Carla Bonomo

Dignidade e empresa: breves considerações sobre o balanço social

Observando as condições de vida das diferentes nações do mundo, notadamente no último século, há uma notória e chocante constatação das gigantescas desigualdades sociais. Os avanços científicos e tecnológicos também foram enormes, mas não parecem ser suficientes para ao menos amenizar este problema que compromete a dignidade humana.

No Brasil a situação não é diferente, tendo em vista que o país não alcançou um nível de desenvolvimento que proporcionasse significativa melhora da qualidade de vida de toda a sua população. A enorme distância entre pobres e ricos evidencia o contraste entre o Brasil econômico e o Brasil social.

Neste sentido, é possível afirmar que nosso país é um líder em desigualdades sociais, fato que nos leva a reavaliação do modelo de crescimento adotado, em que pese as ufanistas estatísticas governamentais. A direção deve ser corrigida, evitando o agravamento dessa realidade e a geração de outros problemas no futuro. É salutar a conscientização de que esta questão afeta a todos, direta ou indiretamente, pois vivemos em uma sociedade interdependente.

Neste contexto ganha relevância a discussão a respeito dos papéis desempenhados pelos diversos atores sociais. Governo, empresariado e sociedade civil devem buscar a resolução deste e de outros problemas que perturbam a sociedade, num esforço comum.

A empresa privada, que antes tinha uma atuação essencialmente focada no lucro, resultado que continua desejável, passa a ter uma visão mais ampla, existe por parte de algumas organizações a preocupação com os efeitos sociais de suas estratégias.

A responsabilidade social das empresas deve orientar o papel da atividade empresarial junto à sociedade com escopo na vida digna; e isto de certa forma, é uma exigência do próprio mercado e da sociedade como um todo.

A Constituição Federal brasileira consagrou o valor da dignidade da pessoa humana como princípio máximo. Bem como, reconheceu que a liberdade de iniciativa (o direito que assiste ao particular de ter empresa, de se lançar no mercado de bens e serviços) é um direito fundamental. Assim, a harmonização entre estes dois princípios deve ser uma busca permanente.

O direito à informação lato sensu é um direito fundamental que possibilita maior participação de interessados nos processos e mudanças sociais. Com o intuito de informar seus diversos públicos de relacionamento, com base na ética e transparência, o balanço social tornou-se um instrumento de efetivação desse novo direito, além de permitir a avaliação do desempenho da organização na área social.

Entretanto, a mensuração da Responsabilidade Social das organizações tem sido um desafio constante, considerando a complexidade do tema e diversificação de ações realizadas.

O termo Balanço Social advém de uma demonstração contábil, ou seja, do Balanço Patrimonial que é constituído pelo Ativo, Passivo e Patrimônio Líquido da empresa. Porém, o balanço social se diferencia estruturalmente e materialmente de um balanço contábil, ele procura informar os gastos e ações da empresa na promoção da dignidade da pessoa humana, na formação de uma sociedade mais justa e solidária, bem como na preservação do meio ambiente.

A terminologia “balanço social” é uma das mais aceitas e utilizadas, no entanto, cabe ressaltar que sua principal finalidade não está focada na análise econômico-financeira da entidade e sim no sentido de prestar informações através do levantamento dos principais indicadores de desempenho econômico, social e ambiental da empresa. Permite, ainda, avaliar a qualidade de suas relações, se tornando assim, um importante instrumento de gestão que auxilia na tomada de decisões.

Os registros históricos da década de 1970 marcam as primeiras experiências de balanços sociais pelo mundo, sobretudo na legislação francesa. No Brasil, conforme relatório do BNDES, a discussão alcançou maior projeção a partir da campanha lançada em 1997 pelo IBASE, que visava trabalhar a idéia da responsabilidade social das empresas e seu papel na busca de soluções para o problema da fome e das desigualdades sociais no país.

Com a intenção de conseguir maior participação da sociedade, o IBASE elaborou um modelo de Balanço Social contando com o apoio de diversas entidades na sua divulgação.

Assim, a ordem jurídica também se manifestou quanto à obrigatoriedade de sua apresentação, ainda que timidamente. No entanto, parte dos dispositivos legais estimula a apresentação do documento sem um caráter obrigatório e sancionatório.

A falta de conhecimento sobre o assunto, inadequação dos sistemas de informações e custos relacionados à elaboração do relatório, são alguns dos fatores apontados pelos empresários que atrapalham tal iniciativa.

A confecção do balanço social encontra dificuldades e limites, tais como: a falta de interesse por parte de algumas organizações, a participação dos envolvidos no processo, a autenticidade das informações, a mensuração e até mesmo possibilidade de manipulação dos dados.

A forma de apresentação, o conteúdo e a uniformização do balanço social, dentre outras, são questões debatidas pelos interessados no assunto. No entanto, a padronização é defendida por alguns estudiosos do tema, pelo fato de propiciar a auto-avaliação e a comparação entre as empresas. O dissenso e a falta de normatização têm como conseqüência a baixa adesão empresarial na confecção do balanço social. Embora, registros tenham demonstrado, historicamente, um relativo crescimento no número de entidades que divulgam tal informativo.
Os defensores do fortalecimento de dispositivos jurídicos, justificam seu posicionamento no poder que a regulamentação exerce, alcançando amplamente as empresas de diferentes ramos de atividade e porte, contribuindo assim, para uma melhor efetividade dos direitos.
Outrossim, convém registrar que as questões relativas à obrigatoriedade de apresentação e publicação deste documento continuam em debate, e seus contornos ainda não estão totalmente definidos.
É importante lembrar que as pessoas, em regra, têm uma responsabilidade social, sobretudo as pessoas jurídicas. Neste sentido, é possível afirmar que a publicação do balanço social(1) auxilia no exercício da cidadania e na construção de uma sociedade mais justa e próspera, buscando uma vida, ao menos um pouco, mais digna.

Nota:
(1) Com vistas a maiores informações sobre o Balanço Social sugerimos acessar o site do Instituto Ethos de Empresas e Responsabilidade Social, HTTP:// www.ethos.org.br ; do Instituto Brasileiro de Análises Sociais e Econômicas (Ibase), http://www.ibase.br ou http://www.balancosocial.org.br; bem como do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), http://www.bndes.gov.br .

Coluna sob responsabilidade dos membros do Projeto de Pesquisa do Mestrado em Direito do Unicuritiba: Livre Iniciativa e Dignidade Humana (Ano II), liderado pelo advogado e Prof. Dr. Carlyle Popp e pela advogada e Profa. M.Sc. Ana Cecília Parodi. grupodepesquisa.mestrado@ymail.com.

Esta coluna tem compromisso com os Objetivos para o Desenvolvimento do Milênio.

Carla Teresa Bittencourt da Costa Bonomo é graduada em Ciências Contábeis e especialista em Auditoria e Perícia Contábil. Graduanda em Direito, pelo UNICURITIBA, membro do projeto de pesquisa “Livre Iniciativa e Dignidade Humana”.
CT_BITTENCOURT@HOTMAIL.COM.

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