Honorários advocatícios na Justiça do Trabalho

1. A Constituição e o CPC

Apesar do dissenso surgido a partir da Constituição Federal de 1988, em face de seu art. 133 (“O advogado é indispensável à administração da Justiça…”), a jurisprudência acabou se cristalizando no sentido da permanência do jus postulandi em relação à parte na Justiça do Trabalho, assegurado pelo artigo 791 consolidado (Súmulas 219 e 329 do C. TST).

Entendeu-se que o referido dispositivo constitucional prescreve princípio genérico, com expressa autorização de ser excepcionado pela lei, como o é na Justiça do Trabalho.

2. Requisitos para a concessão de honorários advocatícios na Justiça do Trabalho

Superada a inaplicabilidade supletiva do Código de Processo Civil e do artigo 133 da Constituição Federal, entendendo-se não revogado o jus postulandi das partes na Justiça do Trabalho, duas correntes se formaram para ditar os re-quisitos à concessão de honorários advocatícios.

2.1. Corrente restritiva (majoritária)

Com arrimo no artigo 14 da Lei n.º 5.584/70 (“Na Justiça do Trabalho, assistência judiciária a que se refere a Lei 1060, de 5 de fevereiro de 1950, será prestada pelo sindicato da categoria profissional a que pertencer o trabalhador”) e na Súmula n.º 219 do C. TST, uma parte da doutrina e da jurisprudência defendeu que, percebendo o empregado menos de dois salários mínimos, ou declarando sua insuficiência econômica para demandar em juízo, e estando assistido por sua entidade sindical, estariam atendidas as regras específicas relativas à concessão da verba honorária.

2.2. Corrente ampliativa (minoritária)

Já outra corrente de pensamento firmou-se no sentido de que os honorários no processo do trabalho não eram devidos apenas com base na Lei n.º 5.584/70, mas igualmente consoante a Lei n.º 1.060/50. Pelo que, se o trabalhador não tinha acesso a assistência de sindicato, ou essa assistência não lhe convinha, podia valer-se de advogado de sua escolha ou indicado pelo juiz.

Defendeu que, percebendo menos de dois salários mínimos ou declarando, o trabalhador ou quem o representa, mesmo de forma sintética, sua dificuldade econômica para demandar, sem que tal afirmação fosse desconstituída, conforme autorização da Lei n.º 7.510/86, que alterou a de n.º 1.060/50, eram devidos honorários advocatícios, no limite de 15% sobre o montante da condenação.

O interessante é que essa posição também veio embasada na mesma Súmula n.º 219 do C. TST, conforme arresto que segue:

“Honorários Advocatícios. Assistência Judiciária Gratuita. A decisão regional está em perfeita consonância com o teor do Enunciado n.º 219 da Súmula deste Tribunal, ao impor condenação em honorários advocatícios com base na existência de comprovação de insuficiência econômica do Reclamante. Note-se serem duas as condicionantes do referido Enunciado para assegurar a verba honorária, bastando o implemento de uma delas para fazer jus à percepção do benefício. Recurso não conhecido” (TST-RR-215604/95.7. Rel. Min. José Luciano de Castilho Pereira. DJ 16.05.97).

3. Nova realidade: Leis n.º 10.288/01 e 10.537/02

Em 21.09.01 foi publicada a Lei n.º 10.288, de 20 de setembro de 2001. Ela introduziu o § 10 no art. 789 da CLT, com a seguinte redação: “O sindicato da categoria profissional prestará assistência judiciária gratuita ao trabalhador desempregado ou que perceber salário inferior a cinco salários mínimos ou que declare, sob responsabilidade, não possuir, em razão dos encargos próprios e familiares, condições econômicas de prover à demanda”.

Tendo regulado integralmente a matéria sobre a assistência judiciária, chegando, mesmo, a alterar o limite de dois para cinco salários mínimos, essa lei, tacitamente, derrogou o art. 14, caput e § 1º da Lei n.º 5.584/70.

Ainda sem ter sido devidamente interpretada essa norma, na seqüência, já foi revogada, porquanto a Lei n.º 10.537/02, em seu art. 2.º, afirma que o art. 789 da CLT passa a ter nova redação, não incluindo, portanto, o mencionado dispositivo.

