Falta de professores prejudica alfabetização de jovens e adultos

Muito se fala na importância da Educação de Jovens e Adultos (EJA), antigo supletivo, para garantir que os recém-alfabetizados não voltem a ser analfabetos Mas pouco se investe nela.

A EJA de qualidade pede professores capacitados especificamente para ensinar adultos – cidadãos que já fracassaram no sistema escolar, com histórias de vida, conhecimentos próprios e que têm pressa para aprender. O País só tem 14 instituições de ensino superior com cursos que ensinem a atuar em EJA; no Nordeste, onde estão as maiores taxas de analfabetismo, são apenas quatro.

Políticas públicas isoladas em alguns municípios capacitam esses profissionais. O Ministério da Educação (MEC) começou só recentemente com programas tímidos. Este mês, a maior ONG alfabetizadora do País, a Alfabetização Solidária, percebeu que era preciso investir em EJA e está formando professores em parcerias com universidades.

"É difícil melhorar a educação das crianças se seus pais e irmãos são analfabetos ou analfabetos funcionais", diz a superintendente executiva da Alfabetização Solidária, Regina Esteves.

A EJA compreende os ensinos fundamental (1ª a 8ª séries) e médio mas cursados em menos tempo. Em geral, o ensino fundamental é feito em três anos. O Brasil tem 4.619.409 de alunos de EJA. Só 3.397 dos 5.560 municípios a oferecem. Pesquisas mostram que não adianta um programa para baixar os índices de analfabetismo, hoje em 13%, se os alunos não continuarem seus estudos.

São 301.995 professores de EJA; 37% deles formados apenas em ensino médio. "A formação do professor tem de ser como a do médico ou a do engenheiro, tamanha é a complexidade do trabalho com o ser humano", diz a coordenadora do núcleo de estudos de Jovens e Adultos da Universidade de São Paulo (USP), Stela Piconez. A Lei de Diretrizes e Bases da Educação (LDB), de 1996, pede que todos os professores do País estejam formados em nível superior até 2007.

Mas o Brasil tem ainda professores que sequer terminaram o ensino fundamental; são 282 entre os que trabalham em EJA. Outros 1.947 não chegaram a começar o ensino médio. Três das dez cidades com os maiores índices de analfabetismo do País não têm um professor com ensino superior – Jordão (AC), Guaribas (PI) e Fernando Falcão (MA).

Auto-Estima

O novo programa da Alfabetização Solidária oferece um ano de curso aos professores de EJA de algumas cidades, parte feito numa universidade parceira, parte no próprio local de trabalho. As primeiras turmas começaram no mês passado. O custo de cada professor capacitado é de R$ 157 por mês, que será bancado por empresas. "Não se pode imaginar que o aluno não sabe nada. É preciso ensinar a partir dos seus conhecimentos já adquiridos", explica Regina.

A professora de EJA e aluna do curso da Alfabetização Solidária Janice Nascimento de Melo, de 33 anos, diz que uma das suas estratégias é ouvir as histórias que seus estudantes têm a contar. Ela dá aulas há quatro anos na EJA de São Bento do Una, no interior de Pernambuco.

"Trabalho a auto-estima, faço com que eles confiem em mim. O adulto precisa ser cativado", completa. Sua colega Maria Jussara de Macedo, de 27 anos, conta que aprendeu a inserir a disciplina de filosofia nas aulas. Até então, o foco era em português e matemática.

Para o secretário de Alfabetização, Inclusão e Diversidade do MEC, Ricardo Henriques, o professor bem preparado é peça fundamental para combater o maior problema da EJA: a evasão. "Se ele não tem a técnica, o aluno vai embora." Apesar dos avanços na área durante o governo atual – todos os municípios que oferecem EJA hoje recebem verba do MEC, o que não ocorria até 2005 -, ainda faltam políticas públicas voltadas ao professor.

Uma das primeiras tentativas do MEC deve começar em maio com a capacitação de professores para trabalhar em EJA no campo. O projeto chamado Saberes da Terra oferecerá ensino fundamental aliado a uma formação profissionalizante para 5 mil alunos. O currículo terá, além das disciplinas convencionais, qualificações para agricultura familiar, pesca, extrativismo e artesanato.

O MEC também entregará dentro de dois meses um conjunto com cinco livros didáticos específicos para os professores que atuam em EJA em todos os municípios do País. Eles falam sobre as características dos alunos desse nível de ensino, as avaliações e sobre como ocorre o processo de aprendizagem.

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