Aumenta inserção de portadores de Down

Ficar dentro de casa. Escondido com a família. Excluído socialmente e emocionalmente. Esta não é mais a vida de um portador de síndrome de Down. Aos poucos, está desaparecendo a vergonha de sair na rua e mostrar o filho com a síndrome. Apesar de ainda existir muitas barreiras, cada vez mais as pessoas com esta alteração genética estão inseridas na sociedade. Estudam (inclusive com alunos do ensino regular) e trabalham. Tudo bem que podem demorar um pouco mais no aprendizado. Mas, dando a oportunidade e o ambiente correto para o desenvolvimento, elas podem tudo.  

Felipe Cardoso da Silva tem 20 anos. É um adulto ativo. Estuda e está se preparando para entrar no mercado de trabalho. Pode parecer um pouco tímido no começo, mas quem convive com ele diariamente diz que Felipe é uma pessoa cativante e muito falante também. Vota nas eleições, mesmo com os mesários informando que ele não precisa. Fazendo esta descrição, não dá para imaginar que Felipe é portador de síndrome de Down. Mas não parece porque foram dadas a ele todas as condições para que se desenvolvesse da melhor forma.

A mãe dele, Simonete Cardoso da Silva, conta que Felipe foi para a escola especial ainda bebê. Ficou neste tipo de ensino até os 18 anos e, desde então, está sendo preparado para entrar no mercado de trabalho. Ele participa de aulas na escola da Fundação Ecumênica de Proteção ao Excepcional (Fepe). Começou com a reciclagem de papel e está atualmente na cartonagem. Já teve a oportunidade de uma vaga – para office-boy -, mas a família, a escola e Felipe acharam que era melhor se preparar um pouco mais.

Para Felipe casar, primeiro terá que trabalhar, diz Simonete.

Mesmo com um pouco de timidez, Felipe diz que gosta de ir para a escola. Ele também tem um sonho: ser cantor e ator. Ele adora as artes e já faz parte de um coral. Quando há um palco e uma festa, ele logo vira a atração. Felipe chegou no estágio onde está graças ao aprendizado que ele teve fora e dentro da sua família. ?Felipe é a nossa riqueza. É quem deixa a gente mais alegre?, fala Simonete. Felipe pensa até em se casar. Tem uma namorada. Mas a mãe dele deixa muito claro: o trabalho vem primeiro. Depois se pensa em casamento.

José Luiz Brune, de 35 anos, é o exemplo de uma pessoa portadora de síndrome de Down que está ativa no mercado de trabalho. Ele é empacotador da loja Água Verde do supermercado Festval desde 2001. Antes, havia trabalhado em outro supermercado do mesmo grupo. ?Gosto muito de trabalhar aqui. Quando chego, vou direto para o caixa. Faço pacotes e também ajudo na entrega?, conta Brune. A jornada de trabalho dele é das 11h às 20h, com duas horas de intervalo.

A gerente do supermercado, Elisete Belo, explica que 15% do quadro de funcionários da empresa é composto por pessoas especiais, entre elas portadoras de síndrome de Down. Os funcionários especiais não são identificados de tal forma. Fazem parte do quadro de colaboradores e pronto. ?Esta é uma oportunidade de incluir os especiais na sociedade por meio do trabalho?, enfatiza.

Elisete diz que o desempenho de Brune no trabalho é satisfatório e igual ao de muitos funcionários ?não especiais?. ?Brune é muito pontual e responsável. Estamos bem contentes com o trabalho dele?, garante.

Cota para deficientes trouxe avanço, mas nem todas as empresas cumprem

Foto: Arquivo/O Estado

Depois de preparado, o aluno é encaminhado para um estágio.

As escolas que fazem a preparação profissional de pessoas especiais estão com muita demanda por parte das empresas, desde que foi regulamentada a legislação de cotas de deficientes físicos nas instituições. É obrigatória a inserção de funcionários especiais conforme a quantidade de colaboradores da empresa. Houve muito avanço com esta lei, segundo Neuza Soares de Sá, coordenadora estadual da área de educação profissional das Apaes (Associação de Pais e Amigos dos Excepcionais) do Estado do Paraná. ?Mas ainda precisaria de uma lei para cumprir a lei, apesar do avanço que já tivemos?, explica.

Os portadores da síndrome de Down e as outras pessoas especiais passam pela capacitação profissional em escolas especializadas. O jovem é sondado e aprende sobre os pré-requisitos para o trabalho, como atenção, pontualidade e tolerância. Depois disso é que vem a capacitação propriamente dita. Quando o aluno está preparado, é encaminhado para um estágio e para um emprego.

Mas a profissionalização não pode ser feita de qualquer forma. Neuza defende o estudo da demanda de mercado para instituir um curso de capacitação. Ela cita o exemplo de Apucarana, região norte do Estado, conhecida como capital do boné. A cidade possui muitas confecções focadas neste produto. Assim, a Apae do município passou a oferecer um curso de costura industrial. É uma oportunidade para entrar mais fácil no mercado de trabalho.

Neuza ainda lembra que a família e a escola precisam ficar atentas às habilidades do portador de síndrome de Down. ?Ele pode se sobressair em outras áreas, como esportes e artes. É preciso descobrir onde há condições para ele se destacar. E, a partir disso, criar e dar a oportunidade e todas as condições?, avalia.

Escola

Os portadores de síndrome de Down podem estudar no ensino regular. Existe legislação que garante este direito, mas muitas escolas ainda não recebem as crianças excepcionais alegando dificuldades de adaptação e falta de professores especializados. ?Não adianta apenas colocar a criança dentro da sala de aula. Dentro de uma sala, vão estar 30 alunos ?normais? e um com um pouco mais de dificuldade. Você tem que dar condições para ele se incluir e se integrar. Muitas vezes, a cria-nça especial está incluída, mas não integrada. A inclusão é bem-vinda, está acontecendo e não tem mais volta. Mas é preciso fazê-la com responsabilidade?, alerta Neuza. Ela acredita que o Paraná está avançando neste sentido, tanto na rede de ensino público quanto na particular.

A escolha de qual escola a criança e o adolescente com síndrome de Down vão freqüentar é da família. Muitas crianças acabam estudando no ensino regular e fazem, no contraturno, atividades como fisioterapia e fonoaudiologia em instituições especializadas. ?Há casos de que não houve uma evolução na criança no ensino regular e os pais acabaram procurando a escola especial?, comenta Neuza.

O importante é que os portadores de síndrome de Down se sintam integrados na sociedade. Porque nada adianta apenas dizer que eles estão. Se não se sentem assim, acabam se sentindo isolados. Mas existem casos muito bem-sucedidos, como os de Felipe (ainda com um futuro promissor pela frente) e Brune.

Voltar ao topo