Risco de extinção

Animal que só existe no Litoral do Paraná é descoberto por pesquisadores da UFPR

Caramujo Drymaeus currais. Foto: André Filgueira/Sucom-UFPR

Uma espécie de caracol descoberta por pesquisadores da Universidade Federal do Paraná (UFPR) só pode ser encontrado no Litoral do Paraná, no Parque Nacional Marinho das Ilhas dos Currais, em Pontal do Paraná. “Batizado” como Drymaeus currais em homenagem ao parque, o invertebrado que é nativo da ilha paranaense e restrito a esse local, está ameaçado de extinção.

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De acordo com a UFPR, o estudo feito pelos cientistas, publicado na Revista da USP Papéis Avulsos de Zoologia, revela que a espécie resulta de um processo evolutivo que a tornou distinta do Drymaeus castilhensis, molusco natural da Ilha de Castilho, que fica a aproximadamente 70 quilômetros ao norte do parque.

Os pesquisadores explicam que apesar da concha rajada ser muito similar ao Drymaeus castilhensis, um estudo anatômico complementar demonstrou importantes diferenças que permitiram a separação específica. As principais características exclusivas da espécie, de acordo com o estudo, foram observadas nos sistemas reprodutor e digestório. A pesquisa é conduzida pelo professor Carlos Eduardo Belz, do Centro de Estudos do Mar (CEM) e pelo pesquisador Marcos de Vasconcellos Gernet, do Programa de Pós-Graduação em Zoologia da UFPR, em parceria com o professor Luiz Ricardo Simone, da Universidade de São Paulo (USP).

O caracol Drymaeus currais é nativo da ilha paranaense e está ameaçado de extinção. Foto: André Filgueira/Sucom-UFPR

“Pela semelhança visual com o Drymaeus castilhensis, pensamos se tratar da mesma espécie e ficamos intrigados. Moluscos terrestres são organismos muito sensíveis, por isso é difícil imaginar que um indivíduo pudesse ter chegado até a região flutuando em alguma coisa ou carregado por aves marinhas”, explica Belz. Quando os cientistas identificaram moluscos terrestres em um local que possui grande variedade de invertebrados marinhos, ficaram curiosos sobre a origem desses animais e como chegaram até a ilha.

Os indícios, conforme a pesquisa, levam a acreditar que o invertebrado iniciou o processo de especiação, isto é, de evolução há centenas de anos, quando o mar de toda a costa brasileira era muito mais recuado. “Nessa época, Currais ainda não era um arquipélago e pertencia ao continente. Provavelmente espécies similares circularam por essa região e, com o avanço do mar e da linha de praia, as ilhas ficaram isoladas e isolaram também essa população de molusco”, conta o professor. Após centenas de anos em que os animais ficaram se reproduzindo entre eles, aconteceu a divisão das linhagens.

Espécie depende da umidade

O gênero Drymaeus pertence à família bulimulidae, moluscos gastrópodes como caracóis e lesmas, e possui cerca de 300 espécies, das quais 49 ocorrem no Brasil. O caracol terrestre descrito pela equipe é exclusivo do Arquipélago de Currais e foi encontrado em área sombreada na maior ilha do parque, Ilha do Grapirá, habitando troncos e folhas da vegetação arbórea da floresta e nas bromélias dos costões rochosos presentes na região. A descoberta do molusco é importante para a biodiversidade do litoral paranaense e sugere que o ambiente está favorecendo o aparecimento de novas espécies.

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Para o pesquisador Marcos de Vasconcellos Gernet, um dos aspectos mais interessantes e, ao mesmo tempo, preocupantes da descoberta é o fato de o habitat da espécie ser reduzido a um ambiente insular tão pequeno. “Os indivíduos estão limitados a essa ilha, nem nas outras ilhas desse mesmo arquipélago foram localizados exemplares. Por isso, esse pequeno ambiente tem extrema importância para a manutenção dos animais dessa classe. Qualquer interferência ou desequilíbrio que ocorra nessa ilha, como uma queimada na vegetação, implica o desaparecimento da espécie”.

Segundo ele, até mesmo a estiagem pela qual o estado está passando é um fator de risco para esses caramujos, que dependem fundamental da umidade para sobreviver e, na ilha, basicamente a umidade a que têm acesso é proveniente da chuva.

Vista de parte do Arquipélago de Currais, formado por três ilhas e recifes a dez quilômetros da costa de Pontal do Paraná. Foto: André Filgueira/Sucom-UFPR

Arquipélago de Currais

Criado em 2013, o Arquipélago de Currais é o terceiro Parque Nacional Marinho do Brasil – os outros dois estão localizados em Fernando de Noronha (PE) e Abrolhos (BA). A área tem extrema importância para a biodiversidade marinha do litoral do Paraná, apesar de ser pouco conhecida pela população e de ainda não ser objeto de muitos estudos.

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O Arquipélago está localizado na porção central do litoral paranaense, a aproximadamente seis milhas náuticas do município de Pontal do Paraná. Constituído por um grupo de três pequenos ilhéus rochosos, a Ilha do Grapirá representa 81% da sua área total, que possui 1.357,7 hectares.

As Ilhas dos Currais concentram ninhos de aves – calcula-se que cerca de 8 mil habitem a região -, além de os seus recifes serem hábitat de animais marinhos em risco de extinção, como o mero, maior peixe ósseo do Atlântico Sul. Segundo o Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio), o arquipélago é o maior berçário do atobá no Brasil.

Atobá adulto (à esq,) ao lado de um filhote em uma área de nidificação da espécie nas Ilhas dos Currais. Foto: André Filgueira/Sucom-UFPR

Para Belz, a descrição de novas espécies endêmicas de uma ilha relativamente pequena reforça a necessidade de proteção ambiental do Arquipélago de Currais. “É muito importante o fato dessa nova espécie estar em um Parque Nacional Marinho paranaense e que ainda tem pouco conhecimento gerado a seu respeito. Isso valoriza o parque, que precisa de apoio e divulgação”.