Eles não são deuses: evite o erro médico

Em 2002, a sra. J.U. notou um nódulo no seio. Consultou sua médica que a encaminhou para a mamografia. No laudo disseram ser nódulo benigno e ela aceitou o diagnóstico radiológico. Resultado: em 2003, J.U. precisou retirar o seio e os gânglios da axila, fez quimioterapia, radioterapia e está deprimida porque sabe que um tumor no seio é coisa séria. “Se ela tivesse consultado mais de um médico, teria operado o nódulo, e o tratamento seguiria uma evolução diferente”, disse Francisco Huete Briones, especialista em Tisiologia e Pneumologia, que atua em Curitiba.

Sempre que existe doença grave é importante a opinião de mais de um médico, especialmente em caso de cirurgia. “Você vai colocar na mão do cirurgião sua vida. Não seria interessante ter uma segunda opinião? Além disso, é preciso consultar mais de um médico para ver se a cirurgia é necessária ou não.

“Parto do seguinte princípio: vida você só tem uma. Quando coloca na mão de alguém, tem que ser alguém de confiança, que seja capacitado. Se numa emergência você consultar um médico que lhe disser alguma coisa que sua cabeça não aceita, procure mais uma, duas ou três opiniões”, disse o pneumologista.

Erros médicos

“Os erros profissionais todos são graves, mas o erro médico é mais grave porque lida com a vida das pessoas. Por exemplo, a revista do Conselho Nacional de Medicina relata que um médico estava sendo cassado porque deu certidão de óbito sem ver o cadáver. Como o médico vai assinar uma certidão de óbito sem ver o cadáver? Inclusive a pessoa pode estar viva…”, comenta o médico.

Há mais de dois mil anos antes de Cristo, o Código de Hamurabi previa punições corporais para os médicos que não alcançassem bons resultados. As sociedades incluíram no decorrer do tempo punições severas aos médicos infratores. No Brasil, era comum existir a figura do médico da família e, nas décadas passadas, seus erros não eram denunciados.

Atualmente, com o enfraquecimento da relação médico-paciente e com o aumento da conscientização dos cidadãos a respeito de seus direitos, os pacientes procuram se defender buscando a Justiça. O erro médico é definido por Moraes (1995) como dano provocado em decorrência do exercício profissional, mediante ação ou omissão cometida por imperícia, negligência ou imprudência.

Segundo o dr. Francisco, a imperícia (incompetência), a negligência (não-atendimento) ou a imprudência (inconveniência) são os maiores erros médicos contra os quais os consumidores podem reivindicar, com base no Código de Defesa do Consumidor que, em seu art. 14, § 4.º, abre a possibilidade de responsabilização dos profissionais liberais.

Hoje o erro médico pode ser provocado pela má-formação profissional, que está sendo criticada pelo Conselho Federal de Medicina. “No Brasil existem faculdades de Medicina demais e médicos bons de menos. Se o indivíduo sai malformado da faculdade, não está preparado para conseguir uma residência médica. Para exercer a profissão, é só ter o diploma fornecido pela universidade e se inscrever no CRM – Conselho Regional de Medicina. Os alunos melhor preparados para fazer residência por concurso ganham as vagas existentes nos hospitais para melhorar sua formação. Para se ter uma clientela de consultório são necessários vários anos porque a propaganda é feita de boca em boca. Os médicos que não conseguem a residência vão trabalhar em prontos-socorros e fazer plantões médicos nos hospitais onde deveriam estar os médicos melhor preparados”, afirmou o pneumologista.

Uma pesquisa realizada pela médica Deíla Barbosa Maia, incluindo o período de 1988 a 1998 no Brasil, relata que nos 10 anos o número de recursos contra médicos, que deram entrada no Conselho Federal de Medicina, sextuplicou. Em 69,3% dos casos, os médicos foram condenados. Para a médica, esse resultado é importante para ajudar a quebrar o mito da impunidade dos médicos quando julgados por seus colegas. No entanto, questiona a falta de publicidade desses resultados, que deveriam ser demonstrados a toda sociedade.

Para muitos estudiosos do assunto, os erros médicos têm como causas a formação ética e humanística deficiente; a especialização precoce (Piccini e colaboradores, 1997) e a substituição, por parte dos médicos atuais, da anamnese e do exame físico pelos exames complementares. Estes, além de deteriorar a relação médico-paciente elevam os custos dos convênios de saúde.

“A medicina é uma profissão muito difícil porque você precisa resolver tudo na hora, diferentemente de um engenheiro ou de outro profissional, que pode combinar um assunto para a semana que vem. Em medicina, se o problema é de enfarto, por exemplo, o tratamento precisa ser imediato ou leva a pessoa à morte. Muitas vezes me pergunto: será que só o médico que se formou recentemente é culpado? É o sistema que é culpado também. Então precisa mudar o sistema para melhor, porque a população precisa ter segurança e confiança nos profissionais de medicina”, disse o pneumologista.

Zélia Maria Bonamigo

é jornalista, especialista em Mídia e Despertar da Consciência Crítica, membro do Instituto Histórico e Geográfico do Paraná.E-mail:
zeliabonamigo@uol.com.br

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