um conflito que, algumas vezes, não existe. Acho que é a preocupação constante de mãe em preparar a filha para as responsabilidades. Também tenho alguns tabus, que preciso vencer, sobre certas conversas necessárias nessa idade. Enfim, é uma batalha diária?, resume Rosângela.

Já Marden Machado tem três filhos, um de 16, outro de 18 e uma de 19. Ele diz que os conflitos que aparecem em casa são mais de ordem administrativa, por conta do comportamento completamente diferente de cada um. Porém, ele diz que é tranqüilo. ?Não sei se é porque eu e minha esposa casamos muito jovens e procuramos sempre ser amigos, saímos juntos, vamos a show, cinema, livaria. Creio que depende muito dos pais. Muitos dos conflitos e rebeldias que sabemos que existem nesta fase nunca tivemos que enfrentar. As coisas aqui sempre foram sem estresse?, comenta.

?A entrada na adolescência marca o processo de distanciamento dos pais da infância. Nesta fase, a visão que se tem dos pais depende muito das particularidades de cada adolescente. Nem todos vivem isso de forma rebelde?, observa a psicóloga Shirley Rialto Cesarino. Segundo ela, é durante a adolescência que vive-se a degradação do saber dos pais e os questionamentos. ?É a queda dos pais como mito. É a morte dos pais idealizados, mas os conflitos são normais. Se isso não é vivido é de se estranhar?, opina.

A dificuldade dos pais também é comum. ?Os pais vivem como se estivessem se tornando obsoletos. Ao invés de perguntar para as mães, por exemplo, os adolescentes perguntam aos amigos, como se não precisassem dos pais. É necessário que os pais saibam superar isso, sem significar que estejam abandonando o filho e não se preocupando com ele. A questão é como lidar com esse conflito?, ressalta Shirley. (NF)

Vale quase tudo para estar de bem com o espelho

Rogério Scheibe: ansiedade.

As adolescentes, muitas vezes belas, ainda buscam o ideal de beleza e, para estarem de bem com elas, com o espelho e, principalmente com as outras adolescentes, buscam diversos recursos.

Na clínica de cirurgia plástica, desde cedo, lá estão elas. ?A jovem, desde cedo informada sobre o que pode obter e não satisfeita com a aparência, vai atrás disso. As meninas, já a partir dos 13, 14 anos querem fazer prótese de mama, lipoaspiração e o nariz. Tem procura e bastante. Aí que entra a seriedade do profissional e só fazer se há segurança e certeza científica, ou seja, se necessário. Acredito que esse exagero acontece porque a idéia de estética dela e da população não é real. Também porque nessa fase existe a ansiedade em ser adulta e uma bela mulher?, explica o cirurgião Rogério Augusto Scheibe.

No salão de beleza, a busca pelo ?mulherão? precoce continua. ?Esta fase é a fase da loucura pelo cabelo lisinho. 90% das adolescentes o querem e, para isso, fazem de tudo e ficam até mais de três horas no salão. Começa com um relaxamento, escova definitiva, escova temporária e algumas ainda procuram métodos que utilizam químicos?, conta a cabeleireira Duda Ongaro. Na sala de estética também há exageros. ?Com doze anos, já começam. Elas acham que têm muita barriga, querem melhorar as pernas e ficar impecáveis. Com 13, 14, 15 anos elas querem reduzir as medidas, procuram a drenagem linfática. Muitas já perguntam sobre a maquiagem definitiva, tiram as sobrancelhas já aos 13 anos, e até para alongamento dos cílios tive uma cliente com essa idade?, conta a esteticista Fabíola Ceppa.

A psicóloga Maria Augusta Guimarães lembra que a preocupação exagerada com a beleza, a forma e os parâmetros da moda hoje são preocupantes nessa faixa etária. Precocemente as adolescentes procuram meios de estarem ?perfeitas?. ?É preciso atentar-se para esta fase, pois os adolescentes ficam sujeitos às propostas da mídia e da sociedade de hoje?, destaca. (NF)

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