Ministério vai investigar falta de remédios e mortes em hospital do Rio

O Ministério Público Federal vai investigar as denúncias de irregularidades que estão prejudicando o atendimento no Hospital Universitário Gaffrée e Guinle, na Tijuca, zona norte do Rio. Referência para o tratamento de soropositivos e com especialistas em mais de 20 áreas médicas, a unidade passa por uma crise de desabastecimento que já teria causado até a morte de cinco pessoas.

Diante da falta de medicamentos, aparelhos e material básico, como ataduras, o serviço especializado em HIV/Aids corre o risco de rejeitar novos pacientes. "A situação é calamitosa. Recebemos, diariamente, pessoas em estado muito grave. Porém, sofremos com uma falta generalizada: não existem antibióticos, analgésicos, antiinflamatórios. Há mais de um mês não fazemos um hemograma. Também não há como fazer o teste para comprovar se o paciente tem HIV. Falta sensibilidade, compromisso e também um pouco de vergonha das autoridades da saúde", desabafou hoje o chefe do Serviço de Atendimento Especializado em Pacientes com HIV/Aids, Carlos Alberto Morais de Sá, após sair do Ministério Público Federal, onde deixou documentos que comprovariam as irregularidades.

Ele contou que a unidade, vinculada à Universidade Federal do Estado do Rio de Janeiro (Uni-Rio), sofre de um problema crônico, iniciado há cerca de dois anos, após a mudança da nova reitora da instituição universitária ter trocado toda a direção do hospital e agravou-se ainda mais no fim do ano passado. "Apresentamos documentação detalhando tudo", afirmou Morais de Sá, ressaltando que a crise vai além da área destinada aos soropositivos. De acordo com ele, existem atualmente 1.900 pacientes em tratamento, sendo 400 crianças.

A reportagem não conseguiu contato com a direção da Uni-Rio. O MP disse que só vai se pronunciar sobre o caso após ouvir os responsáveis pela instituição. Ao detalhar a situação de pessoas atendidas no ambulatório que chefia, Sá afirma que elas estão sofrendo danos irreversíveis por causa da falta de medicamentos. Cita o caso de um paciente soropositivo que já perdeu a visão de um olho em decorrência da inexistência do produto para solucionar o problema. "As pessoas precisam de antibióticos para combater a cegueira. Uma ficou cega. Outras estão com perfuração no estômago, outras faleceram. Não se compra remédio faz tempo. Há pessoas com danos irreversíveis".

O Ministério da Saúde afirmou, por meio de sua assessoria de imprensa, que o repasse de recursos para a unidade está em dia. Informou que, em outubro do ano passado, o Gaffrée e Guinle passou a receber um adicional de R$ 1,1 milhão ao ser incluído no Programa de Reestruturação dos Hospitais de Ensino, totalizando, em 2005, R$ 7,8 milhões. A verba para compra de medicamentos é enviada ao órgão responsável pela Gestão Plena do Sistema Único de Saúde (SUS), que se encarrega da compra e envio do material. No caso do Rio, a gestão passou das mãos da Prefeitura para o Estado, após o governo federal decretar estado de calamidade pública na rede hospitalar do município, há mais de um ano.

A Secretaria Estadual de Saúde admitiu a falta de metade da lista de 27 medicamentos apresentada pelos médicos do Gaffrée Por meio da assessoria, explicou estar enfrentando dificuldades com os laboratórios, como o não comparecimento de empresas ganhadoras de licitações. Jorge Darze, presidente do Sindicato dos Médicos do Rio de Janeiro, ressaltou que todas as áreas do Gaffrée e Guinle estão prejudicadas. Não só o atendimento, como também os setores de pesquisa e formação de recursos humanos. "Trata-se de um hospital universitário, com responsabilidade de fazer atendimento de alta complexidade, de formar mão-de-obra, de pesquisas".

Segundo ele, os médicos estão numa situação delicada, pois, caso neguem atendimento, podem ser responsabilizados por omissão de socorro. E se o fizerem na atual situação, podem colocar a vida do paciente em risco.

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