Categoria profissional diferenciada, base econômica e dissídio coletivo do trabalho

O Tribunal Superior do Trabalho ao decidir recentemente sobre recurso ordinário em Dissídio Coletivo de Trabalho recolocou questões importantes da representação sindical dos trabalhadores e da base econômica. Na questão em análise, ao examinar pontos relativos à categoria profissional diferenciada, convocação do ato da assembléia dos trabalhadores, presença de associados e empregados, quórum de realização e deliberação, representação de segmentos profissionais entre outros, reafirma os novos posicionamentos da Corte Superior alargando as possibilidades jurídicas no plano dos dissídios coletivos de trabalho. O acórdão a seguir transcrito parcialmente indica o norte que vem orientando os magistrados trabalhistas.

A ementa: Recurso Ordinário em Dissídio Coletivo. Legitimidade ativa ad causam. Quórum de deliberação. Consoante o entendimento jurisprudencial iterativo desta Seção Especializada, é inviável, após o ajuizamento do dissídio, o questionamento, pela parte adversa, do quórum deliberativo da Assembléia obreira para a celebração da Convenção Coletiva, mediante a invocação do art. 612 da CLT, por se tratar de matéria interna corporis, superada pela inviabilização do consenso entre as partes. Na hipótese, deve-se considerar a deliberação necessária à instauração do dissídio coletivo, que se submete aos ditames do art. 859 da CLT. Recurso a que se dá provimento. (Proc: TST-RODC 16001/2004-909-09-00 – Publicação: DJU -03/02/2006)

Categoria profissional diferenciada: Na fundamentação do acórdão, após informar que o Tribunal Regional acolheu a argüição de ilegitimidade ativa, para extinguir o processo, sem exame do mérito, a teor do art. 267, incisos IV e VI, do CPC, o TST examina a matéria: ?O Regional, no preâmbulo da apreciação da preliminar ora enfocada, em se referindo ao julgamento, naquela Corte, do dissídio com período de vigência imediatamente anterior ao atual, envolvendo as mesmas partes, reconheceu que os suscitantes, com efeito, representam a categoria profissional de todos os trabalhadores rodoviários, condutores de veículos rodoviários e, em especial, os motoristas e ajudantes de transporte nas indústrias de todos os setores econômicos, em face da condição de categoria diferenciada, mas não provaram que os trabalhadores presentes nas assembléias gerais deliberativas, que motivaram o ajuizamento de dissídio coletivo, são empregados das empresas componentes da categoria econômica representada pelo suscitado… Conquanto não especificamente caracterizada essa qualidade nos registros sindicais, observa-se que há, em sua maioria, disposições estatutárias pertinentes à representação da categoria diferenciada, e não há aspectos factuais em contrário. Milita em favor dos Recorrentes o fato, incontroverso, de que praticamente a totalidade dos segmentos componentes do setor industrial do Estado, com exceção do Suscitado, reconhece os Suscitantes como interlocutores representantes da categoria diferenciada. Observa-se que as entidades filiadas à Federação patronal e as empresas vinculadas não se enquadram no grupo do setor rodoviário, condição para o enquadramento dos profissionais, por paralelismo, no grupo preponderante correspondente?

Dupla condição, diferenciada e preponderante:     Uma das características do sindicalismo brasileiro é a possibilidade da entidade dos trabalhadores representar tanto o setor preponderante como o diferenciado. Este ponto é destacado pelo TST: ?O contraditório revela, da praxis, que os Suscitantes atuam ora como representantes de categoria diferenciada, reconhecida, conforme dito, pelos interlocutores sociais, ora atuam como representantes da categoria preponderante motoristas empregados de empresas do setor rodoviário. Conclui-se, claramente, que os Suscitantes, na hipótese, atuam como representantes da categoria diferenciada dos profissionais condutores de veículos rodoviários (motoristas) que podem ser empregados de qualquer setor econômico – fato alegado pelos Suscitantes, não impugnado especificamente pela defesa, e, afinal, reconhecido pelo Regional. Em se tratando de categoria diferenciada, não persiste o princípio do paralelismo obrigatório entre as atividades econômica e profissional, que norteia o enquadramento sindical, ao teor do art. 511, caput e parágrafos 1.º, 2.º e 4.º, da CLT, por ser possível, na espécie, a celebração de norma consensual, e, consequentemente, a instauração do dissídio coletivo contra qualquer categoria econômica que represente, na base territorial correspondente ao sindicato obreiro, empresa potencialmente empregadora do profissional representado?.

