Programa do PT divide opiniões

São Paulo

(AE) – O programa econômico do Partido dos Trabalhadores (PT) não chega a agradar aos analistas do mercado financeiro consultados pela Agência Estado, mas também não assusta. Não agrada porque algumas questões sagradas aos olhos do mercado, como o regime de câmbio e o de metas de inflação, além da necessidade de elevados superávits, são tratados grosso modo como meros instrumentos para uma transição profunda da política econômica num prazo mais longo, e também de maneira um tanto secundária. Por outro lado, deixa de lado – em documento oficial – a radicalidade registrada no último documento oficial do partido, produzido após a convenção do Recife, no fim do ano passado, aparentemente mais voltado para a militância política do partido.

“Definiria o programa do PT como algo agressivamente social-democrata, como era de se esperar. Ninguém achava que um programa do PT viria exatamente nos moldes que o mercado aplaudiria”, admite o economista-chefe de um grande banco estrangeiro. “O que importa é que, ao contrário do documento anterior, o Estado é colocado como um indutor de outras causas, como o desenvolvimento industrial, e não como um indutor da ruptura”, acrescenta.

Chamou a atenção dos analistas o perfil “unicampista” do programa econômico do PT – para alguns, representado pela ala mais moderada da universidade, representada por economistas como Luiz Gonzaga Belluzo. Revela ainda, segundo os analistas, uma certa “obsessão” pelos saldos comerciais externos, e chama a atenção a possibilidade de uma política de substituição de importações em moldes ainda não muito claros aos olhos do mercado – que gostaria de ver isso ocorrendo basicamente pelo incremento das exportações. “Quem determina uma política de substituição de importações competitiva são os preços relativos, não o Estado, de maneira forçada”, comenta o economista chefe de outra grande instituição financeira.

Também chamou a atenção dos analistas do mercado o conceito do Estado como articulador das decisões de investimentos do setor privado -por exemplo, na “reorientação do estímulo ao investimento direto e também no processo de substituição das importações” – algo que enxergam com certa resistência. “Isso abre espaço para políticas discricionárias, de volta dos subsídios”, critica um dos economistas ouvidos pela AE. Os analistas também enxergam com ceticismo, pelo mesmo motivo, a vinculação de recursos dos bancos estatais ao desenvolvimento de empresas de pequeno porte e de exportação, algo que alegam pode incorrer em risco de se financiar a ineficiência com recursos públicos.

Transição

Os analistas questionam qual seria esse prazo de transição no qual o PT passaria a mudar profundamente a condução da política econômica e, sobretudo, se essa mudança significaria o abandono de regimes como o de metas de inflação, de responsabilidade fiscal e de câmbio flutuante. Sobre as reações do mercado à divulgação do programa, estimam os analistas que ela deverá ser praticamente nula, assim como o foi com o pronunciamento de Lula no final de semana passado durante a Convenção Nacional do PT -aliás, antecipado em uma semana por conta da grande turbulência no mercado financeiro.

“De qualquer forma, é muito saudável que tenhamos num documento formal um PT que defende aquilo que vem afirmando há alguns meses no sentido de uma visão mais moderada da economia” comenta o economista.

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