Paraná foi estimulado a ?assumir? aftosa

Técnicos do segundo escalão do Ministério da Agricultura ?sugeriram? ao Paraná que admitisse que o Estado tem febre aftosa. A proposta foi feita no dia 9 de novembro, em uma reunião em Brasília, para qual representantes do Paraná foram chamados com urgência. Essa situação foi confirmada ontem na reunião do Conesa (Conselho Estadual de Sanidade Agropecuária) pelo secretário de Agricultura em exercício, Newton Pohl Ribas, que não compactuou com a proposta. A intenção do ministério, diz Ribas, era tentar recuperar a credibilidade do Brasil junto à Comunidade Européia, já que o País demorou para comunicar os focos de aftosa que ocorreram no Mato Grosso do Sul – eles surgiram no mês de setembro, mas só foram divulgados em 9 de outubro.

O secretário não quis identificar os funcionários que fizeram a proposta, porém garantiu que nem o ministro da Agricultura, Roberto Rodrigues, nem o secretário nacional de Defesa Agropecuária, Gabriel Maciel, estavam presentes. Ribas – que preferiu dizer que recebeu uma ?sugestão? dos técnicos – respondeu primeiramente que não tinha poder para fazer essa afirmação, até porque, todos os exames, até então, deram negativo. O secretário garante que consultou o governador Roberto Requião sobre assunto, mesmo tendo convicção da postura que deveria adotar. ?O governador me perguntou se tínhamos aftosa no Paraná, e eu respondi que até aquele dia os laudos deram negativo. Então ele me orientou a manter a posição?, falou.

O governador em exercício, Orlando Pessuti, garantiu que a ele ninguém do ministério fez essa proposta, mas que negaria o pedido se isso tivesse ocorrido. ?Não cabe a nós dizer se tem ou não aftosa. Isso tem que vir do Lanagro – Laboratório Nacional Agropecuário, de Belém do Pará, que é certificado pelo ministério para analisar as amostras sobre a doença?, falou Pessuti. Tanto Pessuti quanto Ribas não acreditam que poderão ter surpresas com a divulgação do laudo final sobre a suspeita de foco de aftosa no Estado, que deve sair até o final da semana. ?Todos os exames até agora deram negativo, e isso não deverá mudar?, falou Pessuti.

Já o assessor econômico do Sindicato da Indústria de Carnes e Derivados no Estado do Paraná (Sindicarnes-PR), Gustavo Fanaya, não descarta que o resultado possa ser fraudado. ?O Ministério da Agricultura quer que o Paraná pague o pato pela sua irresponsabilidade?, falou, acrescentando que hoje não existe material que possa confirmar a febre aftosa no Estado, ?e o que vem de Brasília pode ser uma surpresa?. Segundo Fanaya, o setor está perdendo R$ 2 milhões por dia por esse impasse da confirmação ou não da doença.

Justiça

O presidente do Sindicarnes-PR, Péricles Salazar, confirmou que a entidade ajuizou, no último dia 11, dois mandados de segurança, na Justiça Federal e Supremo Tribunal de Justiça, contra o ministro Roberto Rodrigues e o secretário nacional de Defesa Agropecuária, Gabriel Maciel, para que seja revogada a Instrução Normativa 34. Publicada em 1.º de novembro, ela define áreas de risco sanitário no Mato Grosso do Sul e Paraná, e proíbe o trânsito de animais em cinco municípios sul-mato-grossenses e outras 36 cidades do Paraná. O resultado desses mandados deveria sair até o final do dia de ontem.

Segundo Salazar, desde o anúncio da suspeita de foco de aftosa no Paraná, deixaram de ser abatidos 80 mil bovinos, o que já resultou em R$ 100 milhões de perdas para o setor. Para ele, a demora em divulgar o resultado negativo sobre a doença no Estado não passa de lobby que a Associação Brasileira de Exportadores de Carnes (Abiec) vem fazendo junto ao Ministério da Agricultura, para defender o interesse de grandes empresas do setor, sediadas em São Paulo, Goiás, Mato Grosso e Minas Gerais, que querem tirar o Paraná das exportações. ?Quando o Paraná não pode cumprir algum contrato interno ou externo é o ministério que coordena que isso seja feito por outros estados?, explicou Salazar. Sobre a flexibilização que São Paulo divulgou em relação aos produtos do Paraná, o presidente do Sindicarnes-PR não estava tão otimista que a medida seria tão positiva para o Estado.

O Ministério da Agricultura, consultado sobre a denúncia, disse que não iria se manifestar sobre o assunto.

Pessuti pede solução rápida

O governador em exercício Orlando Pessuti, durante o encontro de ontem do Conselho Estadual de Sanidade Agropecuária (Conesa), lembrou os prejuízos causados aos produtores, indústria e comércio, devido às suspeitas da presença do vírus da febre aftosa no Paraná. Ele também lembrou que em duas oportunidades, em Londrina, e em Curitiba, ele falou pessoalmente com o presidente Luiz Inácio Lula da Silva sobre a importância de liberar recursos para a defesa agropecuária.

Pessuti ressaltou que todas as ações e procedimentos desenvolvidos para impedir a entrada do vírus no Paraná foram determinados em conjunto, com a participação do governo do Estado, por meio da Secretaria da Agricultura, e dos representantes do Conesa e do Fundepec. ?Nada fizemos sem que todos estivessem devidamente informados e envolvidos?, comentou.

?Estamos encaminhando um relatório ao Ministério da Agricultura para que avancemos nos próximos dias. Para que possamos pôr um ponto final na questão de suspeita de aftosa no Paraná?, disse.