Relações jurídicas: Em seguida, o TST adentra questão essencial no que concerne a abrangência da norma coletiva em face as relações jurídicas existentes e as que possam ser formalizadas. Veja-se a decisão: ?Não é necessário que haja empregados da categoria; basta que seja possível a contratação. Cabe mencionar que o dissídio coletivo, por sua natureza constitutiva e/ou declaratória, abrange relações jurídicas existentes e as que venham a se formar no período de vigência. Em sendo assim, não há impedimentos para que se inclua no rol de categoria econômica ex adversa qualquer sindicato, que, tendo sido convocado à negociação coletiva e dela se esquivado, seja representante de empresas que possuam em seu quadro de pessoal, quando do ajuizamento da ação, trabalhador integrante da categoria profissional diferenciada suscitante, ou que possam vir a contratá-lo no período de vigência da norma; nesse caso, a norma incide no momento em que ocorrer a contratação?.

A assembléia geral: O TST detalha as preliminares da negociação coletiva e do dissídio coletivo de trabalho no que concerne a deliberação dos trabalhadores via a assembléia sindical: ?Na hipótese, os editais para as assembléias-gerais, publicados em instrumentos de comunicação de ampla circulação, pelos sindicatos obreiros ora Suscitantes, contêm, em sua ordem do dia, a convocação dos trabalhadores interessados, das respectivas bases de representação, estando consignadas as categorias econômicas integrantes do setor industrial, em que laboram, ou possam laborar, os profissionais representados. Não há quanto a esse aspecto defeito de convocação para as negociações prévias com vistas à celebração da norma consensual. Quanto ao quórum, discutiu-se, acerbamente, há tempos, na doutrina e na jurisprudência, a questão da incidência do art. 612 da CLT, após a instauração do dissídio coletivo. Consoante o entendimento jurisprudencial iterativo desta Seção Especializada, é inviável, após o ajuizamento do dissídio, o questionamento, pela parte adversa, do quórum deliberativo da Assembléia obreira para a celebração da Convenção Coletiva, mediante a invocação do art. 612 da CLT, por se tratar de matéria interna corporis, superada pela inviabilização do consenso entre as partes. A deliberação necessária à instauração do dissídio coletivo se submete aos ditames do art. 859 da CLT. Verifica-se, do contraditório, que as deliberações para a instauração do dissídio, foram aprovadas em segunda convocação, por mais de 90% dos trabalhadores presentes, pelo que atingida maioria superior a 2/3, conforme a determinação legal pertinente?.

Segmentos profissionais: Adentra o acórdão outro ponto relevante, no que concerne ao conjunto da representação profissional e dos seus segmentos: ?De outra parte, não se pode invocar a subdivisão por segmento profissional, uma vez que cada Sindicato-suscitante, em sua respectiva base de representação, representa a categoria como um todo, tal como definido em seus estatutos. Nesse sentido, a jurisprudência consubstanciada na Orientação Jurisprudencial n.º 23 desta Seção Especializada, que dispõe, verbis: Legitimidade ad causam. Sindicato representativo de segmento profissional ou patronal. Impossibilidade. A representação sindical abrange toda a categoria, não comportando separação fundada na maior ou menor dimensão de ramo ou empresa. Não há exigência formal, prevista em lei, no que tange à organização e apresentação das listas de presenças das assembléias-gerais sindicais, devendo-se observar o que dizem os estatutos da entidade. Na hipótese, não há referência ao tema. É despiciendo averiguar-se a proporção entre os associados presentes à Assembléia e o número desses associados empregados no segmento empresarial, para fins de aprovação da matéria sob discussão, uma vez que não há previsão legal nesse sentido, consoante o comando do art. 859 da CLT. Não há, ademais, alegações de fraude, pelo que impõe-se considerar atendido o quorum fixado no art. 859 da CLT para a instauração do dissídio coletivo. Em síntese, inexistem, na hipótese, elementos factuais ou legais que impeçam a incidência da referida norma consolidada específica, pelo que se conclui regularmente autorizada a instauração da instância pelas assembléias-gerais dos sindicatos- suscitantes. Por esses fundamentos, afasto a preliminar de ilegitimidade ativa ad causam. Dou provimento ao recurso, para, afastada a preliminar, determinar o retorno do processo para a prolação de nova decisão. Isto posto acordam os Ministros da Seção Especializada em Dissídios Coletivos do Tribunal Superior do Trabalho, por unanimidade, dar provimento ao recurso, para, afastada a preliminar, de ilegitimidade ativa ad causam, determinar o retorno do processo para a prolação de nova decisão. Brasília, 17 de novembro de 2005.Carlos Alberto Reis de Paula. Relator?

E.mail: edesiopassos@terra.com.br

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