Caras-de-pau

O ministro do Supremo Tribunal Federal Carlos Velloso, que hoje também preside o Tribunal Superior Eleitoral, aposenta-se compulsoriamente no mês que vem. Ele completará 70 anos, idade limite no serviço público brasileiro. Às vésperas da inatividade, o magistrado concedeu entrevista, quando qualificou de caras-de-pau e delinqüentes os políticos que usam o chamado caixa 2 nas campanhas eleitorais, aquele dinheiro por fora, arrecadado e gasto ao arrepio da lei, sem conhecimento da Justiça Eleitoral.

O ministro analisou muito bem essa prática, dizendo que ela gera um desequilíbrio nas eleições, pois faz com que um candidato desonesto seja eleito, em detrimento de um homem honesto, um cidadão de bem. Aquele junta dinheiro escuso e, de bolsos cheios, direta ou indiretamente compra cabos eleitorais e votos. O honesto não se presta a essa maracutaia, não se comporta como cara-de-pau e acaba não se elegendo.

Perguntado se o presidente da República, Luiz Inácio Lula da Silva, tinha alguma responsabilidade nessa prática criminosa, ele apenas disse que duvida que o chefe da nação venha a repetir agora o que disse em entrevista em Paris, ocasião em que vulgarizou o uso do caixa 2, dizendo que é prática sistemática no Brasil. Velloso prega o endurecimento das penas para os crimes eleitorais, de forma a intimidar os caras-de-pau que chegaram até a confessar o crime e ainda continuam impunes.

Não só o presidente falou nesse crime como coisa banal, corriqueira e sistemática, como muitos dos que o praticaram confessaram, com o maior despudor, que usaram o caixa 2, como se isso não constituísse crime nenhum e nenhum mal causasse à nossa democracia. Nas CPMIs, quem recebeu dinheiro do valerioduto, via tesoureiro do PT, Delúbio Soares, não negou e quis fazer crer que, porque era para campanha eleitoral, era dinheiro legítimo. Ilegítimo seria somente o mensalão, que teria de ser, como o apelido mesmo diz, um pagamento mensal para que o parlamentar usasse como bem entendesse. Não vemos muita diferença, sob o ponto de vista moral, entre o beneficiário do caixa 2 para campanha eleitoral e o receptor do mensalão. Um e outro são caras-de-pau e delinqüentes, merecendo não só a punição da cassação, como também alguns anos atrás das grades.

O ministro presidente do TSE aponta o fato de a legislação ser muito branda como uma das causas da prática sistemática do caixa 2. ?É necessário endurecer as penas. Os delitos eleitorais, tais quais postos no Código Eleitoral, são punidos muito brandamente. Talvez por isso esses caras-de-pau, pensando que ficarão impunes, confessaram abertamente, impunemente, sorrindo, como se fosse brincadeira.?

Velloso lembrou que em agosto o TSE criou uma comissão, com representantes da sociedade civil, para estudar as leis e propor mudanças na Lei Eleitoral. Para o crime do caixa 2 foi proposta pena de 3 a 8 anos de reclusão. ?Acho que com isso esses bandidos não ficarão impunes?, aposta o ministro, para lembrar que hoje a pena vai até 5 anos e os poucos que são processados recebem a pena mínima de 1 ano e acabam se beneficiando com a prescrição. Ficam impunes. Lembrou ainda que a nova legislação poderia ser votada já e entrar em vigor no próximo pleito, pois não é preciso cumprir a regra da anualidade. Mas num Congresso como o atual, é de se duvidar que alguma coisa tão moralizante aconteça…

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