Ontem, a informação oficial era de que exames em trinta e seis amostras já realizados deram negativo. Ainda faltam exames em outras 16 amostras.

Erradicação da doença até 2010

Única região do continente americano que ainda convive com a febre aftosa, a América do Sul pretende erradicar clinicamente a doença até 2010. Para tanto, o Grupo Interamericano para Erradicação da Febre Aftosa (Giefa), vinculado à Organização Pan-Americana de Saúde (OPS) e ao Departamento de Agricultura dos Estados Unidos, intensificará as ações de prevenção e combate da doença nas áreas críticas a partir de 2006. A implantação do programa exigirá investimentos de US$ 48 milhões – US$ 9,5 milhões por ano -, segundo o coordenador do Giefa e presidente da Comissão Nacional de Pecuária de Corte (CNPC), Sebastião Guedes.

As áreas críticas são a fronteira do Brasil com o Paraguai e do Brasil com a Bolívia, a região do Chaco (espalhada pela Argentina, Paraguai e Bolívia), o Equador e a Venezuela. O Norte e o Nordeste brasileiros, considerados como de risco desconhecido para aftosa, também foram incluídos na zona de cobertura do programa da Giefa. De acordo com Guedes, os países que devem fazer parte das ações de prevenção e combate da aftosa têm um rebanho estimado em 320 milhões de cabeças, das quais 200 milhões estão em território brasileiro.

?Temos que erradicar de vez a aftosa na América do Sul?, diz o coordenador do Giefa, lembrando que a região desenvolve campanhas de combate dà doença. Hoje, Brasil, Bolívia, Colômbia, Equador, Paraguai, Peru e Venezuela convivem com o mal. Argentina, Chile, Uruguai, Guiana, Guiana Francesa e Suriname não registraram nenhum caso da doença nos últimos anos. O Chile é considerado como área livre de aftosa sem vacinação, destaca Guedes. Já a Argentina e o Uruguai, a exemplo de partes do Brasil, têm status de livres da doença com imunização.

Greve impede a venda de produtos

Londrina ( AE) – A liberação das fronteiras de São Paulo para os produtos e subprodutos de origem animal procedentes das regiões paranaenses excluídas da intervenção sanitária por causa da suspeita de febre aftosa não pode ainda ser comemorada pelos produtores de leite dos Campos Gerais, a maior região leiteira do País. O leite cru poderá voltar a entrar livremente em São Paulo se proceder de estabelecimentos com Sistema de Inspeção Federal (SIF) e acompanhados de atestado sanitário emitido pelo Ministério de Agricultura. A mesma exigência é feita para outros produtos, como a carne com osso, por exemplo. Acontece que os fiscais estão em greve há cerca de 15 dias e somente eles podem emitir esses certificados.

?Mudou tudo, mas continuamos na mesma?, desabafou Rogério Wolf, coordenador de produção leiteira da Castrolanda, que, junto com a Batavo, produz 600 mil litros diários de leite. Desse total, 400 mil eram vendidos para São Paulo in natura.

No início do embargo imposto por São Paulo, em 22 de outubro, a região dos Campos Gerais teve de jogar fora cerca de um milhão de litros de leite. Como a proibição se restringia ao produto in natura, o leite dos Campos Gerais passou a ser pasteurizado em outras regiões do Estado, já que as unidades industriais dos Campos Gerais não tinham capacidade de absorver o excedente.

Contratação

O Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (Mapa) vai contratar 400 veterinários e agrônomos em caráter emergencial e temporário para garantir as ações de fiscalização de produtos agropecuários e inspeção nos portos e aeroportos. A informação é do ministro Roberto Rodrigues, após proferir palestra, ontem, na 3.ª Conferência Nacional de Ciência, Tecnologia e Inovação, evento promovido em Brasília pelo Ministério da Ciência e Tecnologia.

Rodrigues disse que as contratações emergenciais serão necessárias devido a paralisação dos fiscais federais agropecuários do Mapa. ?Como os 30% dos fiscais flexibilizados para continuar em atividade não foram suficientes para liberar os portos, determinei à área executiva do ministério que priorizasse nas nossas ações emergenciais a contratação de novos profissionais?, explicou o ministro.

O Diário Oficial da União (DOU) publicará hoje ou segunda-feira edital para contratação imediata dos 400 profissionais com o objetivo de regularizar os serviços nos portos e aeroportos. ?Eles vão atuar na área de inspeção de produtos de origem animal e vegetal, tanto nas exportações quanto nas importações?, explicou o secretário-executivo do Mapa, Luís Carlos Guedes Pinto. Segundo ele, é obrigação do Estado prover esses serviços.

SP libera produtos do Paraná

Resolução assinada na quinta-feira pelo governador Geraldo Alckmin, de São Paulo, estabelece critérios para a liberação da entrada de animais susceptíveis à febre aftosa, seus produtos e semiprodutos vindos do Mato Grosso do Sul e do Paraná, fora dos municípios e áreas afetadas pela doença. A resolução fixa normas para o ingresso de animais vivos para abate, carne com osso e leite e os seus principais corredores de entrada.

O ingresso e o trânsito de animais susceptíveis à febre aftosa fora das áreas de risco sanitário do Mato Grosso do Sul e Paraná, destinados ao abate imediato, somente serão permitidos em caminhões lacrados. Além disto, os bovinos e bubalinos devem vir de regiões num raio de 10 km de distância dos municípios com presença da doença ou suspeita e que tenham permanecido nas suas propriedades de origem pelos últimos 90 dias.

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