Assim, o § 10 (parágrafo dez) introduzido no art. 789 da CLT, pela Lei n.º 10.288, de 20 de setembro de 2001, ao completar um ano de vida, sem maior aplicabilidade, considera-se excluído do mundo jurídico, ante a revogação tácita efetuada pela Lei n.º 10.537/02.

O professor Sérgio Pinto Martins também pensa assim, expressando-se no sentido de que o § 3º do art. 789 revogou os antigos §§ 9 10 (MARTINS, Sérgio Pinto. Custas e emolumentos processuais e as alterações dos arts. 789 e 790 da CLT. Palestra proferida no II Ciclo de Estudos em Direito Processual do Trabalho. Curitiba: Internet-lex, 21.11.02).

Igualmente, Francisco Ferreira Jorge Neto e Jouberto de Quadros Pessoa Cavalcante (Com a Lei n.º 10.288/01 e a Lei n.º 10.537/02 como fica a concessão da assistência judiciária no processo trabalhista e a atuação da entidade sindical. Revista Bonijuris. Ano XV. N.º 471. Fev/03. Curitiba. p. 07-08).

De conseqüência, outra conclusão não resta: suprimida a sistemática legal da assistência judiciária pela entidade sindical profissional, não subsiste o monopólio dos sindicatos profissionais quanto à assistência judiciária, possibilitando, assim, o pagamento de honorários advocatícios ao beneficiário da justiça gratuita.

Juntada aos autos declaração de insuficiência econômica, de acordo com as Leis n.º 7.115/83 e 7.510/86, e existindo sucumbência do empregador, este estará sujeito ao pagamento de honorários a qualquer advogado que esteja prestando a assistência judiciária.

Cabe lembrar, no entanto, que os honorários a serem repassados ao patrono do empregado, em caso de assistência judiciária, são apenas os que desta decorrem. Este fato independe de declaração; antes, tem nascedouro na própria concessão do benefício. Do contrário, sujeitar-se-á o profissional a processo disciplinar junto à OAB:

“A cobrança de honorários advocatícios de clientes beneficiários da justiça gratuita se apresenta como conduta manifestamente incompatível com o exercício da advocacia, com a configuração da infração disciplinar prevista no art. 103, inciso XIV, da Lei 4.215/63. A Lei Material aplicável é a vigente à época do feito. (…) (Proc. 2.133/2000/SCA-SP, Rel. Luiz Filipe Ribeiro Coelho (DF). Ementa 057/2000/SCA, julgamento em 12.06.00, por unanimidade. DJ 03.07.00. p. 59).

4. O Novo Código Civil

De acordo com secular princípio (pacta sunt servanda), os contratos realizam-se para obedecerem-se, em princípio. O não-cumprimento acarreta, em conseqüência, a responsabilidade por perdas e danos. É o que preceitua o art. 389 do Novo Código Civil: “Não cumprida a obrigação, responde o devedor por perdas e danos, mais juros e atualização monetária segundo índices oficiais regularmente estabelecidos, e honorários de advogado”. A novidade encontra-se na possibilidade de automática atualização monetária do débito e do pagamento de honorários advocatícios para que o ressarcimento seja integral. Inadimplente o empregador, o trabalhador poderá exigir as perdas e danos (que normalmente estão tarifadas nas regras legais), mais atualização monetária e juros, além dos honorários de advogado, para que a reparação seja integral. Os arts. 395 e 404 do NCCB (Lei n.º 10.406/02, de 10.01.02, que passou a viger em 11.01.03) seguem o mesmo caminho, esclarecendo a mora e as perdas e danos. O Estatuto da Advocacia e da OAB (Lei n.º 8.906/94) estabelece que “a execução dos honorários pode ser promovida nos mesmos autos da ação em que tenha atuado o advogado, se assim lhe convier” (§ 1º do art. 24).

Após as Leis n.ºs. 10.288/01 e 10.537/02, portanto, tornam-se compatíveis com o processo do trabalho os arts. 389, 395 e 404 do Novo Código Civil no que diz respeito aos honorários advocatícios.

Luiz Eduardo Gunther

é juiz no Tribunal Regional do Trabalho da 9.ª Região. Cristina Maria Navarro Zornig é assessora no Tribunal Regional do Trabalho da 9.ª Região

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