Documentos trabalhistas reproduzidos e o novo Código Civil

1. A norma da CLT

A Consolidação das Leis do Trabalho (CLT) disciplina a matéria da prova documental no art. 830, que diz: “O documento oferecido para prova só será aceito se estiver no original ou em certidão autêntica, ou quando conferida a respectiva pública-forma ou cópia perante o juiz ou tribunal”.

Mozart Victor Russomano, em exegese a esse mesmo dispositivo legal, afirma que se as fotocópias e cópias xerox estiverem autenticadas por tabelião poderá ser dispensada “a exibição do original, pois a fotocópia autenticada tem o mesmo valor jurídico das certidões e, às vezes, é até mais expressiva” (Comentários à Consolidação das Leis do Trabalho. Rio de Janeiro: Forense, 1990. V. II. p. 900).

A Orientação Jurisprudencial n.º 36 da Seção de Dissídios Individuais I do C. TST, a respeito, consagra entendimento sobre o tema assim: “Documentos – Autenticação. Documento comum às partes (instrumento normativo ou sentença normativa), cujo conteúdo não é impugnado. Validade mesmo em fotocópia não autenticada”.

Esse posicionamento “abranda a exigência contida no artigo 830 da CLT, mas restringe-se unicamente aos documentos comuns às partes, quais sejam os acordos ou convenções coletivas ou as sentenças normativas, posto que, porque comum a ambos, estes têm condições de impugnar seu teor caso alguma irregularidade exista, justamente em face do seu prévio conhecimento” (HADDAD, José Eduardo. Precedentes Jurisprudenciais do TST Comentados. 2. ed. São Paulo: LTr, 2002. p. 91). Ressalva, no entanto, esse doutrinador, que essa orientação “não se aplica a outros documentos, permanecendo a exigência, quanto a eles, do artigo 830 da CLT” (ob. e p. cit.).

No mesmo sentido, a Orientação Jurisprudencial n.º 134, da SDI I, ao dizer: “Autenticação – Pessoa Jurídica de Direito Público – Dispensada – Medida Provisória n.º 1.360, de 12.3.96. São válidos os documentos apresentados, por pessoa jurídica de direito público, em fotocópia não autenticada, posteriormente à edição da Medida Provisória n.º 1360/1996 e suas reedições”. De acordo com esse entendimento, então: “os termos do artigo 830 da Lei Consolidada somente são aplicáveis aos particulares, não abrangendo os entes de direito público, dada a presunção de fé pública conferida pela lei” (HADDAD, J. E., ob. cit., p. 285).

Relembre-se, aqui, constituir prerrogativa (privilégio) da União, dos Estados, do Distrito Federal, dos Municípios e das autarquias ou fundações de direito público federais, estaduais ou municipais que não explorem atividade econômica, a presunção relativa de validade dos recibos de quitação ou pedidos de demissão de seus empregados, ainda que não homologados nem submetidos à assistência mencionada nos parágrafos 1.º, 2.º e 3.º do art. 477 da Consolidação das Leis do Trabalho (Decreto-lei n.º 779, de 21 de agosto de 1969, art. 1.º, inc. I).

2. A regra do Novo Código Civil

Continua valendo, como prova da declaração da vontade, a cópia fotográfica de documento (fotocópia) conferida por tabelião de notas, vale dizer, autenticada; mas, impugnada sua autenticidade, deverá ser exibido o original (art. 223, caput).

Constitui-se a novidade em permitir o questionamento da autenticação da fotocópia pelo tabelião. Basta a simples impugnação de autenticidade por uma das partes para que a outra tenha que exibir o original.

Carlos Santos de Oliveira, tratando “da prova dos negócios jurídicos”, esclarece: “O documento particular deve ser apresentado em original, via de regra, para que seja devidamente apreciado e, no caso de ser impugnado, a exibição do original é obrigatória. Contudo, a cópia fotográfica do documento particular, conferida por tabelião de notas, vale como prova da declaração de vontade (artigo 223 do Código Civil de 2002)” (In A parte geral do novo código civil: estudos na perspectiva civil-constitucional. Coordenador: Gustavo Tepedino. Rio de Janeiro: Renovar, 2002. p. 435).

3. A aplicabilidade do texto civil ao processo do trabalho

O parágrafo único do art. 8.º da CLT permite a utilização do direito comum como fonte subsidiária do direito do trabalho, quando não incompatível com os princípios fundamentais deste. De igual forma, o art. 769 do mesmo diploma, estabelece que o direito processual comum será fonte subsidiária do direito processual do trabalho, nos casos omissos, exceto quando for incompatível com as normas próprias da CLT.

Quando a cópia, fotocópia, xerox, estiver autenticada por tabelião de notas, não se considera aplicável a norma do artigo 830 da CLT (ver MARTINS, Sergio Pinto. Comentários à CLT. 5.ª ed. São Paulo: Atlas, 2002. p. 792).

Esse é o ponto crucial: a cópia autenticada por tabelião não se rege pelo artigo 830 da CLT. Então há vazio legal dentro das normas trabalhistas. Aplica-se, portanto, a nova regra do Código Civil a respeito.

A questão que se põe, agora, com a nova regra do art. 223, caput, do Código Civil, é que, mesmo autenticada por Tabelião de Notas, quando houver impugnação da cópia, deve ser apresentado o original.

Esse dispositivo é plenamente aplicável na Justiça do Trabalho, posto que não incompatível com o art. 830 da CLT, inexistindo outra regra trabalhista normatizando a matéria.

Eduardo Gabriel Saad faz um confronto dos arts. 384 e 385 do CPC com o art. 223 do Novo Código Civil Brasileiro, dizendo que as normas processuais, no tocante à impugnação do documento, em lugar de obrigar o interessado a exibir o original, assentam que compete ao juiz ordenar o exame pericial. Assevera, então, ser, nesse particular, o NCCB, “mais objetivo, uma vez que manda ao portador da cópia fotográfica do documento que exiba o original” (Suplemento Trabalhista LTr. N.º 043/03. Ano 39. São Paulo: LTr, 2003. p. 201).

Registre-se que, para o processo civil, “a reprodução autenticada tem o mesmo valor probante que o original que foi matriz para a cópia. Só será necessária a juntada do original, se for suscitado o incidente de falsidade documental das cópias, arcando a parte requerente com o ônus de suportar eventual condenação por litigância de má-fé caso dê ensejo ao incidente infundadamente (CPC 17 VI)” (exegese ao art. 384 do CPC, NERY JUNIOR, Nelson e NERY, Rosa Maria de Andrade. Código de processo civil comentado e legislação processual civil extravagante em vigor. 6.ª ed. São Paulo: RT, 2002. p. 722).

Exemplifica Eduardo Gabriel Saad com uma situação possível de acontecer na vida prática: “Se o empregado apresentar cópia fotográfica, conferida por tabelião, de carta do empregador assegurando-lhe certas vantagens ou garantias, é fora de dúvida que temos, aí, a comprovação de uma declaração de vontade. Se, como destacado acima, a empresa puser em dúvida a autenticidade do documento, tem o empregado de apresentar o original” (ob. e p. cit.).

Luiz Eduardo Gunther

é juiz no TRT da 9.ª Região.Cristina Maria Navarro Zornig é assessora no TRT da 9.ª Região.

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