Encontros e desencontros

Entrei no ônibus. Estava lotado. Duas passageiras levantaram-se rapidamente e cederam-me lugar. Sentei e logo escutei duas mulheres conversando no banco de trás. Não consegui lembrar se era em polaco ou russo que elas falavam, mas elas usavam muitas palavras em um português bem claro no meio da conversa:

?Claro!?. ?E você, vai??…

Neste exato momento cruzávamos a Rua João Negrão… Não tive dúvidas: me virei, perguntei e tive a confirmação: era em polaco. A Rua João Negrão foi palco das minhas brincadeiras com outras crianças, nos anos trinta… Éramos todas ou quase todas imigrantes ou filhas de imigrantes, e ouvíamos conversas em muitas línguas diferentes.

Desci logo adiante e as lembranças me acompanharam o resto da caminhada.

Lembrei dos ciganos que acampavam distante da cidade e vinham até o centro para vender tachos de cobre… Diziam que eles roubavam crianças… Mulheres carregando grandes trouxas de roupa para lavar, equilibradas na cabeça. Caminhavam quilômetros, até suas casas, onde tiravam água do poço para lavá-las. Bem esfregadas eram estiradas no gramado para apanhar sol e só depois lavadas e estendidas no varal para secar. A roupa ficava cheirosa. Lembrei também da minha mãe falando e misturando palavras em português, espanhol e idish. Não só ela, mas muitos dos recém-emigrados…

Eu brincava até o anoitecer e, às vezes, deitava praticamente sem jantar, pois nem sempre havia o que comer, e então, minha mãe cozinhava um ovo ou fazia uma ?sopa? de arroz ou macarrão com leite e eu ia dormir feliz da vida… Hoje dizem que: ?Ovo pela manhã é ouro, de tarde é prata e de noite mata…?

Também lembrei dos carroceiros que faziam ponto bem no começo da Rua Riachuelo, depois vieram os caminhoneiros. Também por ali, uma agência de viagem para São Paulo e Rio ( creio que era a Penha) tinha seu escritório e ponto de embarque e desembarque. Durante um tempo, os ônibus que trafegam pelo centro, faziam ponto de embarque e desembarque ali.

As horas passaram, subi em um ônibus para voltar para casa, ao descer no ?meu? ponto percebi que aquele guri com seu indefectível boné e jaqueta estava a poucos metros de distância, caminhando lépido. Pensei em apressar o passo para dizer-lhe um ?olá?, mas, logo em seguida lembrei que ele deveria ter um compromisso àquela hora, então ?fiquei na minha?, como dizem hoje, apenas desejei, de coração, uma boa-tarde pro meu amigo Dalton. Com a cabeça repleta de lembranças, segui para casa.

Margarita Wasserman – (Membro do Instituto H. e G. do Paraná)

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