Queda nos salários tirou recursos da economia

Rio  – Cerca de R$ 2,2 bilhões de rendimento de trabalhadores nas seis principais regiões metropolitanas do Brasil deixaram de entrar na economia em julho. No mesmo mês de 2002, os 17,580 milhões de ocupados nas seis regiões pesquisadas pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), recebiam em média R$ 996,9 e somavam uma renda bruta de R$ 17,52 bilhões. Em julho deste ano, o número de ocupados subiu para 18 330 milhões de pessoas, mas a renda média caiu para R$ 833,5, o que reduziu a renda bruta para R$ 15,28 bilhões. Os dados foram calculados a partir dos resultados da Pesquisa Mensal de Emprego (PME) do IBGE.

Queda similar de um ano para o outro já havia sido registrada em junho. Dados do Ministério da Fazenda apontam que a renda bruta caiu de R$ 17,79 bilhões em junho do ano passado para R$ 15,44 bilhões em igual mês deste ano, com redução de R$ 2,34 bilhões.

O chefe do Departamento Econômico da Confederação Nacional do Comércio (CNC), Carlos Thadeu de Freitas, disse que a queda brutal do rendimento, com a retirada de bilhões da economia, tem sido o principal fator para as consecutivas reduções nas vendas do varejo. No primeiro semestre, segundo o IBGE, as vendas do comércio caíram 5,57%, ante igual período do ano passado.

O economista ressaltou que, para o setor, a renda é um fator mais importante para o desempenho das vendas do que as taxas de juros. “Essa queda na renda, do ponto de vista do comércio, é mais importante que os juros, que afetam mais as vendas de bens duráveis. O rendimento afeta todos os segmentos, inclusive os essenciais”, disse.

Thadeu de Freitas disse que o crescimento da inflação, a partir do fim do ano passado, é o principal motivo para as reduções da renda. “O poder de compra dos trabalhadores foi praticamente erodido a partir do fim do ano passado”, disse.

A queda no rendimento dos trabalhadores registrada em julho é considerada como “o fundo do poço” pelos economistas. O analista de mercado de trabalho da Tendências Consultoria, José Márcio Camargo, disse que a redução na renda dos ocupados tem sido provocada especialmente pela inflação e a retração da demanda, que inibe os investimentos e prejudica o emprego e a folha de pagamento das empresas. Para Camargo, os dados registrados até julho refletiram o pior momento do rendimento neste ano e, a partir de agosto, a renda deverá refletir o controle da inflação. “A recuperação do rendimento ocorre via queda da inflação e retomada do nível de atividade porque a empresa com mais demanda emprega mais gente”, disse.

O economista da Tendências explicou que, com a queda da inflação, os salários reais crescem e o aumento da renda afeta a demanda, que, por seu lado, tem impacto positivo na retomada da atividade, o que estimula a geração de emprego. Mas ele alerta que, ainda que o início desse ciclo comece agora, os efeitos só serão sentidos mais efetivamente a partir do último trimestre deste ano e, sobretudo, no ano que vem. “Em 2004 é que os sinais de recuperação estarão mais claros”, disse.

Concorda com ele Thadeu de Freitas. Para ele, “o fundo do poço já foi alcançado porque, à medida que os preços se estabilizam ou caem, o rendimento melhora”. Apesar de prever uma melhora no quadro do rendimento, ele avalia, assim como Camargo, que “recuperação do poder de compra, mesmo, só a partir do ano que vem”.

Só mais crédito vai proporcionar crescimento

Campos do Jordão

– O diretor de Política Monetária do Banco Central, Luiz Augusto Candiota, disse ontem que o País está longe de ter uma relação crédito/PIB satisfatória para a promoção do desenvolvimento. Segundo ele, o País teve uma relação crédito/PIB de 35% após o início do Plano Real, mas este percentual despencou para os atuais 25%. Em países desenvolvidos, a relação média crédito/PIB é de 120%.

Candiota afirmou que são vários os problemas no Brasil: juros e spreads ainda elevados, prazos de financiamento curtos, inexistência de provedor privado de crédito, cunha fiscal, inadimplência e compulsórios pesados. “Isso inviabiliza qualquer retorno de investimento”, afirmou.

Ele enfatizou que o mercado de capitais não conseguiu, até agora, ser fonte de crédito de longo prazo. Apenas o BNDES, no seu entender, cumpre esta função no País. De outro lado, o financiamento externo é sujeito a fortes oscilações de custos e prazos -somente em 2002, lembrou, o Brasil perdeu US$ 30 bilhões em linhas externas.

Candiota ressaltou que, para piorar o quadro, o Brasil “é reconhecido pela baixa qualidade de garantias aos empréstimos” por ter uma legislação “muito pró-devedor”. E um grande agravante é o fato de que “o já escasso crédito se destina a financiar a dívida mobiliária federal”. Daí a meta do governo de estabilizar a relação dívida/PIB e reduzi-la para abaixo de 40% até o fim da década.

Para enfrentar o problema do estrangulamento do crédito, Candiota disse que o governo trabalha em várias frentes. A queda da Selic e dos compulsórios é a mais óbvia e imediata, mas o pano de fundo compreende: a) votação e implementação da nova Lei de Falêncas; b) securitização do crédito bancário, por meio do Certificado de Crédito Bancário; c) aprimoramento dos sistemas de compensação; d) criação de cooperativas de crédito; e) reformulação da Central de Risco de Crédito.

Esta análise foi feita pelo diretor do BC em palestra no Primeiro Congresso Internacional de Derivativos, promovido pela BM&F.

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